Tuesday, December 18, 2007

Brrrrrrrrrrrrrrrr!




Está aqui um frio danado, mesmo com dois aquecedores à minha volta e uma catrefada de roupa vestida não consigo aquecer. É suposto estar frio na época natalícia mas também não era preciso exagerar. Quatro graus de temperatura mínima previstos para a capital é o melhor convite (e pretexto) para eu ficar na cama o dia todo, mais ou menos como fazem os ursos, esses sim é que são espertos, dormem durante todo o Inverno e só acordam quando já se pode andar de tanga.

Por falar em tanga, entreguei, há minutos – voluntariamente forçado – a terceira prestação por conta da minha prendinha do ano que vem, ao senhor fisco, aquele monstro que tem uma carantonha muito, muito feia, igual à do gigante Adamastor, o brutamontes barbudo, sujo e malcheiroso que também assombrava os homens que tentavam, desafiando os ventos e as marés, dobrar um cabo de boa esperança. Eu, que sou tão ou mais curioso que os gajos do banco de Portugal quanto a tudo o que se passa nos nossos bancos, nomeadamente no BCP, roo-me todo para ver se adivinho o que vou receber em troca!

Felizmente há uma prenda que o estado me vai dar para o ano que vem e que vai contrabalançar estas mexidas, descaradas, no meu bolso.
Nem toda a gente se pode gabar de conseguir prever acontecimentos futuros mas eu consigo, tal como o professor Karamba-às-vezes-nem-sei-como-calha-mas-acerto. Não, por acaso não é só uma, por acaso eu até já sei duas das prendas que vou receber: uma é mais um (uuuaaaahhh, longo bocejo de monotonia!) título de campeão nacional para o meu clubezito e a outra, a tal de que falava atrás, é a nova lei anti tabaco.

A partir do primeiro dia do próximo ano vou deixar de gastar dinheiro em almoçaradas ou jantaradas em restaurantes. Não posso fumar? Então não vou! Como e bebo em casa!
Ou então recheio um taparuére com torresmos, pastéis de bacalhau, enchidos, azeitonas, carcaças, um garrafãozito de tinto – copos não que o plástico estraga o ambiente – e esfumaço até vir a mulher da fava rica ou até se lembrarem de inventar uma porcaria qualquer grave na camada do ozono, ou no recheio do taparuére, por minha culpa.
Ao menos consolo-me a pensar na massa que vou poupar só nos “couverts”, que na maior parte das vezes vão quase inteirinhos para trás, poupança que vai dar e sobrar para fazer face ao aumento do preço de cada maço; como dizia um antigo primeiro-ministro, o primeiro dos que fugiram por causa do nosso pântano, é só fazer as contas: para um aumento de, vá, trinta cêntimos por maço, fumando eu meio maço por dia, ora deixa lá ver, dá-me um aumento de despesa de cinquenta e quatro euros por ano. Isto dá para aí quantos “couverts”, por ano e por pessoa? Dez? Doze? É nas calmas! Sem contar no que poupo nas gorjas!
Interessante vai ser a solução para as prisões: os governantes têm que proibir o tabaco mas querem dar seringas para injectar um substituto nos viciados noutras substâncias (menos perigosas, suponho!). Os agarrados do tabaco vão ser discriminados ou também vão, como os outros agarrados, ter direito a uma regalia especial? Ainda vão ver que um gajo, para poder fumar à vontade, num espaço público, pequeno, fechado e sem ventilação, tem que ir dentro.

Mas pronto, é Natal, não vale a pena falar de coisas tristes, se tem que haver frio então que haja, se não se pode fumar que se dane, manda quem pode e obedece quem deve, tenham umas Festas felizes e, cuidado, muito cuidado com o que comem!

A máquina do tempo



112 Lexington Avenue, Bridgeport, USA.

Esta não é uma morada ao calha. Esta é a morada, cujo passado eu andei a investigar durante este fim-de-semana, aproveitando as maravilhas da tecnologia, confortavelmente sentado na minha cadeira e em frente ao meu computador, sem vontade para sair de casa por causa da confusão da cimeira.
Ali, há quase cem anos, a 28 ou 29 de Junho de 1917, o Ezequiel e o Custódio terão dado um abraço, um abraço apertado, umas quantas palmadas nas costas, sorrisos largos, o Custódio disse "estás com bom aspecto, primo, as gringas tratam-te bem!", e o Ezequiel retorquiu "e tu, deste-te bem lá pelas terras do Brasil?". Devem ter morto as saudades, partilhado esperanças e brindado a um futuro melhor. Não consta que tenham ressonado apesar da quantidade de bebida ingerida.
O Custódio Marques tinha chegado ao porto de Nova Iorque, no navio "Vauban" vindo do Brasil, via Buenos Aires. Às autoridades aduaneiras, disse ter 23 anos e a fortuna de 10 dólares, de ter sido ele a pagar a sua viagem e que ia para a casa do primo Ezequiel Henriques. Vinha para trabalhar mas fazia tenção de regressar para o seu país de origem. As autoridades registaram-no como física e mentalmente são, capaz de ler e escrever, sem cicatrizes ou marcas especiais, de olhos castanhos e cabelos pretos.
No mesmo navio vieram, de Santa Comba, o João Almeida, com 24 anos e 32 dólares e o Augusto Leonardo, de 22 anos e com 35 dólares, mas foram para outras paragens.
Em Setembro do ano seguinte, no dia 12, o Custódio foi obrigado a ir à inspecção militar. Apesar da primeira grande guerra se aproximar do fim os americanos queriam toda a gente alistada.
No cartão de registo, o Custódio escreveu que tinha nascido a 25 de Agosto de 1893, que era operário na Remington Arms Co. de Bridgeport, uma empresa de fabrico de armas e munições, e assinou-o declarando que tudo aquilo era verdade. As autoridades atestaram que o meu avô não tinha perdido nenhum braço, perna, mão ou olho, não estando obviamente desqualificado para o serviço. Na história da Remington, este dia ficou marcado por uma missa em comemoração do fabrico do ultimo rifle dum grande contrato com o exército dos EUA, a que compareceram, entre importantes figuras do exército e da marinha, mais de 14,000 dos seus empregados.
Diz o ditado, e é verdade, que quando vai um português vão logo dois ou três! A dada altura, naquela morada terão habitado o Custódio, o Ezequiel, o Moyses Mattos Affonso, o Júlio Reis e o José Henriques. Outros mais se juntariam:
O Roberto Ventura, filho de Manuel M. Ventura, que chegou no dia 18 de Fevereiro de 1920 no navio "Britannia", com 22 anos e 50 dólares; com ele vieram também o Sabino de Matos e o Alberto Mattos Almeida.
No dia 5 de Outubro de 1920 atracou no porto de Nova Iorque o navio "Providence". Um dos passageiros era o Joaquim Ventura, agricultor, que vinha para casa do irmão Custódio. Declarou 20 anos e 20 dólares, que não era nem polígamo, anarquista nem aprovava o uso de força para derrubar o governo americano e não sabia quanto tempo ia ficar. As autoridades consideraram-no mental e fisicamente são e sem quaisquer deformações. Com ele vieram o Joaquim Marques Matos de 28 anos e o Manuel Antunes de 38, com 30 dólares cada um.
Aos habitantes do 112 da Lexington avenue em Bridgeport, Connecticut, as autoridades americanas chamaram Tourigo Boys e, durante anos, mantiveram uma apertada vigilância.

Tuesday, November 27, 2007

Xaropes

(Única, 09.06.2007)


Vá lá, todos quietinhos agora, toca a olhar para o passarinho… isso… só mais um bocadinho!
Não, não, não, não, assim não! Ou ficam quietos e se juntam o mais possível uns aos outros ou então não saímos daqui hoje!
É só mais um instante e vocês, os adultos, podiam muito bem dar o exemplo! Tira a mão do nariz, não, não és tu, é o teu irmão. Santa paciência, mas o que é aquele matulão está ali a fazer à frente? Eh pá, mas eu já não te tinha dito que os mais altos têm que ficar na fila de trás? Tirem-me o cão daí! Ó filha põe as saias para baixo!
Olhem, sabem que mais: desisto! Estou farto de vos aturar, vão todos para o diabo que vos carregue!

Qualquer infeliz a quem tenham impingido uma máquina fotográfica com o objectivo de conseguir, para a posteridade, uma fotografia de família, fica automaticamente proibido de ir medir a tensão arterial nos dias seguintes. Até desabafos com a sua cara-metade são contraproducentes a uma razoável sanidade mental e física do desgraçado.
Podem, e devem, ser pensados mas são absolutamente interditos a qualquer tipo de verbalização, lamentos como “a tua irmã, além de estar muito mais gorda, está mais parva” ou “os ranhosos dos teus sobrinhos, os filhos do Anacleto, são uns maricas, sempre agarrados às saias da mãe, aquela insonsa” ou ainda “mas o que é que passou pela cabeça do estafermo do teu pai para ele autorizar o nosso casamento?”
Embora eu não tenha conhecimentos pessoais sobre o que estou a escrever, asseguro-vos que tudo isto deve ser verdade.

Recordei-me disto por causa da seguinte notícia que ouvi, neste fim-de-semana, num noticiário de uma estação de rádio: “Em entrevista ao DN (diário de notícias) Mário Soares acha que o PS devia chegar-se um bocadinho mais à esquerda”.
Se é o DN que o diz, então é porque o senhor deve ter mesmo dito aquilo, o jornal é unha e carne com essa gente, mais ou menos assim como os coisos do senhor padre Inácio, sempre juntinhos, nunca vi uns irmãos gémeos tão chegados como aqueles.

Como não tinha tempo nenhum para desperdiçar, não fui ler a entrevista e fiquei-me pelo título, mas imaginei-me logo no papel de fotógrafo do nosso antigo presidente (agora um velho e grande amigo desse exemplo vivo de democrata que é o actual presidente venezuelano) e de mais uns quantos elementos do agrupamento socialista, numa qualquer escadaria de um qualquer edifício público, eu a quere-los mais para a direita, ele a puxar pela manga do casaco do nosso primeiro e a dizer “bem, ó José, homem, aí aonde estás arriscas-te a não ficar bem na fotografia; chega-te mas é mais para aqui, mais para a esquerda, isso, só um bocadinho, aqui para o pé de mim, do frei Anacleto e do Huguinho do petróleo. Vais ver como aqui se fica muito mais aconchegado”.

A minha vesícula, desde que imaginei a cena, entrou em polvorosa e, desde então, ando enjoado e mal disposto! Há-de passar. Que remédio! E sem lamentos!

Disparates



Hoje vou chatear os anti-americanos! Também não é preciso muito para os pôr em órbita, basta sussurrar-lhes o nome do actual presidente e é vê-los em brasa, a espumar e a trepar pelas paredes acima, de cabeça perdida, completamente descontrolados.

