Thursday, December 11, 2008

Escuridões


Estou a escrever na sala, sentado no meu sofá favorito, aquele que coloquei ao lado da lareira. Ainda bem que obriguei a Maria a ir buscar lenha e a pegar-lhe fogo porque a luz eléctrica foi-se e levou as outras formas de aquecimento com ela. Lá fora, tudo o que é visível da minha casa, está, também, às escuras o que me leva a pensar que, ou a EDP acabou de dar o berro ou que, simplesmente, se trata de uma avaria cá na minha zona. As sombras tomaram conta da residência e, se os técnicos da empresa de electricidade meteram férias antecipadas como aqueles trinta deputados do pê-esse-dê que se baldaram a uma votação importante na semana passada, estou feito ao bife.
A falta de luz trouxe o silêncio e as sombras, sombras que distorcem a realidade dos objectos cá de casa, objectos que eu devia conhecer bem, tão bem como a palma das minhas mãos.
A realidade que me rodeia está manipulada, estou refém e escravo das trevas. Porque me faltou a luz, deixei de ver e ouvir bem. Mais ou menos como os surdos e ceguinhos dos nossos jornalistas na opinião do economista João César das Neves:
"A nossa imprensa traz pouca informação. Muita análise, intriga, provocação, boato, emoção, combate, mas pouca informação (...). Assiste-se a uma verdadeira caça ao deslize, empolado até à hilaridade. (...) Aliás, relatar o sucedido é o que menos interessa. O jornalista vai ao evento para impor a agenda mediática que levou da sede.O mais curioso é que, embora a imprensa escrita e falada seja intensamente opinativa, nunca se assume em termos políticos. (...) O público não é informado da orientação do meio que escolheu, porque todos dizem apenas a verdade. Todos os repórteres têm opinião, mas todos são isentos de orientações e partidarismos…
"O actual Governo goza de clara benevolência jornalística. Apesar da contestação e inevitáveis 'gaffes', o tratamento não se compara com o dos antecessores. (...) Muitos dos que relatam o jogo participam nas equipas. Quando o jogo se suja, avolumam-se as suspeitas. Isto ainda não afecta o poder da imprensa, mas já degrada a classe."

Felizmente tenho aqui uma pila grande, perdão, felizmente tenho, no computador, uma pilha com uma hora de autonomia e assim posso continuar a trabalhar enquanto os meus vizinhos estão ceguinhos de todo.

Não me levem a mal, mas não imaginam a maçada que é esta coisa de também escrever para jornais espanhóis! Estou sempre a confundir as línguas, meto-me em cada alhada, ainda por cima eu, que sou quase tão envergonhado como o senhor Dias Loureiro ou o senhor Coelho, passo por cada uma, às vezes apetecia-me enfiar num buraco e esperar que a confusão passasse. Como lhes deve estar apetecer àqueles dois agora. Coitados, como eu os compreendo!

A Maria já anda por ai, de vela na mão, a tentar pôr um pouco de luz em tudo quanto é sitio.
Como é hábito nestas situações de falhas de luz, especulamos sobre a possibilidade desta ser uma avaria muito prolongada e fazemos o inventário do nosso kit de sobrevivência.
É o inventário mais rápido de todo o planeta: na dispensa temos duas velas, uma caixa de fósforos semi-vazia, dois pacotes de chá preto, uma lata de sardinha em molho de tomate e piripiri ainda no prazo de validade e, naquilo que eu chamo “o meu bunker”, setenta e três garrafas de oxigénio, no estado líquido, com um grau de aquecimento nunca inferior a doze graus e meio. Estamos portanto equipados para sobreviver quase três dias. Com a água da chuva, talvez conseguíssemos prolongar a nossa sobrevivência por mais uma dúzia de horas.

Pelas estatísticas e segundo os estudos comparativos divulgados pelo governo civil , parece que até nem ficaríamos muito mal classificados mas, para mim, não chega. Exijo mais! Estou farto de dizer à Maria: chica, tens obrigação de fazer melhor!
Quando eu acabar de escrever a crónica e a luz estiver de volta, vou elaborar um novo kit de sobrevivência, vou acrescentar mais uns produtos, pelo menos mais uma lata de sardinha e uma lata de feijão frade e mais umas quantas garrafas de oxigénio, devidamente classificadas por região demarcada, para mais fácil utilização em caso de emergência e incluir um volume de maços de tabaco, para juntar fumo às sombras.

Monday, December 01, 2008

Engenharias


O doutor Vítor Constâncio, que além de ser um socialista empenhado, acumula, desde a pré-história, com o cargo de governador do banco de Portugal, anda furibundo, pior do que uma barata por causa do atrevimento de alguns dos deputados da nação que, imagine-se, ousaram acusá-lo de ter sido, não uma mas por duas vezes, incompetente e desleixado nas suas funções de fiscal.
O homem, cujo salário, segundo consta, anda na casa dos dezassete mil euros por mês (corresponde a mais de 40 meses de salários mínimos…), empertigou-se, disse que parecia impossível acusarem-no e andarem a linchá-lo na praça pública por coisas de que ele não pode ser responsabilizado, essa agora, uma acusação destas nunca se viu, jamais em tempo algum em nenhum outro país do mundo civilizado e que a sua reputação está a ser injustamente prejudicada. Em português simples, está a ver se sacode a água do capote.

Como o canal de televisão de propaganda do governo está lá para fazer fretes e favores, este empenhado socialista foi, há dias, convidado para uma entrevista onde confessou as suas angustias e desvendou que o choradinho de setecentos e tal milhões de euros feito pelo BPP (banco privado português) não só não ia fazer chorar as pedras da calçada como também não iria ter a sua socialista aprovação; quanto muito, visto tratar-se duma banqueta e não dum banco com peso relevante no financiamento da economia nacional, poderia candidatar-se a uma verba correspondente ao seu verdadeiro peso na nossa economia, uma bagatela de quarenta e cinco milhões de “aéreos”.

Este tal de BPP, banco privadíssimo, criado com a massa de empresários do regime e os do costume, publicita, na página de internet, que “a sua missão primordial consiste na preservação e valorização do património dos clientes, através da implementação de estratégias de alocação de activos adaptados às expectativas de rendibilidade e ao perfil de investimento evidenciados”.
O notável sucesso no cumprimento desta missão – a preservação e valorização do património dos clientes – levou João Rendeiro, o seu fundador e maior accionista (cuja carreira de sucesso é contada num livro, ironicamente, apresentado a semana passada), a pedinchar aquela brutalidade de milhões ao nosso banco central; a tal irrelevância no financiamento da economia nacional valeu-lhe o dito manguito.

A feliz conjugação de conversas com as pessoas certas, da reunião dos ditos empresários entalados e da generosidade do espírito natalício (ou da influencia dos entalados), qual conto da Cinderela, e eis uma banqueta sem relevância na nossa economia, transformada, num passe de magica, num banco de prestigio cuja falência – ai Jesus – arruinaria a imagem de Portugal.
Constâncio, depois de bem baralhadas as coisas, com base na penhora dos activos do BPP, vai, afinal, avalizar seiscentos milhões de euros que outros seis bancos nacionais vão adiantar para o BPP cumprir a sua missão: salvar o património dos clientes accionistas, entalando o tuga contribuinte!

Chamem-me burro, ignorante, chamem-me o que quiserem mas, por mais que me esforce, não consigo enfiar nesta minha mona, estúpida e casmurra, porque carga de água é que os tais seis bancos não dispensam, pura e simplesmente, o aval do nosso banco central e aceitam directamente os activos do BPP como garantia do tal empréstimo que lhe vão fazer. Se os activos do BPP são bons para o banco central para que raio é que eles precisam de ter o aval do estado?
Será por esses activos – tipo, acções de empresas como o BCP, a Brisa, etc. – aos preços de hoje, não valerem um chavo, a ponta dum dito? Será? É que eu também preciso de liquidez e tenho uns prejuízos potenciais em algumas acções que gostava de partilhar com o resto dos meus compatriotas (só os prejuízos; dos lucros, se e quando ou houver, eu encarrego-me sozinho, muito obrigado!).