Mais ou menos como eu estou com os resultados do meu FCP, que agora deu para andar armado em empata, o que me obriga a aturar umas estupidamente grandes doses de gozo por parte dos meus amigos lampiões que até já se dão ao luxo de dizer que, este ano, vão ganhar não sei bem o quê. Como eles pensam que são muitos, não sei quantos milhões, é quase um delírio colectivo que nos ameaça. Felizmente que a azia tem obrigado os lagartos a ficar em casa, de repouso, porque senão eu só podia sair à rua disfarçado, de burca enfiada pela cabeça abaixo. Viver na capital e ser dragão é obra quando a coisa nos corre mal. Felizmente é raro, mas quando acontece, nem vos digo nem vos conto, é preciso ter cá um jogo de cintura…!

Pertenço, já perceberam, ao reduzido bando de idiotas mentais – a última vez que contei éramos doze – que acumula ser dragão com ser pró-americano. Combinação mais desmiolada do que esta, de momento não me ocorre e duvido que seja fácil de encontrar. Pelo menos neste velho continente cheio de história e que se chama Europa.

Vejam bem que eu até acho que o nosso mundo ocidental, o nosso mundo de conforto e paz, deveria agradecer, e muito, aos soldados americanos, incluindo os que agora estão a dar o coiro no Iraque. Isto é mesmo doentio não é? Depois, quando fizer algum acto ainda mais tresloucado, não digam que não tinha dado pistas suficientes para que me internassem a tempo.

Sei que estou só neste sentimento mas eu sinto enormes saudades de ouvir reportagens sobre o que se passa no Iraque, de ver repórteres ocidentais, de colete e capacete, a cascar nos gringos. Se calhar muita boa gente ainda nem se apercebeu do manto de silêncio que, desde há uns meses, se abateu sobre o que (de mau) acontece naquela perturbada zona do mundo. Longínquos vão os tempos de monopólio que o tema tinha na informação publicada; agora ninguém me diz nada sobre as maldades que, os meus amigos do novo mundo, por lá fazem, sobre as torturas, sobre a guerra civil, sobre a falta de segurança, sobre as impossíveis reconciliação e reconstrução daquele país. Nada!

Novo mundo, sem séculos de história, que ainda se rege por uma constituição que foi escrita há quase duzentos e cinquenta anos e a quem tantos querem – e podem! – dar lições de liberdade, desde os antigos países do leste europeu, que viveram em ditadura até há….hummm....vinte anos, até Portugal, Espanha e Grécia que têm uma longa tradição democrata de…vejamos…trinta anos, à França e à Alemanha cujas constituições têm (pouco) mais de sessenta anos ou à Bélgica (que por acaso nem sei se, hoje, ainda é um país).
Como já disse, só mesmo um desmiolado que acredita em dragões é que pode escrever tanto disparate em abono daquele bando de bebés grandes!

Sunday, November 11, 2007

Obrigações




Em teoria, nos contos de fadas ou em Marte todos nós somos iguais, todos nós temos as mesmas oportunidades, todos somos amigos, tretas desse género e por aí fora.
Acredito que, talvez, quando nascemos sejamos todos iguais: inocentes, nus, sujos e feios!
A partir daí, acho que tudo muda. No início, cada um terá alguém que lhe vai tratar da vidinha, depois calçam-se sapatos próprios e, toca a andar, cabecinhas na estrada a furar pelo trânsito.

Quem prega que somos todos iguais, é tão aldrabão como os que têm a lata de dizer, na presença dum recém-nascido, “mas que menino tão lindo!”. Recém-nascido e bonito são coisas completamente distintas e opostas (excepto para essa interessante e intrigante categoria de primatas que dá pelo nome de avós).

Quando pela primeira vez, oito minutos depois do nascimento, botei olho no meu filho mais velho – valha-me Santo Agostinho! – pensei que, ou ele tinha saído disparado com tanta força que não conseguira evitar o choque frontal com a parede oposta à marquesa ou então fora pela minha estúpida e perigosa condução a caminho da maternidade, guiada pelos nervos, pela ignorância e pelo cagaço, que a tromba do puto ficara assim, toda amarrotada.
Era então “aquilo” que eu ia levar para casa ao fim de nove longos meses de expectativa? Era “aquilo” que ia contaminar, com as suas fraldas borradas e os seus babetes azedos, o sadio ambiente lá em casa, impedir-me de dormir como aquilo que eu era, um anjo, e obrigar-me a preparar, ao frio e às três da madrugada, centenas de biberões? Quando nasceu o segundo, para evitar mais desilusões, só ao fim de onze dias ousei encará-lo de frente e, ainda assim, assustei-me.
É claro que, entretanto, se transformaram os dois em bonitos rapazes, com pais assim outra coisa não era de esperar mas, agora, estão outra vez feios porque não arrumam os quartos não querem regar a relva e nem querem pôr a louça do jantar na máquina, etc.

Se pai de recém-nascido tivesse estatuto, e se esse estatuto fosse igual ao que agora dizem ir ser aprovado para os alunos, não me teriam apanhado na sala de aula durante todo o curso, ter-me-ia baldado o tempo todo e se conseguissem obrigar-me, eu acabaria por responder às milhentas convocatórias da maternidade, quanto mais não fosse para dar uma meia dúzia de tabefes nas enfermeiras pela insistência em atribuir-me a responsabilidade de levar o pacote para casa.



O meu amigo Vítor, o meu socialista parceiro do ténis, professor de electrotecnia, coordenador dos directores de turma e ele mesmo director de uma turma de sete alunos do oitavo ano da via profissionalizada (com uma média de idades de 17,3 anos) numa das piores classificadas escolas públicas do país, localizada bem perto do palácio de Belém, tem o mesmo receio que lhes aconteça o mesmo que às enfermeiras e acredita que muitos dos agora responsabilizados progenitores só ponham mesmo os pés na escola para partir os dentes a quem vai insistir em chateá-los por causa dos filhos e das filhas. Em boa verdade os alunos já fazem bem esse papel e a ele ainda nenhum o agrediu porque, como ele diz, “quando os gajos começam com merdas eu também parto para a agressividade”.

“Mas sabes, lá no fundo – continua ele, agora a sorrir – dá-me um gozo danado vê-los a tourear a malta que por cá aparece a dizer que com uma postura de compreensão, de diálogo, de igualdade acabaremos por conquistá-los”. Sim, está bem!

Marmelos



Era de tarde, no relógio da torre da igreja tinham-se ouvido quatro badaladas, o dia estava lindo, no céu sem nuvens o sol brilhava e aquecia as minhas costas, eu olhava para a avó dos meus filhos que à janela aberta do seu quarto acabara de responder à minha pergunta dizendo-me que o que estava ali a fazer era a secar a marmelada.
Pensei ter ouvido mal mas ela, sorridente, repetiu. Olhei em volta à procura do seu marido mas não o encontrei. Pus-me em bicos de pés, tentei espreitar para dentro do bem iluminado quarto. Não o vi mas podia muito bem-estar escondido.
Parece-me que de cada vez que me vêem no Tourigo, este par de alucinados fazem o possível para gozar com a minha cara.
Ele, o marido, não descansou enquanto não me levou a ver, de perto, a beleza duma groselheira carregadinha, vista bonita, confesso, mas que não passou, afinal, duma matreira e engenhosa maneira de fazer com que fosse eu a esmagar os ouriços e a apanhar as castanhas que tinham caído naquele lado do quintal. Com a desculpa da sua idade e do seu actual estatuto de presidente quem teve que dobrar a mola para apanhar as seis castanhas fui eu. Sozinho!
Eu quero lá saber aonde é que ela seca a marmelada! Nem sequer quero saber aonde é que ela faz a marmelada. Na minha idade é óbvio que já sei mais ou menos onde é que ela, a marmelada, se faz naquela casa, mas, francamente, há informações que eu preferia não receber. A minha mãe a fazer marmelada! Até evito pestanejar não vá dar-se o caso de, com os olhos fechados, me passarem imagens estranhas à frente. A curiosidade dos meus filhos sobre estas questões culinárias morreu por volta dos cinco anos e, agora que já deixaram a adolescência, se eu ou a minha Maria lhes perguntamos se há perguntas a fazer sobre a matéria, fogem como Maomé do presunto, aos gritos e com as mãos a tapar os ouvidos. Como eu os compreendo!
Recordei partes da conversa à hora do almoço, o meu pai a pedir-me para ser eu a fazer os trabalhos mais pesados que incluíram abrir a garrafa do vinho porque lhe doíam as mãos de tanto descascar os belos marmelos e a mulher a dizer que ele gostava mais da que tinham feito primeiro porque era menos azeda do que a segunda. Ela gostava das duas. Queixas houve, sim, mas das castanhas e das nozes que, segundo ela, estavam todas piladas as primeiras e quase todas podres as segundas.
Mesmo a suave palmadinha que ele lhe deu e as estridentes gargalhadas que se seguiram quando a apanhou, quieta, os braços no ar, os dois indicadores esticados e o tronco a balançar ao som duma qualquer música que só ela ouvia, me fez juntar dois mais dois (bolas, até esta ultima parte da frase me soa estranha).
E tinha eu pensado, ingenuamente na altura, que o clima alegre e quente que envolvia a cozinha se devia à nossa visita, ao arroz de cabidela e ao tinto.
À noite, já deitado a ler o meu livro, ouvi foguetes. Desliguei e luz, tapei a cabeça com a almofada e obriguei-me a dormir.

O Saldanha





Nos últimos cinco minutos era para aí a quinta vez, o tom de voz a aumentar, que ela dizia “mas eu já lhe disse que só o Saldanha é que lhe pode resolver o seu problema” e era, para aí, a sétima vez que o homem lhe respondia, o tom também em crescendo “mas foi o Saldanha que me mandou vir aqui e disse que vocês é que me resolviam o problema!” quando ela entornou definitivamente o caldo ao proferir, alto e bom som “mas eu quero lá saber!”.

Antes que lhe desse um chilique e porque “eu não vou dar cabo da minha saúde por causa das asneiras do Saldanha” a funcionária chamou a policia, por acaso vieram dois, calmos e diligentes, tomaram conta da situação, não sem que um deles tenha levado as mãos ás algemas ameaçando prender o utente vitima do Saldanha que, a caminho do olho da rua e de estribeiras completamente perdidas, foi distribuindo elogios a todos quantos, na sua opinião, faça sol ou faça chuva, informem bem ou informem mal, não precisam de se preocupar com as consequências dum mau serviço porque o guarda-chuva aparece sempre no final do mês.