Já agora, se não for pedir muito, será que sua senhoria, o governador do banco de Portugal, poderia dizer, aos paspalhos que o sustentam com os seus impostos, que valor acrescentado trouxe, ou traz, ao banco que dirige e que tenha uma relação directa com o salário que recebe?
Entretanto, hoje comemoramos a restauração da nossa independência! Boas celebrações.


Critérios

(foto daqui)


Escrevo depois de ter tomado o meu pequeno-almoço, um copo de sumo de laranja natural, duas canecas de chá preto e quente com uma pitadinha de leite frio (influências da ascendência aristocrática da Maria) e cento e vinte e oito gramas de manteiga que, à rasquinha, embrulharam os dois brutos e únicos croissants que ainda havia na padaria. É uma chatice esta coisa de ter que me levantar cedo aos sábados para os conseguir arranjar; se não chego cedo, se não chego pelo menos antes das onze e vinte da madrugada, é certo e sabido que já não apanho nenhum.
Quem me conhece deve estar a admirado: cento e vinte e oito gramas de manteiga? Pois é, é verdade! Eu sei, é triste mas é verdade!
Por causa do ácido não-sei-dos-quantos tive que reduzir, drasticamente, o consumo desta delícia e longe vão os bons tempos em que eu mamava trezentos e vinte e dois gramas por pequeno-almoço! Mais grama menos grama, a coisa rondava aí o meio quilo por fim-de-semana. Como muitos de vocês devem estar carecas de saber, a idade não perdoa e a gente tem que se adaptar às ineficiências do organismo, aos vícios que os estafermos dos órgãos e dos ossos ganham com o passar das velas e dos bolos de aniversário.
Agora, de cada vez que vou buscar as análises que me obrigam a fazer – para aí três exames por década – por causa deste maldito ácido que me impede de alambazar naquele maravilhoso derivado do leite, fico numa excitação tal para saber os resultados que mais pareço um professor de matemática quântica a ser avaliado pelo seu colega, o setor de musica.
Será que passei? Ou será que chumbei? No meu caso, ficar abaixo de sete é um feito notável, um alívio do caneco, um resultado digno duma comemoração à maneira, dúzias de bifinhos e de papos-secos bem encharcados no molho daquela especialidade da vóvó Jújú (pronto, já babei a porcaria do teclado! …).
Se a excitação de levar com um sete me põe tão contente como se tivesse ganho o primeiro prémio do sorteio de Natal do café da estação – um Magalhães – o mesmo, provavelmente, não se aplicará na avaliação do tal professor; aí, imagino, qualquer resultado abaixo de dez significará que ou o colega avaliador lhe está a mesmo a dar música e ficar ele com uma nota melhor ou que, no mínimo, o gajo não percebeu a ponta dum dito do que é a matemática quântica.
Se eu celebro os meus sete valores com batatas fritas e bifes, já os professores em situação semelhante talvez sejam obrigados a ficar-se pelos ovos, não a cavalo como eles tão bem sabem, mas crus e peganhentos. As inúmeras sessões de treinos que, por esse país fora, a garotada está a realizar no arremesso desses produtos oriundos dos cus das galinhas não são um bom prenúncio.
Confesso que sinto pena dos desgraçados dos professores que são obrigados a aturar as hordas de bárbaros imberbes que as televisões nos mostram; arrepia-me vê-los aos saltinhos e a gritar palavras de ordem como “os putos unidos nunca mais serão não-sei-o-quê”. Não tarda, vou vê-los a desfilar de boina e com uma t-shirt do Che e, aos berros, a entoar aquela da gaivota que voava, voava, voava e que – filha da mãe! – não se cansava. Agora vão desculpar-me mas vou deixar-vos. A ministra da educação está fora, as escolas estão fechadas e as ruas, a esta hora da matina, estão livres de cromos, o sol brilha, o dia está um espectáculo e eu vou aproveitar para pôr um pouco de bronzeado na tromba; vou pegar na Maria – não literalmente porque as cruzes já não me deixam fazer de burro de carga – e vou dar uma volta pela marginal e apreciar o mar (é claro, se o messias Barraca Hussein Abana não tivesse ganho, todas estas coisas boas não seriam possíveis, não senhor, hoje trovejaria e choveria a potes. Ámen! …

Monday, November 10, 2008

Interpretações




Se pudesse viajar até ao passado e escolher uma outra maneira de ganhar o caroço, sabendo o que sei hoje, escolheria a profissão de jornalista. Por achar que, no que estes profissionais fazem – ver, ouvir, escrever, relatar – está aquela que eu considero a mais importante de todas as liberdades: a liberdade de expressão. Toda a gente deve ser livre de pensar e de dizer o que lhe apetece; duma maneira ou de outra, é-se influenciado, por mais ou menos tempo, por aquilo que se vê, por aquilo que se lê e por aquilo que se ouve. Somos moldados por muitas coisas e muitas dessas coisas são-nos dadas por jornalistas. A profissão ideal para um gajo como eu, um gajo que gosta de aldrabar os outros.

Se eu fosse jornalista, daqueles com muita saída, a trabalhar para uma grande estação de televisão ou para um grande jornal, a minha liberdade de expressão daria para, por exemplo, eu informar e convencer o mundo, com ar grave e solene, de que o meu porto tinha dado uma abada de todo o tamanho nos leões e que só não tinha ganho por uma diferença de catorze ou quinze golos por ter tido um azar do caraças. Quem tivesse visto o jogo saberia que eu, além de ceguinho e aldrabão, era parvo todos os dias; quem o não tivesse visto e não escutasse ou não lesse o que outros jornalistas escrevessem sobre o tema, engolia a minha treta e o resto seriam cantigas…

Esta capacidade dos jornalistas em moldar as opiniões tem, repetidamente, dado para o torto! Quando eles não os têm no sítio e se entregam nas mãos de gente desmiolada percebe-se até aonde pode ir esse poder. De jornalismo passa a propaganda.
Uma mentira repetida vezes sem conta transforma-se em verdade para a maioria das cabeças expostas ao tratamento. Exemplos? O Benfica é o melhor do mundo! Sim, pois…e eu sou mais cabeludo que a Maria Alice! Outro exemplo: a liberdade na antiga União Soviética! Durante décadas, a imprensa local convenceu milhões de pessoas de que viviam no paraíso e de que o inferno estava ali ao lado, no ocidente decadente e capitalista. Os povos dos estados oprimidos pela foice e pelo martelo só souberam que a “verdade” que lhes vendiam era uma treta quando puderam ser eles próprios a julgar ou quando puderam comparar e ver, ler ou ouvir outras interpretações da “verdade”.
Se os jornalistas locais podiam justificar a sua falta de vergonha na propagação de mentiras com o medo que tinham em levar na tromba, já os jornalistas estrangeiros, os que viviam em liberdade, tinham mais dificuldade em explicar porque carga de água é que vendiam a sua honra, mentindo em nome de regimes mais perigosos do que a claque dos super dragões. Se este exemplo já é do passado, a coisa continua para milhões de pessoas por esse mundo fora, na Coreia do Norte, na China, em Cuba, etc.

Pior do que a minha aldrabice na afirmação de que o meu porto deu uma trepa e uma lição de bem jogar no último jogo contra os leões, é a “verdade” que o partido do politicamente correcto, anda a impingir, com a preciosa ajuda dos “seus” jornalistas, sobre a crise do subprime, as suas causas, os seus responsáveis.

A seu tempo, tal como aconteceu em relação às verdades comunistas e ao homem novo que aí vinha, também sobre as explicações desta crise internacional os jornalistas vão ter que engolir sapos atrás de sapos. Escreverem ou dizerem, sem se rirem, que a culpa é dos tipos que querem menos estado – portanto menos impostos, menos desperdícios com subsídios a quem não precisa, menos compadrio – e mais liberdade individual, é duma lata de todo o tamanho.

Quando também este muro cair, no bando dos verdadeiros culpados estarão: o antigo presidente americano Carter e a sua legislação de 1977 (o Community Re-investment Act, no original) que “sugeria” aos bancos privados a atribuição de empréstimos a quem não tinha capacidades para os reembolsar; o senhor Clinton com e o reforço daquela legislação, forçando (já não apenas sugerindo…) os bancos privados a financiar toda a espécie de gente para a compra de casa, com a hipoteca da dita, mas com a garantia última do estado americano; por último, dezenas de deputados – democratas (na sua maioria) e republicanos – que, ao longo de décadas, e apesar da vasta regulação existente e dos múltiplos avisos, não souberam ou não quiseram tirar as palas dos olhos.
Até lá, até à queda deste muro, como aconteceu até à queda do de Berlim, eu e outros como eu que destoam do actual celestial consenso (felizmente somos uma minoria…segundo se diz) vamos ter que aguentar e levar tautau no tutu por causa destes pensamentos maldosos.

Tuesday, November 04, 2008

Preces




Quando o safado e bem anafado ouriço se soltou do castanheiro e aterrou em cheio na minha pinha, fui o único que não teve vontade nenhuma de rir. Naturalmente que o meu primeiro gesto foi coçar com ternura a careca ferida, mandar as castanhas para os carvalhos e ir, a seguir, de trombas, alapar-me à lareira em vez de continuar ali, no quintal assassino, a dar cabo da espinhela na apanha das oito toneladas de castanhas que os meus pais fizeram o favor de deixar caídas no chão para me escravizarem.
Dá-lhes gozo…o que é que eu hei-de fazer!

Sai um gajo da cidade, farto daquela confusão de gente que a crise empurra para os centros comerciais e da correria que é procurar uma caixa de Multibanco que ainda não tenha sido assaltada, com intenções de passar um fim-de-semana sossegado e agradável na província e acaba a ser gozado por aquela malta do campo.

Depois queixam-se e dizem que as aldeias estão a ficar sem gente, admiram-se que a malta troque o campo pela cidade.
Pudera! Na cidade, quando quero castanhas não sou eu que as vou apanhar não! Isso é que era bom! Aliás, na cidade, a malta está tão avançada que a castanha já nem vem com o ouriço; pode vir com bicho, mas com picos, isso é que não! Castanha em árvores, embrulhada em ouriços, é mesmo coisa do século passado, coisa do campo! Às tantas ainda pensam que Magalhães é nome de gente!

Portanto, lá estava eu, a tola mais picada do que carne para esparguete à bolonhesa, a mola toda dobrada e aqueles dois marretas ali ao alto, na galhofa, a gozar o panorama.
Como sou católico, especialmente quando está a trovejar mesmo em cima de mim, rezei para que, também eles, fossem presenteados com, pelo menos, uma dúzia de ouriços cada um.
Contudo as minhas preces não surtiram efeito; segundo informações recebidas do além, há congestionamento grave nas linhas que levam as orações dos tubarões que, como eu, só se lembram que são católicos quando se aleijam e os pedidos estão a ser entregues ao destinatário com muito atraso.

Um santinho, que falou comigo na condição de eu manter o seu nome no anonimato, disse-me que, por causa da avalanche dos pedidos, as cunhas eram tantas, vindas de todo o mundo e de gente tão importante que parecia o nosso país; confidenciou-me alguns dos nomes, o que é que eles suplicavam, as cunhas que metiam, nomes que, bem, a vocês nem vos passa pela cabeça! A nata da nata das sociedades, ou como dizem os venezuelanos “la créme de la créme, carago”. E a procissão ainda vai no adro!

Eu, se já não fosse uma besta, acreditem nisto, tinha-me tornado numa! Logo ali! Em maior numero do que políticos no poder – que eram bastantes – estavam os banqueiros, de todas as cores e de todos os feitios. No meio de toda aquela gente importante a pedir coisas muito sérias, havia um anónimo caramelo a rezar pela repetição dos dois últimos jogos realizados pelos dragões (eu disse ao santinho para, à socapa, apagar esse da lista, ainda nos arriscamos a levar mais na repetição se o pedido for aprovado).
Que me lembre, este meu pedido anónimo era o único pedido totalmente egoísta. Os outros não, os outros só queriam a paz na terra e o bem geral.
Embasbacado com a quantidade e qualidade da lista dos banqueiros pedintes, perguntei-lhe o que é que o Espírito Santo achava daquilo mas fiquei sem moedas para prosseguir a conversa e o santinho foi-se. Quanto a mim, continuo picado e cheio de dores nas costas!

Penduras




Convoquei uma reunião de emergência da minha malta, uma espécie de assembleia-geral extraordinária dos moradores lá de casa, para lidar com a nova realidade politica e económica da comunidade em que estamos integrados.
Por causa da urgência da coisa, em vez das habituais cartas registadas com aviso de recepção, convoquei a malta com três valentes berros. O cão dos meus filhos, que me tem mais respeito do que eles, foi o primeiro a comparecer e, sentados, esperámos pelos outros que, diga-se em abono da verdade, quando chegaram não pareciam, ainda, nada despertos.
Meu povo – comecei eu depois de confirmadas as identidades de todos os presentes – sabem por que é que convoquei esta assembleia-geral extraordinária?
Não, ninguém sabia! Passados dez minutos fui forçado a concluir que nenhum deles fazia a mais pequena ideia do que estava ali a fazer. Pelas faces misericordiosamente raivosas, supunham que eu, para os ter acordado, aos berros e às seis da manhã, tivesse pifado de vez mas, quanto ao resto, mais nada.
Entretanto, imitando o nosso ministro das finanças na segunda apresentação do orçamento geral do estado, eu distribuíra pela mesa e para uso dos estremunhados presentes, meia dúzia de rebuçados de mentol, quatro fatias frias de pão torrado, dois pasteis de nata e, para mim, um sumo de laranja natural, três croissants carregadinhos de manteiga e uma caneca de chá preto e quente com uma pitada de leite frio.
Nada desencorajado, continuei: “Se vocês andassem atentos ao que se passa lá fora, teriam percebido que, como eu já desconfiava, desde há dias que foi oficializada a união socialista da Europa e que, do outro lado do atlântico, foram criados os estados socialistas da América do norte. A meu ver, a coisa teve que ser oficializada porque, com o tremendo sucesso do projecto democrata americano de atribuição de empréstimos para compra de casa – baratos e à fartazana – a quem os não podia comportar, tornou-se impossível tapar os buracos que esta, imposta mas disfarçada, redistribuição da riqueza acabaria por provocar nos grandes bancos mundiais, bancos geridos por seres humanos espertos, atentos, activos, venerandos e salvos por árbitros comprados.”
Para dar tempo a que as minhas palavras fossem bem digeridas, bebi um gole de chá e dei mais uma trinca no croissant; passeei o olhar pela mesa para ver o efeito inicial. O mais atento era o cão, não sei se pela partilha das preocupações se por cobiça à minha comida; os restantes mantinham-se irritantemente apáticos, com excepção da Maria que, de cabeça baixa e olhos fechados, parecia meditar na gravidade da situação que eu ali expunha.
Esmorecido pela reacção da plateia, fui directo aos finalmente: “Bem, isto quer dizer que os juros mensais do empréstimo que contraí para construir aquela bela ponte que liga o meu quarto à adega vão ser muito superiores ao esperado e mais do que todas as minhas receitas. Por isso, como tu, meu filho mais velho, já começaste a trabalhar, é-te imposto entregar-me uma parte do teu salário para eu ter algum para dar ao teu irmão mais novo, para ele gastar no tabaco, nas bejecas e em tudo o mais que precisar.”
O desgraçado do cão foi o segundo a ganir antes de eu poder concluir; o primeiro foi o meu puto mais velho cujo salto, desesperado e brusco, provocou a dor ao animal; o meu mais novo, finalmente com ar de quem tem qualquer coisa parecida com um cérebro naquela coisa que lhe fica por cima dos ombros, perguntou-me: e isso é a somar à mesada que tu já me dás?
A minha esmerada educação e a censura do director deste jornal impedem-me de transcrever o resto da reunião.