Por esta altura, eu e mais a outra dúzia e meia de utentes que comigo esperavam na sala, estávamos com tamanho pó ao Saldanha que, se o apanhássemos ali, bem à nossa frente, dávamos-lhe uma valente esfrega e uns quantos bananos nas fuças. O marmanjo estava mesmo a pedi-las. Estava ele e, achávamos nós, estava a funcionária, graças a quem, já conhecíamos todos os podres dos cinco desgraçadas utentes que ela atendera antes.

Levantei-me, pedi a atenção dos meus colegas, expliquei-lhes os porquês da minha profunda irritação com o comportamento do Saldanha, disse-lhes que tipos como ele que brincam com a vida dos outros não mereciam andar por aí à balda e, como todos mostraram concordância comigo, propus-lhes a minha solução: recambiar o Saldanha para o Jardim das Pichas Murchas!

Ainda agora todo eu fico pele de galinha e me comovo até ás lágrimas quando recordo a efusiva reacção dos colegas à minha proposta, as palmas, os gritos de “este mano para presidente, já!”, os abraços, os beijos e os apalpões. Foram, acredito, os meus cinco minutos de fama.

Infelizmente os sonhos duram pouco e, rapidamente, uma outra funcionária do atendimento ao público da Segurança Social do Areeiro se apressou a esclarecer que o Saldanha não era um homem mas sim um local, também em Lisboa e a cerca de um quilometro dali, onde havia outras instalações daquele organismo publico, também ele com dezenas de outros funcionários aptos a resolver os nossos problemas.

Atendendo a que o Jardim das Pichas Murchas, que fica perto do castelo de São Jorge, é um espaço muito pequeno, caiu também por terra a minha proposta já que, com tantos candidatos e candidatas a irem lá parar, aquele pacato recanto alfacinha tornar-se-ia inabitável e, sabe-se lá, corria até o risco de ter que ser rebaptizado.

Para acabar numa nota mais alegre, deixo-vos com a resposta do senhor Jardim Gonçalves quanto perguntado se dera o seu contributo para o perdão da divida de juros do seu filho para com o BCP: Ó pus dei!

Saturday, October 20, 2007

Vira o disco





O difícil é conseguir encontrar um tema sobre o qual vai girar a treta da minha crónica; depois – eu acho – a coisa mais ou menos acaba por fluir e, no final, às vezes até fico com a sensação do dever cumprido, com a sensação de que o cheque é merecido.
Esta semana, o problema é a quantidade; é conseguir escolher entre os vários temas que, assim de repente, me ocorrem: o congresso do PSD, a visita de dois policias a um sindicato na Covilhã para saberem o cardápio das queixas e dos insultos contra o nosso primeiro e o rápido arquivamento do respectivo inquérito, os desabafos de dois apresentadores de noticias de televisão, ambos escritores de romances, sobre a suposta ingerência dos chefoes nas linhas editoriais das respectivas estações e as diferentes reacções dos seus superiores, o novo orçamento do estado e o (continuo) aumento da despesa corrente ou os perdões de enormes dividas acordados pelo BCP a empresas ligadas a alguns accionistas e administradores.

Ou a atribuição do Nobel da paz a Al Gore, autor do filme Uma Mentira Conveniente, desculpem, Uma Verdade Inconveniente, que teve piada por ter acontecido na mesma semana em que o juiz de um tribunal inglês impediu a divulgação do filme nas escolas públicas inglesas, por este conter nada mais, nada menos do que 9 (nove) imprecisões científicas. Para poderem passar o filme, os professores terão que contrabalançar a teoria do laureado com a de cientistas que defendem o contrário, isto é, que não há nenhum aquecimento global e que não é o homem o culpado pelas alterações no clima. A mulher talvez, aí sim, já eu não punha as mãos no fogo, quanto à culpa…

Ou ainda o sorriso irónico e a pergunta “mas quais escutas?” que o senhor ministro da administração interna fez na RTP, às quinhentas da matina, a propósito da divulgação de escutas telefónicas antigas onde é ouvido a agradecer a Abel Pinheiro (ex-tesoureiro centrista, actualmente arguido num processo de tráfico de influências) o empurrão para uma sua eventual nomeação como procurador geral da republica que o Paulinho das feiras podia dar junto do antigo Presidente da Republica, Jorge Sampaio, em resposta a um pedido de ajuda directo do (na altura ainda) engenheiro.

Vamos entendendo melhor o complexo enredo, encenado, nos bastidores, pelos artistas que, alegadamente, se estrafegam na praça pública de modo a arrancarem ruidosas mas anestesiadas palmas aclamatórias das suas diferentes clientelas.

Do congresso do PSD, bastou-me ouvir uma parte do discurso de Manuela Ferreira Leite, onde ela jurou, a pé juntos, que não há, nem deverá haver tão cedo, margem para reduzir os impostos. Como defende também o novo presidente eleito do partido.

São estas reservas morais da republica, referências históricas dos grandes (e pequenos) partidos da nossa assembleia democraticamente eleita, prestigiados e experientes economistas e eu sei lá que mais, que, do meu ponto de vista, desde há não sei quantos anos, empobrecem a vidinha e a conta bancária da maioria dos desgraçados portugueses, com a maldita impossibilidade de reduzir os impostos porque – genuína mas (se calhar) não ingenuamente – não querem é acabar com o regabofe que é a despesa pública e os seus efeitos colaterais.

Sendo assim, eu que até escrevo e falo de barriguinha cheia, filiei-me na abstenção. Sentado e à espera!

Thursday, October 11, 2007

Arrepios

(foto daqui )





Quando o calor vai de férias, aquecer os corpos que se passeiam noutras paragens, vem o estafermo do frio para tomar conta de nós, sempre à coca, a ver quando é que metemos o pezinho, descalço, numa poça de água gelada e, mal nos apanha de corpinho bem feito, acama-nos com uma bruta e estúpida gripe. Para o ajudar a torturar-nos vem, como dizem no


Porto, o bento (mas é aquele que assopra e não aquele que faz aquelas poucas vergonhas com a senhora marquesa) e enche o ar que respiramos com micróbios, qual deles o mais pestilento, resultando numa sinfonia de espirros que nunca mais acaba, coisa tão desprovida de graça como o primeiro episodio da segunda edição do programa dos gatos fedorentos que estreou ontem, domingo, no canal de televisão estatal e que eu e a minha gente, aguentámos até ao fim, sempre naquela vã esperança, esperança nem sei bem de quê.

Já há umas noites atrás, também naquela estação, um concurso do tipo festival da canção, mas para putos, me tinha mandado para a cama todo arrepiado e com uma dor de ouvidos levada da breca, uma vontade danada de experimentar saltar dum avião sem me preocupar em levar o pára-quedas ou até a vestir e fazer explodir um desses fatos de macaco que os islâmicos fascistas usam, convencidos de que é a maneira mais rápida de irem às meninas.
A ultima vez que eu me lembro de ouvir uma tão horrorosa chinfrineira e de ter tão inocentes pensamentos foi quando o meu filho mais velho, então com uma mão cheia de anos, tirou a chupeta da boca do mais novo e este, ainda incapaz de lhe ir ás trombas sem a minha ajuda, desatou num berreiro tal que acabou por rachar a parede da porta da entrada da minha casa, onde está, desde então, pendurado aquele que é o nosso maior quadro e também onde, durante o Inverno, mantemos as garrafas de vinho branco sempre geladinho.

Ainda pensei que os pais daquelas barulhentas criancinhas fossem como eu e que, quando confrontado com a óptica duma câmara de televisão a transmitir as minhas fuças em directo e em simultâneo com a actuação do meu desafinado petiz, meteria aquele meu ar aparvalhado e surpreso, género “que é que foi?, vire essa coisa para lá, eu?, ter alguma coisa a ver com aquilo?,


você é maluco ou faz-se?, porra, já viu como o puto canta mal como o raio, chiça penico, caramba pastel de coco!, coitados dos pais da criatura, bom, eu só vim ver a bola, agora tenho que me ir embora, em que rua é que fica o museu do ruído?”.

Juro, puto meu, naquela idade, enfiar-se numa situação daquelas, sem ter jeitinho nenhum para a poda, como castigo – Deus me livre, me perdoe e me poupe – não recebia a mesada até conseguir cantar tão bem como aquele senhor de bigode que, com o bacalhau, quer alho.
Mas não, não senhor! Aqueles paizinhos não só não invadiram o palco para cascar e calar os fedelhos como ainda por cima estavam felizes, contentes e saltitantes sempre que as câmaras os mostravam e os rotulavam como os progenitores, os tios, os primos, ou os avós daquelas pestes desafinadas e guinchadoras.

Se algum dia, por muito distante que ainda possa estar (e espero bem que sim), algum filho de um dos meus filhos me levar a comportamentos destes, desde já vos suplico: internem-me!

Sunday, September 30, 2007

Fintas


(Cartoon seen here)
Graças a uma finta perfeita executada pelo meu adversário de ténis, estive uns dias no estaleiro, com dores terríveis no meu nome, enormes dificuldades para me sentar e movimentar. Por questões de (minha) saúde, aquele marmanjo não volta a jogar contra mim, a não ser que a tal me obriguem.

Quando finalmente me consegui aguentar sentado durante algum tempo, fui actualizar-me sobre o que se passa por esse mundo fora, sobre o que se anda a passar fora, mas fora das notícias da imprensa de referência, não fosse ser atingido por mais uma finta monumental.
Andei, portanto, a navegar pela Internet onde, entre outras curiosidades, fiquei a saber que:

- O nosso primeiro-ministro, de visita à Casa Branca e na presença do seu anfitrião, perdeu o norte e socorrendo-se do seu apurado inglês técnico, agradeceu a oportunidade para discutir com ele alguns problemas no mundo, nomeadamente a situação no “médio ocidente”. Até ao momento desconhecem-se quer os territórios quer os problemas que tanto preocupam o nosso dirigente.
- Segundo o Portugal Diário (do mesmo grupo que a TVI), mais ou menos por essa altura, Bush matou Mandela! O jornalista, usando o mesmo inglês técnico do nosso primeiro, não conseguiu interpretar uma analogia feita pelo americano – que como todo a gente sabe é burro e detém o recorde mundial de gaffes – sobre a inexistência de um Mandela iraquiano.
- A Bélgica, reino federal cuja capital é também a capital da união europeia, pequeno país que para as autoridades europeias é vista como a miniatura da UE, o verdadeiro modelo para a Europa, está dividida e desde as eleições de Junho que está sem governo; os flamengos e os valões não se entendem na sua limitada federação e as rupturas acentuam-se.
- A BBC, essa excelência informativa, admitiu que funcionários seus cometeram mais uma série de falsificações nos resultados de alguns concursos e em algumas das votações realizadas pelos espectadores; algumas das falcatruas foram cometidas em programas para crianças.
- A cadeia de televisão estatal francesa France 2, que em 2000 filmou a morte de um rapaz palestiniano de doze anos, trespassado pelas balas do exército israelita, jazendo ao lado do seu desesperado e impotente pai, foi, finalmente, intimada por um juiz de um tribunal francês a tornar públicos os vinte e tal minutos de filme onde, supostamente, se prova que todo o incidente foi uma monumental encenação feita pelos palestinianos. Relembre-se que o episódio deu origem a violentos e prolongados confrontos entre as duas partes e que a ampla publicação da fotografia originou um coro de protestos mundial contra o estado hebraico.
- O emplastro do Irão está de visita a Nova Iorque, no âmbito de mais uma reunião da ONU onde vai discursar. Quer ir em romaria até ao local onde antes estavam as torres gémeas mas ainda não sabe se pode ir ou não.
- O grande FCP soma e segue a fintar os adversários mais directos!