Santos Populares



(Magnífico trabalho do artista NATHAN SAWAYA a ver aqui)

Ainda a propósito da rebaldaria que tem sido, desde há décadas, a gestão das casas, lojas e outros espaços que pertencem à Câmara Municipal de Lisboa, foi publicada uma lista dos felizardos, uma lista que tem quarenta páginas. Ao mesmo tempo, gente lá da câmara, gente distraída mas, ainda assim, gente importante, foi comentando o assunto:
José, um dos irmãos Sá Fernandes – o conhecido duo maravilha do bloco justiceiro, mistura do Zorro da Mouraria com o Robin de Alcântara – ficou de boca escancarada por causa do valor das rendas cobradas pela autarquia onde, supõe-se, é vereador do ambiente e de mais umas coisitas (a notícia não esclarece sobre a causa do espanto: se ele se deve aos baixos valores das ditas ou ao facto da tramóia ter sido desvendada);
Ruben de Carvalho, o comunista, outro veterano da autarquia e também ele membro do chiquíssimo clube dos vereadores distraídos, concluiu – brilhantemente – que a autarquia não anda a fazer uma boa gestão do seu património;
Carmona Rodrigues, o independente, lamenta que a câmara tenha sido um mau senhorio durante tantos anos e Fernando Negrão, membro recente, sim, sabia que havia umas rendas baixas mas assim, tão minúsculas, ah não, isso não, nunca tal lhe passou pela cabeça.
Até agora, hora do fecho desta edição, desconheço comentários de Jorge Sampaio, João Soares e Santana Lopes, antigos dirigentes desta agremiação da cunha.

Caso, por inveja e dor de cotovelo, estejam a pensar em aderir a este distinto clube e fazer companhia a este notável ramalhete de servidores da causa, convém que não se esqueçam de que a coisa não é fácil, que a lista de espera está à cunha e que há uma prova importante a cumprir, ignorar conhecimentos, conhecimentos difíceis de esquecer mas cuja ocultação é fundamental. Por exemplo, entre muitos outros exemplos, os candidatos têm de saber esquecer que:
a) Fernando Ka, ex-deputado do partido socialista e activista dos direitos dos imigrantes, paga a enormidade de cinco euros e sessenta cêntimos por mês por uma casita social, uma barraquita com cinco assoalhadas e quintal, localizada perto da praça de Espanha;
b) Dina Aguiar esturra vinte e seis euros mais trinta e cinco cêntimos no atelier no palácio dos Coruchéus;
c) A Associação dos Arquitectos Portugueses paga, por uma fracção num palacete, desde 1990, uma renda de…zero euros;
d) O Restaurante Gôndola – restaurante de comida italiana com oitenta lugares no interior e oitenta na esplanada, com preços por refeição a variar entre os vinte e os trinta euros por pessoa – paga cento e noventa e nove euros mensais;
e) O PS, PSD e CDS-PP pagam rendas mensais de setenta e cinco euros, quarenta e seis euros, trinta euros e trinta cêntimos respectivamente. Em 2005, o PCP pagou quatro euros e cinquenta e cinco cêntimos por um espaço na Ajuda.
(Ainda à espera de esclarecimentos, a indicação de que o colégio de São João de Brito – um dos mais caros colégios privados e cujo lema é “Divulgar a Fé promovendo a Justiça” – paga uma renda de cinquenta cêntimos).

Pela (insignificante) amostra já devem ter topado a trabalheira que dá um tipo armar aos cucos e querer fazer parte de clubes selectos; deixem-se de coisas, façam como eu, esqueçam essas ideias chanfradas e dediquem-se à pesca. Deixem as coisas difíceis para quem sabe!

Pândegos

(Harold Escalona/EPA)

Aí está ele de novo: Hugo Chavez, turista acidental, amigo de peito dos camaradas Soares e mi amigo José, em mais uma visita de negócios! Como ele tem muito petróleo e muita lata (refiro-me a paleio e não ao material das casas onde vivem milhares dos seus desgraçados apoiantes) este é o género de crápula com quem os nossos mandantes não se importam de ser vistos em público, sem embaraços de maior.

Há quem me jure que esta amizade, este apoio e atestado de credibilidade internacional, é só fachada, uma farsa montada pelos camaradas e comparsas para proteger os milhares de emigrantes portugueses que lá estão a fazer pela vida e que, sem a peça de teatro montada, ficariam expostos a terríveis consequências.

É, eu acredito que sim, até porque é essa mesma politica que os camaradas aplicam a outros países que também têm petróleo e milhares de emigrantes nossos, também eles subjugados por regimes opressivos, internacionalmente isolados, evitando insinuar uma leve critica ou um insulto que exponham os nossos compatriotas a umas valentes nalgadas. É o caso dos USA, onde a presença de milhares de emigrantes, impedem os nossos camaradas (os governantes e os amigos) de falar grosso e do alto da burra!

O Huguinho – diz ele – veio para vender petróleo a pataco e comprar bacalhau, azeite, casas e um milhão de “Magalhães”, aparelho de computação que o órgão de propaganda oficial do governo – a RTP1 – insiste em classificar como um produto genuinamente português, o primeiro portátil inteiramente português. Alertado por escritos de Pacheco Pereira, pesquisei na Internet e fui ver o telejornal das 13 horas da terça-feira da semana passada, dia 23 e fiquei com a certeza de que não foi o excesso de esparregado de nabiças do Tourigo que me pôs enjoado.
Com tão descarada propaganda, tanta insistência numa evidente mentira, parece-me que já não é a mim nem a vocês que o canal estatal quer convencer mas que são eles – os jornalistas – que precisam de ser convencidos, obrigados a acreditar na verdade oficial que lhes é distribuída por quem manda, por quem comanda e por quem puxa os cordelinhos daquela tasca.

Ou então, simplesmente, limitam-se a achar que o povo português é tão burro que já nem a aparência é preciso manter e, que se dane, afinal de contas a maior parte da malta está-se nas tintas e dependente do mesmo patrão, desde que, no fim de cada mês, o taco venha, o resto é paisagem.
Imagino-me sentado na cadeira do apresentador, minutos antes do programa ir para o ar, a passar uma vista de olhos pelo material que vou ler, a perguntar ao chefe da direcção se o que está ali escrito é mesmo verdade, ele a encolher os ombros enquanto responde: faz de conta!