No colchão

(Adapted from an original ad found here)


Vai para aí um forrobodó danado nos mercados financeiros mundiais que é bem capaz de estoirar com a luz ao fundo do túnel da economia que a malta já dava como certa, ainda que os bolsos continuassem tão leves como dantes.

Em pleno século vinte e um, cai o queixo a qualquer um ao ver as enormes filas de gente desesperada que, em Inglaterra, correu e corre, a levantar os depósitos que tinham e ainda têm num banco local que está, alegadamente, com as calças na mão.

Apanhados no vendaval provocado pela chamada crise dos empréstimos “subprime” (empréstimos a pessoas de muito poucos rendimentos e com um historial elevado de calotes pregados noutros empréstimos anteriores, uma estratégia seguida quando as taxas de juro nos Estados Unidos estavam a valores historicamente muito baixos) os responsáveis do banco informaram que os seus lucros tinham sofrido um rombo do caneco; vai daí, uns quantos tipos começam a sacar a massa de lá, a coisa espalha-se num boca a boca imparável, o taco que existe no cofre não chega para as encomendas, toca pedi-lo emprestado a outros bancos, primeiro aos bancos amigos habituais, depois a bancos amigos dos bancos amigos e, como a resposta continua a ser um manguito, acaba-se a recorrer a quem quer que seja que esteja disposto a emprestar o guito, mesmo que cobre um pouco, ou muito, mais. Nada que qualquer um de nós não fizesse quando está mesmo à rasca e precisa, sem falta nenhuma, daquela massa naquela dia, naquela hora, já!

Mas a manta é curta e como a tempestade aumenta de intensidade o montante que lhe emprestaram já se foi e é preciso mais; muito mais! Os manguitos estão, nesta fase, generalizados e toda a gente desconfia de toda a gente. O cérebro de cada banco pensa assim: hum … se fulano, que é um rato de esperteza, se espetou naquilo então beltrano, que é do mais fino que há, também deve estar aflito! E sicrano? Só pode! Chiça, será que vão conseguir devolver-me aqueles milhões que me pediram emprestados há uns tempos atrás? Eh pá, se não mos pagarem, também não posso pagar o que devo! Porra, querem lá ver que também eu estou feito?

Como nós faríamos em desespero de causa e se os nossos pudessem, os responsáveis do banco viraram-se para os papás, neste caso o pai do sistema bancário lá do sítio, o banco central inglês. De joelhos e em confissão, desvendam-se os segredos das asneiras cometidas – nesta fase do campeonato tem mesmo que ser – promete-se nunca mais cometer o mesmo erro, pede-se a absolvição e ajuda.

E o pai absolve e ajuda! Por enquanto! E apesar dela e das múltiplas afirmações sobre a sólida situação do banco afiançadas pelas mais altas e qualificadas autoridades na matéria, a verdade é que o Zé-povinho não acredita e continua a fazer bicha para sacar a massa daquela instituição.

Por enquanto isto passa-se pelas terras de origem do clube de futebol de milionários que, esta semana, vai levar uma carga de porrada dos leões. Mas … e se a moda pega e alastra para outras paragens? Corre-se a levantar o taco? Para meter aonde?

Wednesday, September 12, 2007

Tabuletas




Passei o fim-de-semana em Vila Viçosa. Fui convocado para, na qualidade de amigo da artista pintora, assistir à inauguração da sua primeira exposição a solo; ela é uma calipolense, palavrão que classifica os naturais daquela vila alentejana, vila que é famosa por esse mundo fora graças ao seu mármore e às, de outros tempos, tricas e mexericos reais que por lá ocorreram em séculos passados, dentro e fora das paredes do Paço Ducal. Também é famoso pelo bom vinho Borba, os queijos, os enchidos de porco preto e a sericá (se for sem a ameixa) ou sericaia (com a dita).

Os meus conhecimentos sobre pintura estão ao mesmo nível de tudo o que eu sei sobre o cérebro da ratazana o que me qualifica para, pelo menos, saber que se o objecto em questão está pendurado por um ou mais pregos e eu o não posso contornar, então trata-se, claramente, de um quadro. Se me perguntarem se o borrão pendurado é um aguarela um óleo eu entupo, engasgo-me e, na melhor das hipóteses, quando quase pareço um intelectual vestido com a minha mais que coçada e algo esburacada ganga, a camisa amarrotada e por fora das calças, a barba por fazer e o cabelo comprido, faço uma cara de ofendido como se quem se atreve a fazer-me essa pergunta idiota queira, no fundo, ter algum género de contacto físico comigo, a modos que um estalo na tromba.

Também já sei que o Picasso não é nenhum jogador espanhol de futebol a jogar numa equipa inglesa e que a Paula Rego não é uma praticante da modalidade do salto à vara. Conhecimentos adquiridos, escrevo-o com orgulho, sem o recurso a explicações!

Percorro as exposições de pintura como a mesma velocidade com que o esfomeado do meu filho mais novo limpa um bife com batatas fritas e ovo a cavalo; como resultado, ficamos, ambos, cheios e a abarrotar durante uns tempos, incapazes de repetir a gracinha.

Conhecedora destes meus desarranjos artísticos, a minha amiga fez coincidir o sacrifício da exposição com as festas anuais da vila. Das várias actividades que constavam no programa para um turista acidental como eu, só consegui chegar a tempo a uma: à largada de toiros no domingo de manhã. Este é espectáculo em que o toiro, tal como o Zé-povinho às mãos do estado, é gozado até dizer chega. Alguns, poucos, dos funcionários públicos – oh perdão, enganei-me! – alguns, poucos, dos participantes na largada, quando o desgraçado do bicho já está preso por uma corda e a ser puxado para dentro da camioneta, desatam – à socapa, não vá, mesmo preso, o diabo tecê-las – à biqueirada ou à traulitada com a ponta de guarda-chuvas.

Borrei definitivamente a pintura quando, regressado à base depois de uma visita à “nossa” Olivenza, insultei a estátua de homenagem ao monarca da restauração, insultos justificados pelas esmagadoras diferenças que há entre o lado de cá e o lado de lá, mal se atravessa a ponte sobre o rio Guadiana e se passa para lá da simples tabuleta que sinaliza a entrada em Espanha.

Antes de, rapidamente, me por na alheta, tinha desabafado para os meus companheiros de viagem: que pena os gajos não terem posto a tabuleta em Oeiras!

Misérias

(photo by wrigham on Flickr)

É no próximo fim-de-semana que vai decorrer mais uma festa do “Avante”, o jornal do partido comunista português, que contará com a presença de muitos democratas, representando partidos irmãos. Uns estão no poder, como o de Cuba e o da Coreia do norte, e outros gostariam de estar mas, por enquanto, não estão. É o caso dos representantes do partido comunista colombiano que, teme-se, poderá trazer outra vez as FARC, organização que a união europeia classificou como terrorista e que, entre outras acções de cariz social, mantém refém e prisioneira politica, há cinco anos, uma senhora que dá pelo nome de Ingrid Betancourt.

Imagina-se a chinfrineira que, por esta altura, já se faria ouvir por tudo quanto é imprensa de referência, escrita e falada, se em vez de esquerdistas, os terroristas que nos pudessem vir fazer uma visitar, fossem de uma qualquer organização ligada à extrema-direita.

Faço figas para que nenhum dos cubanos que cá vem se lembre de aproveitar a viagem para dar o salto e pirar-se do paraíso do camarada Fidel; os últimos rapazes que o tentaram num país onde se fala a língua portuguesa – o Brasil – acabaram apanhados pela polícia local e recambiados para a ilha onde, alegadamente, foram premiados com um programa, grátis, de aperfeiçoamento e aprofundamento da noção de liberdade e do respeitinho (além de uma colecção de cromos e outra de alfinetes de lapela, ambas de Lula da Silva).

Confesso que não entendo como é que há tanta gente a querer sair de lá. Se calhar é tudo mentira e não passam de invenções dos inimigos dos camaradas, que não olham a meios para tentar denegrir a imagem das democracias comunistas, a cubana neste particular. Pior: segundo consta, os tolões, não só querem sair aos magotes como – ai valha-me o camarada Estaline! – escolhem como principal destino os … USA.

Preocupado, eu vou cumprir a minha parte e vou, mesmo que vá sozinho, levar-lhes à festa do Avante, alguns milhares de exemplares (para eles depois poderem distribuir lá na terrinha) de uma das edições da semana passada do Diário de Noticias, onde se dá conta que o número de pobres lá nos states é de 36 milhões! Tantos que, segundo o diário, constituiriam o terceiro maior estado, à frente da Califórnia. Perguntar-lhes-ei: é para lá que quereis ir? Heim? Dir-lhes-ei: pensem bem rapazes, pensem bem se querem viver como esses trinta e seis milhões, com:
- Salário anual inferior a 13,167 dólares (mais ou menos 9,700 euros). Já agora, a título de curiosidade, o rendimento médio anual dos agregados americanos foi de 48,200 dólares em 2006 (uns míseros 35, 500 euros por ano, bem longe da média que existe nos paraísos dos camaradas e até da nossa própria média).
- 43% desses pobres são proprietários das suas casas (com três quartos em média, garagem, terraço e quintal; 80% têm ar condicionado; 75% têm 1 carro; 97% têm uma televisão a cores e 50% tem duas; 62% têm televisão por cabo ou satélite; 89% têm micro-ondas e um terço tem máquina de lavar louça, etc., etc.

Só mesmo a jovens completamente destrambelhados da cabeça é que lhes passaria pela mona querer ir para uma terra assim. Inconscientes e muy locos de la cabeza!

Monday, September 03, 2007

Celebrando


(Nota da administradora deste blog: como quem "posta", "ilustra" e mantém este blog sou eu, escolhi este cartoon como forma de protesto pelas baboseiras que abaixo são escritas sobre mulheres, mulheres ao volante e fornecimento de cerveja pelas ditas. Pela parte que me cabe, a partir de agora quem quiser cerveja nesta casa que a vá buscar:)!!!)