No sítio da Internet do “Magalhães” informa-se que cada aparelho custa 180 euros a produzir mas que será vendido a preços que vão dos zero aos cinquenta euros, consoante os rendimentos do agregado familiar que o adquirir. Atendendo a que a birra do engenheiro é distribuir meio milhão destes aparelhos, isto quer dizer que o custo, para os contribuintes, pode variar entre 65 e 90 milhões de euros por cada meio milhão desta coisa!
Fixe! Assim, até os cerca de três mil pobrezinhos – entre amigos, artistas, jornalistas, familiares e outros necessitados – a quem a câmara municipal de Lisboa atribuiu casas, moradias, palácios, lojas e apartamentos com uma renda média de EUR 35.48, podem ter condições para comprar um “Magalhães”. Fico tão contente e tão aliviado…

Tuesday, September 09, 2008

Tiques




Eu ando a fazer pela vidinha, pela minha vidinha, vocês andam a fazer pela vossa e, se não andam, deviam andar.
Nesta labuta pela minha vidinha, sempre a tentar mais e melhor para mim e para os meus, vou esticando a corda até aonde o meu grau de desenvolvimento me deixa ou até aonde me deixam ir o conjunto de leis que regem o nosso comportamento.

Sendo um tipo vagamente educado tenho consciência de que, passando certos limites nesta corrida por uma vidinha mais rica e mais próspera, o mais certo é pisar alguns calos e alguns traços contínuos, brincadeiras que me habilitam a ganhar uns quantos despistes, dos quais poderei sair com mais ou menos escoriações, ou a levar na corneta pela medida grande e apanhar um cartão vermelho mostrado pelos árbitros que representam o conjunto dos outros senhores que também labutam pelas suas vidinhas.
O conjunto dos árbitros que regulam este pandemónio todo e que nos representam a todos nós cidadãos, é o “estado”. É o estado que deve refrear o apetite individual da minha ganância, mas sem interferir no jogo, sem ajudar nenhum outro ganancioso em especial.

Esta sensação de que sou vagamente educado sugere-me que devo ser o único a pagar o preço dos meus prejuízos e que não devo andar a lamuriar-me aos outros pelos espetanços que me causei; verdade seja dita que, quanto maior é o prejuízo do meu espetanço tanto menor é o número dos interessados na minha lamúria. A acabar na maior parte dos árbitros que integram o estado!

Esta mesma sensação de ser vagamente educado força-me a partilhar o lucro dos meus êxitos, não apenas com quem eu muito bem escolho, mas com gente que nunca vi mais gorda ou que, simplesmente, nunca verei; verdade seja dita que, quanto maior for o meu êxito maior será o numero dos interessados no meu sucesso. A começar por todos os árbitros que integram o estado.

Por causa desta minha tresloucada maneira de pensar é que eu fico cheio de urticária quando me falam em socialismo e me tentam explicar porque é que os impostos são tão necessários à minha sobrevivência como a sarna ou a peneira da batata.
Hoje estou pior do que estragado, não por causa de nenhum árbitro cá do burgo mas por causa do Freddie e da Fannie, bimbos que a maior parte de vocês não conhecem mas, acreditem, que nos vão dar água pela barba.

O Freddie e a Fannie, ao contrário do que o nome sugere, não são gente de carne e osso; são um par de jarretas gigantes, são duas empresas americanas, dois mamarrachos inventados há quase cem anos e que detêm quase metade das casas compradas pelos americanos com o recurso à sua hipoteca.
Estes mastodontes empresariais, monopolistas em terra de gente supostamente adepta ferrenha da livre concorrência, foram crescendo à custa de muita protecção, muito compadrio e aldrabice e mantendo certos privilégios, como regras menos rigorosas na concessão dos empréstimos (era quase garantido que o “estado pagaria” se/quando algo corresse mal); agora, acumulados que estão biliões e biliões de dólares em prejuízos, foram nacionalizados porque, segundo a opinião politicamente correcta, são empresas tão grandes, tão grandes, que não se podem deixar falir. Ironia das ironias, não é?


É, lá isso é, mas ironias à parte, esta nacionalização, beneficia os infractores (aos ricos são garantidos os seus lucros, com o risco eliminado por parte do governo) e vai castigar os pobres dos contribuintes americanos que pagarão estes truques através dos impostos (aumentos) e de taxas de juro mais altas. É a via para o socialismo, um regime capitalista sem risco para quem pode e para quem manda!

Como a gente se constipa quando os americanos espirram, já estou todo arrepiado com tanto tique socialista nas terras do tio Sam e nas implicações que aquela decisão vai ter por cá. Vou já enfrascar-me em óleo de fígado de bacalhau!

Apre!



Estou tão furioso que até espumo, é tão grave que alguém já sugeriu que o melhor era eu dar um saltinho ao hospital mais próximo, de preferência bem amarrado a uma maca, fazer uns testes para ver se não estou infectado com a raiva e, se for caso disso, levar umas quantas vacinas.
Nada a ver com os falhanços dos toscos dos avançados tripeiros nem com o monumental frango que o seu nababo guarda-redes deu na primeira visita à capital e que nos impediu de dar (mais) uma sova aos lampiões; também não tem a ver com o (alegado) silêncio do partido dito da oposição o maior, nem por causa da festa anual dos comunas, que vai ocorrer por estes dias. Nenhum dos três assuntos mencionados me aquece nem arrefece, para mim é rigorosamente igual ao pífaro. Já vos conto o que me transtornou!
Depois de uns dias de férias cá pelo burgo, como já tive ocasião de dizer, fui passar uns dias a Espanha, aproveitar os preços mais em conta e águas marítimas mais quentes.
Na minha pasta, que vai comigo para todo e lado e que é, graças às novas tecnologias, uma espécie de escritório ambulante, levei o meu portátil, a minha agenda, sais de frutos, cartões de visita, o carregador do telefone, um isqueiro e a menina da placa de acesso à Internet móvel da TMN, brinquedo que me permite estar em contacto com o mundo inteiro em qualquer local e que usei regularmente enquanto não atravessei essa linha imaginária que nos separa da Espanha.
Chegado ao país vizinho, não mais importunei a dita menina da placa, mantive-a quieta e bem sossegadinha, bem enfiada no escuro e no fresco do cabedal.
Por razões imperativas e por volta da uma da manhã, hora local, necessitei de transferir dinheiro para um dos meus filhos; despertei a menina da placa do seu sono de princesa e, em três minutos e meio, estava despachado! Durante os dez dias em que andei mergulhado nas águas do mediterrâneo, só mais uma vez fui forçado a recorrer à menina, desta segunda vez, entrada e saída completadas em oito minutos e picos.
Ontem recebi a factura daqueles onze minutos de prazer (curiosamente correspondentes a 69 centenas de KB de dados descarregados): EUR 47,20 ou, em moeda antiga, nove contos e quatrocentos pacotes! Parafraseando o anúncio dos CTT: fonix!
Podia ter sofrido uma apoplexia ou um ataque qualquer que me tivesse fulminado em dois tempos; já não basta o mês de Setembro ser um dos meses em que mais me vão ao bolso – forçam-me a fazer o segundo empréstimo do ano ao estado central sem me pagaram qualquer juro pelos adiantamentos, cobram-me a segunda prestação do imposto sobre os imóveis e, a cereja em cima do bolo, obrigam-me a pagar o IRS – vêm também estes salafrários da TMN depenar-me ainda mais.
Não gostei, zanguei-me, telefonei-lhes, ah…pois claro, compreendemos muito bem o seu problema mas…está na tabela, não podemos fazer nada, blá, blá, blá!
Perguntarão: quem é, ou quem foi burro? Respondo: eu, eu, eu, só eu e mais ninguém!
Aos apalpões do estado eu não posso fugir, pago e não bufo e, ano após ano, tenho que gramar a pastilha; a coisa muda de figura no caso dos beliscões da TMN, felizmente neste caso há outros a prestarem o mesmo serviço, de maneira que escrevi-lhes uma carta de despedida, sem lágrimas derramadas, mudei-me para a Vodafone, o meu contrato e mais três contratos da família e hei-de continuar a tentar levar mais uns quantos.
Ah, eu sei, eu sei que os gatunos da TMN se estão nas tintas para mim, sei que a Vodafone – como os outros – também devem fazer coisas destas mas se a gente não faz nada quando pode, mais tramados seremos no futuro.