Hoje somos nós, os dragões, que estamos a aproveitar o sol! Mandámos os lagartos para dentro, para a sombra, e eles foram em bando mas com tranquilidade juntar-se às águias que, coitaditas, estão feridas. Presumo que ambos se vão limitar a travar aquela luta renhida que, nas ultimas duas décadas, têm travado pelo titulo de campeão da segunda circular, competição menor e sobre a qual eu nada sei o que, em boa verdade, me não interessa.

Nestes assuntos importantes e vitais (como é o caso do futebol) eu, quando posso, vou logo de peito feito para a gozação e aproveito a maré enquanto ela dá. Como é o caso! Quando muda, enfio a viola no saco, fico surdo, encolho-me na posição fetal e deixo que me martelem os costados até se fartarem ou até a maré me sorrir outra vez. Ainda há coisa de umas semanas levei tantas que ainda tenho algumas nódoas verdes.

Ontem celebrei a nossa vitória com cerveja! E muita! Por isso não estou a conseguir escrever sobre o tema que tinha escolhido para hoje, sobre a teoria da relatividade e o seu efeito nos verdeufémios

Não sei se sabem mas a cerveja e a roda são as duas principais invenções de todos os tempos e explicam o modo como a nossa sociedade se comporta hoje.

Reza a história que primeiro foi inventada a cerveja; os homens, para ficarem perto da fábrica, formaram as primeiras aldeias levando consigo as suas mulheres para que estas se levantassem cedo, fizessem as camas e fossem buscar a caloria enquanto a maior parte dos homens curtia a buba da véspera e ia à caça para ter qualquer coisa que petiscar enquanto mamava a dita.
Era função da mulher providenciar para que a casa se mantivesse sempre bem fornecida com o liquido enquanto esperávamos pela descoberta da garrafa e da lata, invenções que viriam a facilitar a sua conservação e o seu armazenamento.

Alguns dos homens não bebiam e, entretanto, começaram a coser, a tratar dos cabelos, das unhas, etc. Muitos tornaram-se activistas e outros conseguiram até transformar-se em mulheres.

Como não há mal que sempre dure nem bem que se não acabe, quando elas começaram a recusar-se a ir buscar a nossa cerveja, fomos forçados a pensar; desse esforço mental nasceu a roda.

No princípio como elas não perceberam logo a utilidade da coisa ainda tivemos que ser nós a pedalar até à linha de produção.
Quando conseguimos que elas percebessem a utilidade da roda, caíram-nos em cima as contas das reparações dos estragos que elas faziam quando andavam sobre as rodas e fomos forçados a inventar o frigorifico e o camião e convencer o fabricante a trazê-la até nós.
E assim estamos, nos dias de hoje, como os dragões: sempre a malhar!

Tuesday, August 21, 2007

Assaltantes

(photo de yaleglobal.yale.edu)




A fazer lembrar o prec, umas dezenas de putos e delas também, invadiram uma propriedade privada no Algarve. Cumprindo a tradição, toca a desfolhar o milheiral que o idiota do dono da propriedade semeou para – pasme-se! – ganhar algum cacau, o que, como toda a gente sabe, é péssimo sinal dos recalcamentos burgueses que, infelizmente, ainda entopem a mona de muito indígena mal formado e estúpido (infelizmente é também o meu caso mas eu aguardo, impaciente, a minha vez para a lavagem ao cérebro).

A maior parte daqueles vândalos e arruaceiros (as televisões e a imprensa têm, até agora, sido mais carinhosos na adjectivação da espécie), tinha a tromba tapada por causa da alergia ao pólen; estranhei o facto porque, sendo eles burros, achei que deviam estar habituados ao feno.

Percebo também porque razão a GNR não conseguiu impedir (mesmo sabendo antecipadamente da excursão), identificar ou prender a esmagadora maioria dos malfeitores: não havia latagões nem latagonas, eram todos magricelas como o milho derrubado, e se algum deles levasse um carolo a sério, além de correr o risco de ficar descabeçado para o resto da vida, o pobre do soldado que tivesse cometido tal crime ia levar com o mundo em cima, sem falar na hipótese, terrível, de ser o alvo num sermão de frei Anacleto Louçã (agora que o mencionei aproveito para lhe desejar as melhoras da laringite que o impediu de vir a publico condenar este acto).

O gang insere-se num movimento mais vasto de palhaços radicais, cujo circo este ano acampou em Aljezur; denominado Ecotopia e é segundo os promotores “… um modelo funcional de comunidade auto-sustentável que coloca em prática os princípios de um estilo de vida alternativo e mais amigo do ambiente: tomadas de decisão por consenso, reciclagem de lixo, refeições vegetarianas, uso de energias alternativas.(...) tem uma estrutura horizontal (não-hierárquica) e auto-organizada; a todos é pedido que tomem parte no funcionamento do campo, resolvendo problemas e tomando decisões. E todos são responsáveis pelo programa. O Ecotopia funciona no sistema de ecotaxas - um sistema económico alternativo baseado no padrão de vida e rendimento médio de cada país, em vez de baseado nos mercados financeiros, o que significa que cada um no Ecotopia paga pela comida o mesmo que pagaria no próprio país”.

Hummm … reconhecem o cheiro? Mais mal cheiroso fica quando tomo conhecimento que o Instituto Português da Juventude – organismo governamental – incentivou à participação da nossa juventude no acampamento (a página oficial do governo com o apoio já “desapareceu” da Internet mas há sempre rabos de palha …).

Se a coisa se mantivesse só pelo empurrão inicial de incentivo à participação e à angariação de desmiolados, vá que não vá, mas a prática cá no burgo mostra que antes, durante ou depois do empurrão das autoridades, sejam elas autárquicas, centrais ou europeias, a este género de organizações que se mascaram de ONG’s, vem o subsidiozito sem o qual não há pão para malucos.

E de quem é o taco que as autoridades – as autárquicas, as centrais e as europeias – desperdiçam neste e noutros grupelhos com objectivos parecidos?
Exactamente!

É assim


(foto no DN Online)


Acabei de ler o livro da Zita Seabra onde ela conta como foi a sua vida, desde o momento em que, menina rica com dezassete anos, passou à clandestinidade até ao final da década de oitenta, altura em que, definitivamente, conseguiu largar a pele de comunista com que se enrolou durante anos.

Para muitos conceituados democratas esquerdistas, mesmo depois da realidade do muro de Berlim lhes ter caído em cima dos costados, ler este livro deve ser pior do que levar um murro nas trombas e ficar KO. Toda aquela treta sobre democracia, liberdade e igualdade mandada às malvas pela pia abaixo, gentileza de uma das suas mais empenhadas lutadoras.

Para outros, ler aquilo ou não ler vai dar ao mesmo, eles acreditam e – mais grave! – querem que nós também acreditemos naquela banha da cobra para, escravizando o maior número de tolos que conseguirem, terem uma vida rica e darem rédea solta à sua bestialidade.

Infelizmente há ceguinho que não quer ver! À vista de tanta evidencia, ainda há muito boa gente com muito carinho e respeito por outros ditadores vivos, tipo o senhor Saramago, o senhor Fidel Castro e o senhor Hugo Chavez, entre outros. Tudo bons rapazes, malta fixe, daqueles que animam as patuscadas com a sua exuberância e que cativam assistentes para as suas pantominices!

Como a Márcia Rodrigues, jornalista do nosso canal de televisão público que entrevistou, no passado mês de Julho, o embaixador iraniano em Portugal. Não vi a entrevista. Só vi duas fotografias da jornalista na sua função. Da Márcia só se vê uma pequena madeixa do cabelo loiro e a cara. Tudo o resto está bem tapado, com véu, roupa a tapar o pescoço e luvas pretas nas mãos. Ela, que deve ter orgulho em poder celebrar, em liberdade, o dia internacional da mulher, o dia internacional do combate à violência contra a mulher e outras efemérides importantes para as meninas na sua luta pela igualdade face aos meninos, justificou a farpela usada como a adaptação à lei da teocracia islâmica dizendo ser bom que o nababo tuga saiba que ela seria presa se ousasse apresentar-se vestida como lhe é habitual no seu dia-a-dia nesta laica republica portuguesa. Porém, segundo uma fonte da embaixada do Irão em Lisboa, não foram dadas quaisquer indicações à jornalista sobre a forma como ela deveria vestir-se, lembrando que "mesmo que alguma embaixada tivesse a pretensão de dizer a um cidadão português como ele deveria vestir-se dentro do seu próprio país, esse cidadão não era, de forma alguma, obrigado a obedecer às instruções dessa mesma embaixada”.

Não sei quem mente. Não parece nada bem é a nossa Márcia (e já agora o nosso canalzinho de TV) curvar-se tanto perante o representante do ditador iraniano, porque é uma chatice quando esta gente agarra o poder: só o largam à biqueirada!

Por isso é que a Zita Seabra, no seu livro Foi Assim, se congratula com o facto de Cunhal não ter tido poder real porque “ao mesmo tempo que exercia um profundo fascínio, dada a sua forte personalidade, bastava conviver um pouco de perto com Álvaro Cunhal para lhe perceber uma profunda desumanidade nas relações humanas, muitas vezes a roçar a crueldade”. Está na cara: foi assim e é assim! Né?

Thursday, August 09, 2007

Viva




Já cá moram quinze diazinhos de papo para o ar numa praia algarvia!
Além do bronze, oferta do rei sol, trouxe também dois pares de quilos para chatear as minhas calças; vai-me dar um gozo do caraças ver como é que elas se vão desenrascar e conseguir enfiar pelas minhas pernas acima sem perturbar, em demasia, a hortaliça. O cinto, impossibilitado de se meter na fivela, desapareceu sem deixar rasto. Se por acaso algum dos leitores tiver um, para aí com uns dois metros e meio de comprido, que não use, saiba que estou comprador, pelo que me poderá contactar para uma rápida conclusão do negócio.

Até nem sou dos que comem muito; bem pelo contrário! O meu problema tem a ver com a manteiga, as loiras e os gelados. Por esta ordem! O resto do que como é muito à base de grelhados e cozidos, tudo muito saudável.

Felizmente esta mania com a culinária saudável está muito em moda entre os adolescentes, pelo menos entre as raparigas e os rapazes que, este ano, frequentaram a mesma praia que eu. Só gente linda e elegante, praticamente ninguém excessivamente nutrido.
A contrariar os pregões dos vendedores ambulantes a produtos, fritos, que dão cabo da saúde, o “olhà bolinha com creme, a bolinha sem creme e o creme sem bolinha” ou o “olhà bolacha da dona aurora, feita de manhã para comer agora”, está o delas e o deles, anunciado sem pruridos de espécie alguma: cozam-se os carvalhos! Em qualquer lugar e a qualquer hora!

Fui ao barbeiro porque o meu cabelo é infernal e, nem nas férias, fica quieto. Agora frequento um que fica num centro comercial; para rentabilizar a barbearia e como há muito mais mulheres que homens, criaram um espaço que está a funcionar como barbearia para gajas e que já ocupa quase o dobro do nosso território.
Hoje tive que esperar quase uma hora pela minha vez. Eu e mais os seis marmanjos carrancudos que tiraram a senha antes de mim; elas, as senhoras, chegavam aos magotes, sorridentes e faladoras. Bichas para elas? Nenhuma! Estavam todas do nosso lado!

Quando um homem é chamado para o acto a que vai, estrafegam-lhe o pescoço com uma porcaria dum enorme babete velho, lavam-lhe a cabeça com sabão clarim, esfregam-na depois com um pano de limpar o chão, empurram-no para uma cadeira já cheia de cabelos, fazem-lhe o que tem a fazer e … prazer em vê-lo, até à próxima!
Elas? É só sorrisinhos e beijinhos, “querida, que óptimo aspecto, e ainda não esteve na praia? Não? Quem diria!, mas isso é fantástico!”, desaparecem por detrás duma porta (apostava que lhes dão um aperitivo às escondidas) e reaparecem com uma bata branca absolutamente impecável a proteger a roupita; as mãos que lhes esfregam o couro cabeludo estão equipadas com luvas pretas da mais pura seda.
O desvelo pela criatura sentada na confortável poltrona até enjoa: “Querida, a temperatura da água está boa? Não está muito apertado no pescoço, pois não? ”, “Ó Mizé, na tua cliente tu só usas o nove trinta e oito porque, no preto dela, esse realça-lhe a mate, e – não te esqueças! – não abuses do oxidante!”.
O coração aperta-se-me quando vejo uma coisa com a cabeça repleta de folhas de papel de alumínio; lá fora as nuvens estavam pretas e se trovejar aquela coisa vai atrair um raio. E eu temo ficar como os carvalhos: cozido!

Os Combatentes


Por um lado é muita boa, por outro lado é muito má! É boa porque me relaxa, é má porque me mantém excitado! É boa porque me deixa deitar à vontade, é má porque o seu calor, às tantas já me chateia. É má, é muito má porque leva-me uma pipa de massa!

Por acaso até que não estou a olhar para nenhuma fotografia e nem estou a ver nada à minha frente e apesar da afirmação anterior se referir a algo do género feminino nem de perto admito que me imaginem capaz de tais pensamentos, quanto mais ter a lata de os expressar por escrito.

Refiro-me simplesmente a esta época do ano e ao mês de Julho, sinónimo de férias, as minhas ricas duas semanas de sorna absoluta, sem ponta de remorsos por não estar a fazer nada de útil com o meu tempo livre (tretas do género de cortar os arbustos, pintar os alpendres, arrumar o escritório, deitar fora o arquivo morto, etc.). Esta é a parte boa, que me relaxa e que me deixa dormir.

A parte má, a parte que me mantém numa excitação danada, que me dá uns calores do caneco e que me leva uma pipa de massa é a primeira prestação do pagamento por conta do IRS. É uma chatice, eu não me habituo, a cada ano que passa fico mais furibundo com esta “tradição” provisória que, entretanto, passou a definitiva!
Nem o óleo de fígado de bacalhau me deixava este amargo na boca, esta sensação de dinheiro muito mal gasto, mal empregue ou mal empregado!

Ainda por cima, cada vez são mais as evidências que me dizem que bem posso ir praticando o kiss-kiss goodbye às pensões de reforma que (não) vou ter!
Portugal – dizem – é um dos sete países mais envelhecidos do mundo. As estatísticas dão conta que estamos muito abaixo do nível de substituição das gerações o que, trocado em miúdos, significa que em 2050 teremos perdido quase vinte e cinco por cento da nossa população. O número médio de filhos por mulher em idade fértil desceu de 1,41 para 1,36, isto é, cada mulher gera um puto e um terço, mais coisa menos coisa. 2006 foi o mais baixo desde que há registos estatísticos, tendo nascido menos 4100 putos do que em 2005.

Toda esta maçaroca que o monstro me leva, vai-me fazer uma falta do caraças quando for jarreta; por essa altura já “eles” a gastaram, sem dúvida nenhuma, com enorme solidariedade pelos menos necessitados e em obras tipo futebolês. E quer-me parecer que o exagero na auto-protecção da classe politica europeia, mais sus muchachos, vai dar cabo da pouca vontade que os jovens da classe média ainda têm para, marmelando, irem procriando!

E, por essa altura, quando eu for jarreta, uma bengala por membro para poder andar direito, por muito bem que e minha Maria me trate, palpita-me que não vou ser como certos marmanjos que eu conheço que, aos oitenta e picos, ainda têm genica para se meterem, com prazer, em certo tipo de bolandas que, a muitos jovens como eu, já fazem confusão!

Sensibilidade




Estou um bocadito mal disposto e sinto até uma ligeira sensação de enjoo. Talvez devesse ir escrever lá para fora, para a rua, sempre era uma forma de arejar o capacete. Só que fora de casa já não posso dizer mal de nenhum elemento do nosso governo, conforme lembrou – e muito bem! – a secretária de estado da saúde, Cármen Pignatelli, numa cerimónia oficial: “as pessoas são livres de dizer aquilo que pensam … nos locais apropriados, ou seja, nas suas casas, na esquina, no café”.
Cada cabeça sua sentença? Depende do sítio!

O enjoo não é por causa do programa televisivo deste fim-de-semana porque consegui, nas calmas e às mil maravilhas, evitar todo o contacto ocular e auditivo com os directos dos milhões de amigos da natureza, por esse mundo fora, aos berros e aos pulos, muito amiguinhos uns dos outros; no final, como é hábito nestes encontros, lá deixaram espalhadas pelo chão as impressões digitais de preocupados ecológicos, antes de irem para dentro, para as suas vidas diárias fazer, sabe-se lá, exactamente o quê sobre a matéria festejada.
Entre as celebridades mundiais anunciadas, algumas havia com um currículo público, em matéria ambiental e civilizacional, de fazer inveja ao estripador de Londres, aos irmãos Cavaco ou à antiga deputada Cicciolina.

Como não tenho filhos em exames no secundário, também não é efeito do modo airoso como o ministério da educação resolveu o problema causado pela anulação de uma alínea duma das perguntas do exame nacional de Física e Química do 11º ano em resultado dum erro que impossibilitava a resposta. Reunidas as cabecinhas pensadoras do ministério, a opção, rapidamente encontrada, foi a de multiplicar o resultado final obtido por cada um dos alunos por um coeficiente de 1,0417.
Isto é, quem obteve, por exemplo, 180 pontos no exame ficou com uma nota final de 187.50, com 104 se obteve 100 pontos e por aí fora. A mesma pergunta, impossível de responder por qualquer laminária, nacional ou estrangeira, valeu, óbvia e democraticamente, mais para os melhores alunos e menos para os piores.
Como a média final dos cerca de trinta mil alunos que fizeram o exame foi de 72 pontos significa que, para a esmagadora maioria, estar lá a pergunta ou não estar foi mesmo igual ao litro.

Nem mesmo a possibilidade do número de lampiões passar de seis para cerca de seiscentos milhões graças a uma engraçada chinesice pode ser a causa deste mau estar.

Às tantas, é simplesmente o meu fígado, sempre muito sensível, muito delicodoce, muito igual aos nossos governantes e desprovido de qualquer sentido de humor, a destilar bílis a granel, chateado por causa de umas quantas jolas que fui emborcando, durante o fim-de-semana, por causa do calor tórrido que se fez sentir. Que figadozinho mais copinho de leite!

Arrepios





Acho bem que o senhor S. Pedro pare de brincar com as estações e que deixe partir a prima vera lá para a santa terrinha, para umas férias merecidas e que, em troca, ponha cá o senhor verão a conduzir a máquina, especialmente durante toda a segunda quinzena deste mês, por acaso até era o que me dava mais jeito.

Esta instabilidade da natureza provoca, como não podia deixar de ser, alterações graves na moleirinha do gentio. Estas alterações podem ser mais ou menos visíveis a olho nu e, dependendo do grau de responsabilidade do indígena atormentado, ter mais ou menos impacto na populaça. Uns chamam a isto o aquecimento global e dizem que a culpa é do homem (a mulher, curiosamente, nunca é culpada de nada!); outros, ainda poucos, dizem que não senhor, que isto é o resultado dos humores do rei sol, o absoluto, e das explosões dos seus raios e que nós homens (as mulheres, já se sabe …) não somos ouvidos nem achados nesta mudança do clima.

Os defensores da teoria da culpa do homem no aquecimento global gastam rios de dinheiro para informarem e formarem os nossos descendentes, azucrinando-lhes a tola para pouparem energia, para apagar as luzes quando não forem precisas, para desligar os televisores no botão quando a não estiverem a ver, para não deixarem os carregadores dos telemóveis ligados na ficha quando não estão a ser utilizados, para não deixarem aberta a porta do frigorifico durante muito tempo, etc., etc.
No fundo, a mesma lengalenga que, desde putos, os desgraçados dos meus filhos me têm ouvido a berrar, não por causa do famoso aquecimento, mas por causa do arrefecimento que as contas elevadas da luz, da água e do gás, provocam na minha carteira. Tenho até uma vaga ideia de já os meus pais me darem na corneta por motivos parecidos mas não estou a ver como é que nesse tempo eles fossem ecologicamente já tão adiantados. Inclusive, sonhei que li algures, que nos tempos das lamparinas, também já havia gajos que ficavam virados do avesso com os desperdícios no uso do que quer que fosse que então usavam para poderem ver as trombas uns dos outros quando o sol se punha.

Não tendo ainda, por burrice e por preguiça, formado a minha opinião sobre a matéria, devo confessar uma certa inclinação pelos argumentos dos cientistas que discordam da teoria oficial, encabeçada pelo mediático senhor Al Gore e sus muchachos.

Praticamente sem divulgação na nossa europa, um canal de televisão inglês transmitiu no passado mês de Março um programa documentário, onde um conjunto de especialistas sustentou a tese de que a mudança no clima que estamos a viver não tem nada a ver com a acção do homem e que houve, no passado recente, épocas semelhantes, nomeadamente uma mini idade glaciar no século dezassete que gelou o rio Tamisa de tal forma que até futebol podiam ter jogado no seu leito congelado e um período quente, há cerca de nove mil anos, considerado o período mais quente dos últimos dez mil anos e responsável pelo desaparecimento da face da terra da primeira geração das lambretas a gasóleo.

Consta que a elevada temperatura da política caseira actual parece ter como causa os absolutistas que, como o rei sol, estão sempre a cozinhar alguém ou alguma coisa, seja em lume brando, em velocidade de cruzeiro ou à pressa.