Investigando

(foto daqui )

(Nota da Maria: aquilo sim era uma obra de arte, deviam ter visto!!!! Batia esta verdadeira obra da artista Tracy Emin em qualquer exposição de arte contemporânea. Sim, sim, não acreditam? Esta é uma fotografia de uma obra de arte chamada "My Bed" apresentada, em 1999, pela dita artista na prestigiada Galeria Tate de Londres, tendo sido uma das obras nomeadas nesse ano para o Prémio Turner. O nosso menino ganhava de certeza com a sua "obra de arte")

Os especialistas da meteorologia mundial e europeia andam nitidamente a apanhar bonés. Ainda a primavera mal tinha começado e já nos anunciavam um verão quente, dos mais quentes dos últimos anos, um verão que ia fazer suar as estopinhas ao mais refinado dos friorentos, música para os meus ouvidos e para os do avô paterno dos filhos da Maria.
Filhos esse que, armados em carapaus de corrida, à medida que foram crescendo em tamanho e em número de anos, foram também criando alergias à companhia dos que, com tanto amor e carinho, se fartaram de sujar as manápulas na limpeza dos seus rabiosques enquanto bebés. Eu, por acaso, nunca sujei as minhas! Sempre que fazia esse sacrifício, borrifava a minha tromba com o frasco de perfume que estivesse mais à mão, tapava o nariz com a mão direita, enfiava a esquerda num rolo de papel higiénico e depois gritava pela mãe da criança, para que ela viesse segurar e levantar as duas patas do bicho enquanto eu, de costas, tentava acertar naquilo que era suposto limpar. Ainda hoje desconheço porque é que, ao fim de dois sacrifícios, eu que até gostava daquilo, nunca mais fui requisitado para o serviço.
Esta alergia tem as suas vantagens nas férias mas tem, também, as suas desvantagens.
Do lado positivo, as viagens ficam mais baratas, somos menos elementos e viajamos com muito menos bagagem – excepto, claro, quando passamos mais do que uma noite fora, situação que a Maria aproveita para arejar toda a sua roupa, duas toneladas e meia de panos que ocupam sete dos três armários lá de casa, mais os quase cento e trinta e seis pares de chinelas, sandálias e sapatos, metade dos quais parecem, pelo menos a mim e à vista desarmada, iguaizinhos uns aos outros.
Do lado negativo, deixamos a habitação entregue aos bichos, o que transforma o regresso numa espécie de filme sobre a caça a assassínios em série, descobre-se a primeira vitima, reduzem-se os suspeitos a dois mas, depois, há todo um trabalho de investigação forense a fazer para descobrir quantos mais crimes foram cometidos, a sua real gravidade e aonde estão enterradas todas as vitimas. Sendo conhecido o hábito que os bichos têm para, quando sozinhos, se juntarem em alcateias violentas, sedentas e famintas, nem sempre é fácil arranjar um sólido conjunto de provas que incriminem os nossos dois suspeitos principais e todos os seus cúmplices.
Com o passar dos anos tornou-se mais fácil detectar os crimes; não é o desenvolvimento das nossas capacidades de investigação que contribui para esse êxito mas sim o desleixo dos criminosos, que passaram a estar-se nas tintas para os indícios que – agora – deixam à vista do mais ceguinho dos detectives; recentemente, demos de caras com os restos mortais de cento e vinte e três garrafas de cerveja, sobranceiramente largadas num caixote do lixo sem tampa. À laia de suborno, os mafiosos lá deixaram meia dúzia delas, cheias, no frigorífico.
Há duas semanas porém, chegados de um fim-de-semana passado no Tourigo, essa bela e cosmopolita cidade beirã, detectámos um novo tipo de crime, sem qualquer dúvida fruto duma mente desequilibrada, temos as pistas, temos os suspeitos do costume, achamos que sabemos o móbil mas faltam-nos as provas.
Movida por um pressentimento ou, sabe-se lá, se abençoada por um simples golpe da sorte, a Maria fez uma coisa que já não fazia há anos, foi trocar os lençóis da cama de um dos bichos; o seu rosto, quando me mostrou os lençóis trocados, espelhava o terror provocado pela descoberta de duas toalhas de mesa, de cetim verde a que fazia de lençol de baixo e, a que fazia de lençol de cima, uma toalha de linho, bordada à mão há quase oitenta anos, a Ferrari das nossas toalhas de mesa!
O principal suspeito mantém o seu depoimento inicial: não fez aquilo com más intenções, foi sem querer, se calhar foi por causa do sono que tinha quando fez a cama. Nós, a acusação, não acreditamos, prosseguiremos com as investigações e só as daremos por terminadas quando descobrirmos o que é que o estafermo esteve a comer na cama.

Molengas



São quatro da tarde, hoje é feriado, o céu está limpo e um espectáculo com aquela cor à Porto, o sol brilha e o dia está quente, o vento está a ver se consegue arrancar-me os poucos cabelos que ainda resistem na carola e eu estou com uma moleza que, até a mim que estou habituado a ela, me assusta e incomoda.
Estou sentado à mesa, no terraço que fica na parte detrás da minha casa e, como companhia, tenho o computador e o cão dos meus filhos, um tresloucado com cinco meses de idade que, à semelhança do tratamento que os nossos governantes vêm dando ao défice do estado na ultima década e meia, faz buracos por tudo quanto é espaço verde, território que, em tempos, eu dizia que era um jardim, o meu jardim.
Hoje parece-se mais com uma daquelas fotografias da lua, local desprovido de vegetação mas repleto de crateras; ao contrário do planeta que gira em torno da terra, o meu quintal tem muita gravidade, coisa que descobri à minha custa quando, em acrobacias espaciais, me atirei, em voo, do cimo duma escada para o chão, tendo aterrado com as trombas no chão sem ter sentido a leveza lunar que era suposto sentir, de leve só mesmo as mazelas no orgulho e o arranhão no joelho.
De vez em quando o animal levanta a cabeça, arrebita uma das orelhas e olha para mim com ar de intelectual da esquerda caviar como que a dizer "olhem-me este, querem ver que com este calor me vai obrigar a cumprir algum objectivo realmente importante para os humanos ou a correr outra vez atrás daquela maldita estúpida bola amarela?".
Em cima da mesa, duas minis de cerveja vazias agitam-se na esperança de que eu vá buscar mais uma e cumpra o ditado de que não há duas sem três.
Hesito entre chatear o canídeo ou fazer a vontade às pequenas; para não ferir susceptibilidades não faço uma coisa nem outra, qualquer uma delas implicava ter que alçar a pandeireta da cadeira e carregar com o esqueleto durante breves instantes, estou muito bem assim e, além disso, tenho que acabar este texto antes de me poder dar ao luxo de me deitar num sofá e sonhar com a morte da bezerra ou com as medalhas que os nossos atletas ganharão nos jogos olímpicos de Pequim.
Ouvi dizer que a rapaziada foi com muito boas perspectivas e, embora a mim tanto se me faça como se me deu, estou certo que devem vir de lá com feitos valorosos que da lei da morte se vão libertar, cumprindo a profecia daquele poeta que só tinha um olho mas que nadava tão bem só com um braço como eu com os dois, até conseguiu salvar, das revoltadas águas do mar, um dos livros que mais dores de cabeça me deu quando andava a estudar português, os sujeitos, os predicados e os complementos directos furibundos uns com os outros e, por isso muito distantes para não andarem à trolha, tornando quase tão difícil descobrir e classificar correctamente as orações como pôr a nossa economia a crescer tanto como os bolos feitos com fermento de padeiro.
Misérias à parte, até este momento o grande herói destes jogos é um tubarão americano que nada quase tão bem como o nosso Camões tendo, para já, arrebanhado uma mão cheia de medalhas, numa ânsia açambarcadora só equiparável à de certos gestores públicos da nossa praça na acumulação de tachos. Só de ver fico cansado!
Por falar em cansaço, a moleza piorou, vocês vão-me desculpar mas tenho as pálpebras tão pesadas que vou precisar de fechar as persianas por alguns minutos. Não saiam daí que eu venho já.