Thursday, June 28, 2007

Mensagem



É assim a História. Amontoado de histórias que, ligadas umas com as outras, nos ensinam e nos explicam como nos fomos portando ao longo dos tempos. Para contá-las, houve, há e haverá, contadores que, oralmente, através de desenhos, de textos ou de filmes, vão alimentando a necessidade que temos para perceber os porquês do que já foi.
Cada cabeça sua sentença, cada contador sua versão da história.

Um desses contadores, “Menino da Luz” e oficial de Cavalaria, protagonista privilegiado que foi num recente e importante acontecimento da nossa História pátria, partiu há dias. O muito pouco que se permitiu contar da sua versão, substancialmente diferente da oficial que os meus netos vão ler nos livros escolares, contrastava com a catadupa de pequenos detalhes com que, copo de whisky numa mão e um cigarro na outra, o seu vozeirão embrulhava a descrição das dezenas de aventuras que viveu pelos quatro cantos do mundo sob domínio português por onde andou.

Desta vez, e ao contrário do que fez durante toda a sua vida, deixou as suas mulheres para trás. Uma delas, a minha Maria, em nome de todas as outras, com uma cunha minha e a devida licença do senhor director, à laia de agradecimento pelos muitos telefonemas recebidos das gentes beirãs, transcreve o texto da carta que lhe mandaram para o espaço:

Podemos chorar por teres partido
Ou então sorrir por teres vivido;
Podemos fechar os olhos e rezar para que voltes
Ou abri-los e ver tudo o que nos deixaste;
Podemos sentir o coração vazio por não te termos aqui
Ou senti-lo repleto do amor que partilhámos;
Podemos virar as costas ao amanhã e viver no passado
Ou guardar connosco o passado e olhar felizes para o futuro;
Podemos recordar somente que partiste
Ou podemos manter viva a chama da tua memória;
Podemos chorar e fechar a nossa mente,
Sentir-nos vazios e virar as costas
Ou podemos fazer aquilo que desejarias:
Sorrir, abrir os olhos, amar e seguir em frente.

Tuesday, June 19, 2007

Enredo

(imagem de www.star.ucl.ac.uk)
Plantar uma árvore, ter um filho e escrever um livro.
Eram estes, quando eu vivia regalado e sem responsabilidades, os três objectivos fundamentais na vida de qualquer candidato a macho que se prezasse. Cumpridos, sem esforço e com prazer, os dois primeiros, era normal e lógico que começasse a tratar da tarefa que me faltava para obter o desejado estatuto.

Iniciei os estudos há dez anos. Decidi que ia ser um livro de ficção, um romance policial, romance que ia ter pelo menos umas quinhentas páginas (gosto de ler ao quilo, tinha que escrever em conformidade), ia vender para aí umas quinze edições – só em Portugal! – a história girava à volta das peripécias de um grupo terrorista que pretendia levar a cabo um atentado biológico, através da disseminação do vírus do ébola, a ocorrer durante o jogo da final do campeonato europeu de futebol que estava marcado cá para o burgo.

Da empreitada, tenho escritas umas oitenta e tal páginas e, exactamente, trinta e sete anos para acabar as restantes quatrocentas e pico. Parece um prazo relativamente apertado mas, sem esforço e sem vontade, o falhanço está no papo. Só lamento o tempo que fiz perder aos meus editores chineses e nepaleses, países onde a minha obra era esperada com grande expectativa e que, com esta minha confissão pública, vão sofrer uma enorme decepção.

Não pareço mas, apesar de sorna, sou persistente e, na esperança de um dia voltar ao romance, necessito de exercitar e desenvolver a minha criatividade (caso contrário enferruja ainda mais). Para o conseguir já seleccionei duas hipóteses: concorrer a um lugar na agência de informação AFP (Agence France Press) ou candidatar-me a biógrafo oficioso do novo aeroporto de Lisboa.




Na AFP é dado enorme relevo e importância à ficção e à criatividade, como comprova a publicidade para angariação de novos talentos, feita através da publicação de uma noticia na semana passada de que o vai e vem americano Atlantis “tinha explodido segundos após o lançamento para mais uma viagem até à estação espacial, cujas imagens estavam a ser difundidas pelo canal de televisão da Nasa”. Infelizmente para mim, neste mundo global, tal anúncio foi visto por milhões de marmanjos que também vão querer concorrer a tão cobiçado lugar.
Mentes sem sentido de humor andam por aí a dizer, há anos, que a AFP pinta a realidade de acordo com as cores mais ao gosto e desejos particulares e especiais dos seus editores, os mesmos que, só por acaso, não viram o arraial de pancadaria entre palestinianos “moderados” e radicais até terem sido obrigados a pôr os óculos da realidade, que é chata, mas é o que é.

Como candidato a biógrafo do novo aeroporto, poderei escrever ao quilo, sem ter que encher chouriços como tantas vezes faço, há material para umas cinco mil páginas e, o enredo, tem os ingredientes dos melhores livros de suspense: um crime, vários suspeitos reunidos à volta da mesma mesa, cada um com as suas próprias motivações, negociatas, traições, pistas, muitas pistas, falsas a maior parte delas e um castiço inspector chefe encarregado da investigação que, mesmo sabendo muito bem quem é o criminoso e o móbil do crime, só os vai revelar no último parágrafo da última página. E haverá surpresa!

Desejos

(imagem de http://www.barnesandnoble.com/)




O último livro que li era a história de um judeu português, expulso pela Inquisição, e a sua actividade em amesterdão, como negociante de café (o titulo português é "o Mercador de Café").
Quantas vezes, bem lá no fundo, desejamos, silenciosamente, que as coisas, os acontecimentos, corram à nossa maneira? E quando essas coisas, esses acontecimentos, não correm como a gente gostava que tivessem corrido, quantas vezes temos a coragem (ou lata) para dizer como desejávamos que elas se tivessem passado?

Uma das mais conhecidas, mais antigas e mais citadas agências de (des)informação europeia, a AFP (agence france presse), anunciou, há dias e com alguns detalhes, na sua página de Internet que o vai-e-vem espacial Atlantis, cujo lançamento ocorrera pouco tempo antes, tinha explodido segundos depois do seu lançamento. Reflectiria a noticia o desejo secreto, de quem a escreveu ou da própria agência, de que a missão fosse um fracasso e acabasse em tragédia? Não, responderam embaraçados, tratou-se de um infeliz erro, tinham escrito uma peça para o caso de…

Esta mesma agência, que ficcionou a explosão daquela nave americana, teve bastante dificuldade para conseguir ler a realidade e perceber que os palestinianos andavam, há “dias”, à cacetada uns com os outros, assim a modos que numa guerra civil.
Aguarda-se, com ansiedade, que, passados que estão os momentos de distracção, a isenta agência, dê corda aos sapatos e nos informe sobre os verdadeiros culpados desta tragédia, a saber, as democracias ocidentais, o senhor Blair, os israelitas e … esse mesmo, o senhor Bush!

Os cegos que se movem com a ajuda de cães estão a enfrentar problemas nalguns aeroportos americanos quando têm que recorrer ao serviço de táxis conduzidos por islâmicos. A religião não permite que transportem cães, pessoas com álcool, e coisas do género; com direito a corridas grátis só mesmo criancinhas mártir dispostas a estoirarem com balões, pessoas e inutilidades parecidas.

Santos

(foto www.semanal.expresso.clix.pt)

Como já não tinha mais nenhum livro novo para ler tive que me reabastecer e, por isso, fui até à FNAC, aquela mercearia gigante onde se compram computadores, telemóveis, discos, jogos, televisores, livros, sandes, chupa-chupas e bolos. Em destaque dois livros: “O cérebro feminino” com trezentas e tal páginas (no meu tempo chamava-se “O livro em branco” e tinha apenas cerca de cem páginas) e “O dia em que Sócrates vestiu Jeans”, de uma escritora inglesa, apresentado como “inteligente, divertido e original romance que mostra aos jovens que a filosofia pode melhorar as suas vidas… As grandes questões da vida abordadas pelas atractivas técnicas da literatura”.

Com estes dados, Sócrates, inglês e técnicas, pensei tratar-se do nosso primeiro mas, um olhar mais atento ao jovem na fotografia da capa, rapidamente me elucidou sobre o herói principal. Não era o nosso!
Não faz mal porque, a julgar por uma pequena amostra que vi, há dias, na SIC-Noticias, os próximos meses vão ser ricos na demonstração desses conhecimentos, embora eu tema complicações a outros níveis. Pela dita amostra, vai ser um fartote se o homem insistir em dar entrevistas naquela língua de trapos; a conversa há-de, inevitavelmente, sair da parte técnica das engenharias (cadeira em que é elevadamente licenciado) para as coisas mais triviais e aí, sem rede por baixo, a coisa pode ficar feia. Espero, sincera e honestamente, que não lhe aconteça a ele o mesmo que me acontece, muitas vezes, a mim!
Modéstia à parte, também eu sou muito bom na parte técnica (diploma de inglês de praia) mas quando a conversa descamba para o dia-a-dia, como não percebo patavina do que me dizem, meto o meu sorrisinho de plástico – para o conseguir escorropicho tanto a pele da cara que deixo de ouvir! – e, depois, seja o que Deus quiser: podem insultar-me a mim, à minha malta ou ao meu fcp, podem dizer que tenho as mãos nos bolsos e a braguilha aberta, podem contar-me a mais triste e comovente história verídica que conheçam mas, o meu sorriso, só se desfaz quando finalmente me apercebo do silencio que me rodeia e da incómoda sensação de que, a qualquer momento, me vão partir a tromba.

Imaginem-me a falar com o presidente russo, ou com o presidente Mugabe (que virá de visita), ou com o presidente Chavez, ou com o presidente emplastro: troco ou pronuncio mal uma palavra e, de repente, até parece que fiz uma critica sobre a forma como tratam dos direitos humanos nos seus países! Nem em sonhos me passaria pela cabeça fazer tal critica, quanto mais acordado! Sim, quem sou eu, metido no meu cantinho, para dar lições de moral seja a quem for? Santinho?
A conversa até está muito agradável mas, vão-me desculpar, estou ali a ver o Bush e o Blair, badamecos, tenho que lhes ir dizer umas quantas verdades, os gajos andam para aí a abusar, ouvi uns zunzuns sobre cadeias e torturas, haja alguém com coragem que os meta na ordem, vou ali e já venho. Excuse me!

Uma pergunta, aproveitando a boleia ali de cima e já que estamos na época: porque carga de água é que nós não podemos ter santos com nomes nobres, tipo Gustavo, Afonso ou Guilherme e comer bifinhos de lombo com batatinha frita e champanhe a acompanhar em vez dos pindéricos Pedro, António e João mais as suas pindéricas sardinha e sangria, essa mistela demoníaca que arruína a fruta, a gasosa e, até, o mau vinho? Porquê?