Thursday, August 28, 2008

Defeitos

(foto daqui)

Todos os sábados, a minha Maria, por uma qualquer obscura razão que eu ainda não entendi, não contente por me despejar da cama de madrugada para ir comprar pão fresco para o seu pequeno-almoço, obriga-me também a comprar-lhe um dos dois semanários do nosso querido regime, o Expresso ou o Sol. Se ela usasse todo aquele papel para distinguir as coisas que mete no frigorifico ou na arca congeladora – o queijo, o fiambre, a marmelada, os ovos, as azeitonas, os rissóis e os pasteis de bacalhau crús, as costeletas de borrego, os cubos de gelo, etc. – talvez eu percebesse a razão de ser deste ritual, mas como tudo o que tiro daqueles dois aparelhos está enfiado em sacos de plástico transparentes ou embrulhado numa película adesiva, confesso que continuo a estranhar este desperdício de dinheiro. Devo porém dizer que, quando ela opta pelo semanário Sol, ainda tiro algum proveito, no meio daquela tonelada de papel vem um livrinho com vários jogos de Sudoku e problemas de palavras cruzadas, coisas que me entretêm durante alguns serões. Quanto ao mais…mistério!
De vez em quando, à laia de gozo, põe-se a ler em voz alta algumas das pérolas que eles imprimem e, foi assim que fiquei a saber, através do relato do colunista Marcelo Rebelo de Sousa, que o Messias, o senhor Hussein Obama, andou, enquanto estive de férias, em tournée pela Europa, com o esperado e o desejado sucesso, actuando sempre para grandes, cultas, embevecidas e embasbacadas audiências. Segundo o comentador, à parte uma ou outra gaffe do profeta maravilha, não se percebe porque carga de água é que os americanos não desistem das eleições de Novembro e não o nomeiam já como seu presidente, sendo certo que, na opinião do professor, a falta de cultura daquele povo talvez explique a razão para a persistência no acto eleitoral.
Aquilo ofendeu-me! E magoou-me! É que se eu votasse naquelas eleições, não votaria no salvador do mundo, pelas mesmíssimas razoes porque nunca votaria no tele-evangelista frei Louçã, são os dois muito socialistas, demasiado esquerdistoides para o meu gosto.
Que os meus amigos, aqueles que me conhecem bem, me chamem burro, estúpido, cabeça de alho chocho, energúmeno, estrambulhado da mona e outros predicados que não posso revelar publicamente, vá que não vá; agora, vir um marmanjo, que só conheço de o ver a pedinchar para votos e de mandar uns bitaites na televisão, insinuar que sou uma besta de um inculto por não fazer parte da carneirada dos que se babam com o Messias, isso entristece-me (nota para o senhor director: se entender que chamar marmanjo a tão ilustre figura nacional pode prejudicar a minha já frágil carreira como cronista neste jornal, agradeço que troque o termo por outro mais suave como troca tintas, alcoviteiro ou intriguista).
Ninguém, no seu perfeito juízo, gosta que gozem com os seus defeitos e eu pergunto: que culpa tenho eu que um dos muitos defeitos de fabrico com que vim ao mundo, seja o de ser incapaz de reconhecer as virtudes do socialismo e do seu estado todo-poderoso (outra nota para o senhor director: quanto aos meus defeitos de fabrico, vamos ter que conversar um dia destes...) Se já é duro ter que viver com este complexo, imaginem o que eu não sofro sempre que malta deste calibre me humilha por causa desta minha falta de apreço pelos bons da fita!
ii Felizmente que o ministro SS (Santos Silva), o ministro socialista da propaganda, que manda nas televisões publicas, conseguiu assegurar e gastar uns largos milhões do nosso taco para cumprir um serviço publico fundamental para a minha sobrevivência (e para a sobrevivência de qualquer povo subjugado por quem manda), garantindo as transmissões em sinal aberto de jogos de futebol no canal um, coisa que, é mais do que sabido, as privadas nunca fizeram, nem nunca pensaram em fazer por não poderem recorrer ao bago do contribuinte; assim, com montes de jogos à borla, sempre me distraio e não passo tanto tempo, obcecado, a pensar nos meus defeitos, livro-me de depressões e poupo na despesa da farmácia.

Wednesday, August 13, 2008

Lata



E pronto, acabou-se o que era doce, as duas semaninhas de papo para o ar já lá vão, por acaso na ultima até nem consegui descansar, vim completamente estoirado, fui fisicamente abusado por águas mediterrânicas a vinte e oito graus de temperatura, forçado a banhos com duração interminável, enfim, estou pronto para descansar no escritório, alapado à secretária, a fazer de conta que estou a trabalhar, sempre atento às investidas do patrão, o gajo é malandro que se farta e aparece, sorrateiro, quando menos espero e, no meu estado actual, com o meu tempo de reacção igual ao de um caracol enfrascado com valiums, é despedimento pela certa.

Na primeira semana, para me lavar em água gelada, paguei cada litro de gasolina a um euro e cinquenta e três cêntimos por litro e, na segunda semana, logo depois de ter atravessado a linha imaginária que separa o nosso país da Espanha, à laia de comité de recepção, fui castigado com um desconto de trinta e um cêntimos por litro, cada litro de gasosa de 95 octanas vendido a um euro e vinte e dois cêntimos, cada maço de Marlboro normal trinta cêntimos mais barato, centenas de quilómetros em auto-estradas sem portagem, Iva mais baixo, etc. Trauma atrás de trauma!

Ainda bem que o conde D. Henrique conseguiu estoirar com o cinto de castidade da senhora D.ª Teresa de Leão, acto que, por não ter sido efectuado com as devidas precauções, acabou por gerar o nosso primeiro rei, jovem belicoso e mal criado que, ingrato, respondeu à estalada à senhora sua mãe, tendo o seu mau feitio levado à independência deste rectângulo à beira-mar despejado. Tivesse o conde falhado a pontaria naquela noite fatídica e, sabe-se lá, se não estaríamos nós agora obrigados aos mesmos traumas com que os desgraçados dos espanhóis têm de conviver.

Sem contar com o frete que deve ser ter as contas publicas equilibradas e uma economia que fugiu da nossa a sete pés, ter que andar a celebrar a vitória num campeonato da Europa em futebol, a celebrar vitórias nas maiores provas mundiais de ciclismo, do desporto automóvel, do ténis, eu sei lá mais o quê. Desconheço que defeito de fabrico é que os tipos têm, que raio de cromossoma é que lhes falta, que justifique a existência de tantas e tão grandes diferenças.

Há, pelo menos, uma coisa em que eles não nos batem; refiro-me – claro! – à lata! À lata meus senhores, à lata! Os espanhóis ganham-nos por KO técnico em tudo o que lá em cima escrevi, mas na lata, sim, na lata, aí, ainda têm que comer muito pão para cheirarem os nossos calcanhares!

Sim, é preciso muita lata, montes de lata, um descaramento do caraças, do governo e dos jornalistas para, através das televisões, das rádios e dos jornais, numa orgia publicitária, venderem como um “projecto português produzido em Portugal” ou como um “produto desenvolvido por empresas nacionais e pela Intel” ou ainda “o primeiro computador portátil com acesso à Internet montado em Portugal”, a assinatura, entre o nosso governo e a Intel, do contrato para a montagem, cá no burgo, de quinhentas mil unidades do Magalhães.