Tuesday, June 05, 2007

Indecisões






Bolas pá, assim um tipo anda sempre à nora, sem saber com o que é que há-de contar, isto é duro psicologicamente e alguém vai ter que ser responsabilizado pelos traumas que estas indecisões me causam.
Quando me disseram que a multa a pagar ao ser apanhado a fumar ia dos 50 aos 1000 euros contra uma multa de apenas 25 a 403 euros (substituível por tratamento voluntário) se fosse apanhado a chutar heroína para as veias, percebi que estava na hora de mudar de vício. Somei dois mais dois e, vai daí, concluí que se um delito tem coimas inferiores ao outro é porque é menos perigoso e socialmente mais aceitável. Ao nível da punição, era o chamado dois em um: a troca de um vício mais caro e socialmente asqueroso por um mais barato e mais bem visto. Ao contrário do habitual, saltei da fase do “já faço, daqui a um bocadinho!” para a do “bora nessa Vanessa!” pesquisando na Internet a melhor, a mais barata e a mais rápida forma de trocar de veneno.

Acabada a pesquisa, optei pela compra do pacote que me pareceu o mais adequado ao meu caso particular: um curso diurno de dois dias de “Técnicas de assalto por esticão em zonas urbanas” e outro nocturno, em fim-de-semana, de “Antecipe-se ao estado e alivie a sua família do peso das pratas, do ouro e/ou de outras riquezas materiais”; um bónus, uma espécie de mestrado em “Activismo pacifico anti globalização”, ministrado durante uma qualquer reunião dos G-8, com tudo incluído, a viagem de ida e volta de avião, regime de meia-pensão na primeira noite numa casa ocupada, as seguintes em pensão completa nos calabouços da policia ou num hospital local, um kit de material escolar com quatro paralelepípedos para a prática do tiro às montras, aos carros e às trombas dos broncos que ainda se dão ao trabalho de fazer cumprir a lei, quatro esferográficas, três pensos rápidos, uma t-shirt com o Che estampado e um CD com alguns dos discursos do novo rei da banha da cobra, o grande líder venezuelano.

Eis que, do nada, vem a menina Maria de Belém (sempre tão pequenina, tão sensível, tão sorridente, tão penteadinha, tão bonequinha… ahhhhhh – suspiro! – tão querida!), informar que, alertada que fora por colegas parlamentares (fumadores???), vistas bem as coisas, era bem capaz de haver qualquer coisa de errado naquela tabela de coimas, sabe-se lá, quiçá a merecer alguma reflexão. Em que ficamos, mudo ou não mudo de vício? E posso ou não deduzir no irs as despesas que tive com o curso?
Não deixa porém de ser verdade que tem lógica, aos olhos dos caçadores de receitas para a manutenção dos vícios do estado, a maior penalização dos fumadores (que continuam a comprar a matéria-prima às claras, desde que abifem com o imposto de selo); a enorme esmagadora maioria desses agarrados ao fumo, mesmo depois de muitos anos de vicio, consegue manter raciocínios coerentes, comportamentos razoáveis, moradas conhecidas, toda uma panóplia de defeitos que os forçam a manter-se em empregos remunerados, remunerações essas que acabam por se traduzir, em muitos casos, no crescimento dos seus activos, portanto, alvos que, indefesos, mesmo bufando, pagam mesmo!

Um aviso público à minha Maria e aos meus putos, sem qualquer relação com o texto anterior: transferências, a partir de agora, só para debaixo do colchão da cama do quarto de costura! Know what I mean? Quem não souber inglês, pode pedir ajuda a qualquer um dos alunos que frequentam essa disciplina na universidade da terceira idade da cidade de Tondela.

Tuesday, May 29, 2007

8, 15 dias

(cartoon by Chris Madden)

Quem não conhece alguém que, por causa de um susto, tenha alterado rotinas e comportamentos? Por exemplo, alguém que, confrontado com o resultado das suas ultimas cinquenta e duas análises ao sangue, tenha decidido, de imediato, deixar de beber sumo de uva nas quantidades habituais e passar a beber só água, tal-qualmente os camelos da outra margem ou alguém que, depois de ter escaqueirado o popó contra o poste da luz pública, por causa dos pneus carecas na chuva miudinha, tenha tomado a decisão de começar a comprar pneus novos a cada quinhentos quilómetros percorridos.

Aconteceu-me no último fim-de-semana. Um susto e a consequente prometida mudança. Para já, dado o curto espaço de tempo entretanto decorrido, não passa mesmo de promessa mas a minha determinação, alimentada pelo medo, está, por enquanto, firme e hirta como o aço.

Éramos quatro: eu, a minha Maria e os meus progenitores. Nos bandulhos: pastéis de bacalhau, rissóis, moamba de pato, gelado de natas e chocolate e o famoso leite-creme da tia Arlete. Lubrificante: duas garrafas de tinto, reserva de 2001 da Quinta da Espinhosa. A conversa fluía com a ligeireza apropriada ao repasto. Subitamente, uma deriva sexista abateu-se sobre os homens presentes na mesa, a propósito da argumentação usada pela minha Mãe para justificar aquela que seria, para ela, a grelha ideal para a partida na grande corrida para o Além: primeiro vai ele e depois, oito, quinze dias no máximo, vai ela. Porquê, por esta ordem? Por duas razoes: ele é mais velho e – esta é que é a grave, a tal que me pôs a tremer de medo – porque ele, sozinho, seria absolutamente incapaz de se governar! De notar que, no caso, se trata de argumentos inatacáveis!

Foi o olhar de “estás a ver o que te espera também a ti, ó meu grande nabo” que a minha Maria me lançou, que provocou este frenesim que me deu para mudar a minha vida!
A partir de agora – decidi! – vou-me esmerar e aplicar nas lides caseiras e na arte de bem cuidar sozinho de mim, com a mesma tenacidade com que me tenho aplicado no ténis, no descanso solitário de papo para o ar ou no jeito de levar à boca os vários tipos de copos com que sou obrigado a lidar (modéstia à parte, eu que até nem sou menino para me gabar, gostava, mas a sério, gostava mesmo, gostava que vissem a técnica que aperfeiçoei a emborcar champanhe: é um espectáculo..!).

Na fracção de segundo que durou esse olhar de “não perdes pela demora”, uma longa-metragem das milhares de imagens sobre as minhas inutilidades passou-me diante dos olhos. Nelas pude constatar a catrefada de genes herdados do meu Pai, defeituosos todos eles, coitaditos: as camas mal feitas, feitas sem o necessário cuidado em puxar bem ou bem alisar o lençol de baixo, a gola do lençol de cima sobre o edredão que, de tão torta, mais parece a estrada para o caramulo, as almofadas que ficam sempre como se tivessem acabado de sair de debaixo das rodas de um autocarro de dois andares cheio de turistas gordos, os casacos dependurados em tudo quanto é cadeira pela casa fora. E as refeições? Quando é que foi a última refeição que eu cozinhei para mim ou para a família? Tive que recuar seis anos, para me poder vislumbrar, de avental, a fazer uma torrada! Nesse ano entrou ao serviço o meu filho mais novo, promovido a cozinheiro ajudante, com a função de nos alimentar quando a Maria, por qualquer desgraça, não estiver disponível.

Tudo isso é passado! Juro que vou mudar! Não me façam já a grelha para a partida!



Mais um

(Image: Michael Mucci)

Por cortesia de um fervoroso adepto do novo campeão nacional, adepto que por sinal é o pai das netas dos avós dos meus filhos, deixo-vos a seguinte definição: "casamento é um relacionamento a dois, no qual uma das pessoas está sempre certa e a outra é o marido." Eu sei, é antiga e foleira, mas, com tranquilidade, com toda a tranquilidade, eu tive foi medo de perguntar se sabiam qual é a diferença entre o treinador dos lampiões e o nosso primeiro; é que a resposta implica uma graçola sobre a licenciatura do senhor político e, já se sabe, não se pode andar a brincar com o canudo dele.

Que o diga aquele senhor professor de inglês, antigo deputado pelo PSD, a exercer, há vinte anos, funções numa direcção regional do ministério da educação e que por ter, alegadamente, brincado com o dito coiso em conversa com um colega, logo foi preventivamente suspenso, por vergonhosa falta de respeito, pela sua zelosa directora geral. Dizem, algumas más línguas, que a guardiã do templo e do bom respeitinho devido ao nosso primeiro, até já foi, mera coincidência, colaboradora dum actual ministro, aquele que (quer) manda(r) nos jornalistas.

A propósito de jornalistas, aquele que na TVI, o canal de televisão do cardeal Pina, ficou com a responsabilidade de “traduzir” o discurso que o papa Bento XVI fez no Brasil, deve ter sido vitima duma alergia qualquer, certamente derivada à deficiente qualidade do estado do ar que andamos a respirar (como diz Pacheco Pereira), ou então sofre da tal de claustrofobia de que falou o deputado Paulo Rangel, claustrofobia que também me afecta quando sou forçado a andar no metropolitano, em túneis muito compridos, ou em elevadores apinhados, com os consequentes ataques de pânico e ansiedade. No discurso, Bento XVI condenou o capitalismo e o comunismo mas, na TVI, na legenda que apareceu no ecrã a sintetizar a peça jornalística que o apresentador do noticiário narrava enquanto passavam as imagens da visita, a palavra capitalismo foi “traduzida” para liberalismo.

Atendendo à ideologia do senhor cardeal administrador da estação e à dos seus patrões, há que reconhecer a coerência na preocupação em poupar o “capitalismo” e diabolizar o liberalismo. Bem analisada a coisa, comprovada pela dura realidade quando a queremos ver, quando a conseguimos ver ou quando no-la deixam ver com olhos de ver, é muito mais fácil e corrente os pseudo democratas, de direita e de esquerda, conviverem com o capitalismo ou com o comunismo do que com o liberalismo (ou neoliberalismo, como, parece que, por pirraça, gostam de dizer).

Os que se diabolizam o liberalismo, como gostam, querem e precisam do estado em tamanho gigante e omnipresente, sempre que cheiram alguma agitação nas águas, para poderem justificar a manutenção do mar chão, lá vão colando carradas de, já gastos e estafados, rótulos e avisos alertando para os terríveis efeitos secundários a que as gentes do povo se arriscam quando sujeitas a uma prolongada exposição aos pensares e às práticas dessa gente ímpia e sem escrúpulos.

E, como veículos preferenciais de transmissão, usam boys. Um deles, também jornalista, durante muitos anos ligado à direcção do diário do regime, o Diário de Noticias, é agora, finalmente, um assumido assessor, num ministério. É como o meu grande FCP e os campeonatos: mais um!