O Magalhães é, tão só, a versão actualizada (de resto já divulgada em Abril numa feira na China) dum computador portátil de baixo custo, lançado em 2006 pela Intel, com o nome de “Classmate” e destinado a clientes do terceiro mundo; o portátil da Intel, cujo nome varia em função do país com quem a Intel também tem contratos assinados (incluindo países da UE), pode ser muita coisa mas, além da fábrica onde vai ser montado e de um par de programas de software, tem tanto de português como eu devo ter de chinês.

Talvez que, algum dos cromossomas dos desgraçados dos nossos vizinhos espanhóis, venha sem os genes saloius bacôcus. Nós temos em excesso, podemos exportar à vontade mas, será que eles comprarão?

A investigar

( foto daqui)

Habitualmente não sou gajo para dizer mal dos outros só por dizer, acho isso indecente, não faças aos outros o que não gostarias que te fizessem a ti foi o que me ensinaram desde puto, sou, ou procuro ser, muito cuidadoso quando me abalanço e atiro as culpas de qualquer coisa para cima de alguém.
Neste caso sei muito bem de quem é a culpa e nem em sonhos vocês iam acreditar no que é que o socialista Sócrates conseguiu fazer à água do mar em Vilamoura!
Eu, que acredito em quase tudo – sei que os jogadores dos leões e dos lampiões são todos do planeta Kritponabos – só depois de constatar no local é que acreditei. Ainda bem que as minhas férias começaram neste fim-de-semana porque assim tive oportunidade de vir ver com os meus próprios ossos.

Os lideres dos G-8 a discutir a questão do lunático do Zimbabué, a fome no mundo, gente preocupada com os calotes do nosso estado e com o estado das calotes polares, muita gente distraída e o que é que o nosso primeiro faz? À socapa, gela as águas do mar e, à boa maneira socialista, as águas das praias do Sotavento algarvio já não podem ser diferentes das outras, já não podem ter águas mais quentes do que as águas de todas as outras praias do país.

Agora, graças a este governo de socialistas e à sua mania de nivelar tudo por baixo, tomar um banho no mar em Vila Praia de Ancora ou em Vilamoura é rigorosamente a mesma coisa, um gajo entra todo airoso e sai com os tintins mais mirrados do que a ervilha congelada, o material em estado comatoso, fora de serviço, nalguns casos tenho até sérias dúvidas que voltem a exercer qualquer função útil ao resto do corpo. Uma desgraça!

Ainda não percebi como é que ele conseguiu mais esta extraordinária reforma mas acho que tem a ver com uns fulanos que eu nunca tinha visto numa paria, a calcorrear a beira-mar de fato e gravata, os pés descalços e as calças arregaçadas até aos joelhos, a mergulhar na água uns enormes termómetros que carregam nuns sacos que trazem às costas com publicidade a uma firma qualquer que se chama ASAE, retiram-nos e fazem a leitura, sacam dum aparelho que parece um telefone especial, falam com alguém que deve estar lá bem no alto e, de repente, quem está no banho, sente um jacto de água gelada junto aos calcanhares, um arrepio na espinha e um aperto…aí mesmo.

Para todos os efeitos, como estou de férias, vou tirar isto a limpo, às tantas o homem até está inocente e eu para aqui a dizer mal dele, vou investigar a fundo este mistério, coisa que, calculo, levará para aí umas duas semanas, provavelmente estarei tão ocupado que nem terei tempo para escrever nada de inútil durante este trabalho de campo, não estranhem que o Jornal de Tondela não traga aquele pedaço de folha que normalmente usam para embrulhar as coisas que mandam para o lixo.

Vou ter que andar disfarçado, o mais discreto possível, comprei uns calções compridos de licra cor-de-rosa, que caem ligeiramente abaixo dos joelhos e uma camisa havaiana amarela, carregada com desenhos de latas de Coca-Cola e guitarras eléctricas, umas gigantes e outras não.
A Maria recusa-se a andar ao meu lado enquanto eu usar o disfarce. Acho bem, afinal isto pode tornar-se perigoso.

Cálculos

(foto daqui)

Uma operação de subtracção, aparentemente com um grau de dificuldade digna do mais recente exame de matemática do décimo segundo ano no condado de Portugal, diminuiu em quinze o número de desgraçados que, contrariados, viviam sob a asa protectora dum bando de malfeitores famosos – as FARC – fora do alcance dos efeitos negativos da perigosa globalização capitalista.

Os comunas por esse mundo fora, incluindo os cá do burgo, andam, com muita razão, com uma azia dos diabos, um bocado atrapalhados para aceitarem, como válido e correcto, o resultado da operação, nem mesmo pedindo-lhes que façam a prova dos nove, não senhor, isso é que era bom, o instrutor que levou a cabo a resolução da dita foi, é e será, uma grande besta, talvez que se ele fosse uma besta de esquerda ainda vá que não vá, agora uma besta de direita, isso não, nem pensar, ainda por cima já tinham decidido libertá-los, a sério, desta vez era mesmo a sério! Além do que, a nível caseiro, estes episódios poderão pôr em causa a habitual presença daquela colectividade de cariz humanitário na festa do Avante.

Eu julgava, com base na opinião mundial publicada, a que interessa, aquela que procura guiar-me para um resultado final adequado e apropriado nas contas que só a mim deviam dizer respeito, que a tal besta (de direita) que atemoriza e governa os colombianos, estava praticamente derrotada, isolada numa redoma reaccionária, cercado por países comandados por bravos, heróicos, inteligentes e democráticos lideres, pouco faltando para cair de podre e, afinal, como quando dou por mim a fazer o pino, está tudo de pernas para o ar, parece o desmascarar súbito de certos personagens no fim das telenovelas “filho da mãe, vejam lá, um tipo destes, parecia que não fazia mal a uma mosca e agora, zás, de repente, o gajo é que é o chefe dos maus”.

Depois há aquela sonsinha, a Ingrid, o único dígito feminino no grupo dos subtraídos, filmada há uns meses com aquele mau aspecto que obrigaria a fechar as portas da loja para evitar o roubo eminente e que aparece agora como uma turista chegada de férias prolongadas numa praia de gelo derretido no pólo, toda arrebitada a reclamar contra o mau serviço prestado pela cadeia hoteleira durante a estadia.

A mim não me engana ela, podem dizer-me que ela está muito bem fisicamente, blá, blá, blá, mas, para mim, mesmo não sendo médico, ela mentalmente está fundida, completamente xexé.

Só alguém com os parafusos desapertados, destrambelhada dos pirolitos e cerebralmente morto é que ousaria denegrir o camarada Che Guevara, permitindo-se fazer deduções estapafúrdias do género “…pensei em quem seriam todas aquelas pessoas ali presentes, depois, à medida que nos aproximámos vi que eram das FARC porque tinham vestidas t-shirts com a fotografia do Che…”.

Confessem lá, conhecem alguém, mentalmente são e a viver no planeta terra, que possa continuar à solta depois de mandar uma bojarda destas, ligar um mito sagrado como o camarada Che, alguém que serviu e serve de inspiração para tanta coisa e para tanta gente, ligar tal criatura a uma cambada de sequestradores, traficantes e assassinos?

O único diagnóstico possível é mesmo o de demência precoce e galopante; eu sei do que falo porque sofro exactamente do mesmo mal, amigos meus tentam vestir-me um sobretudo de madeira e mandar-me para Marte de cada vez que, também eu, digo mal do mesmo senhor, eu insisto e continuo a dizer o mesmo, mas baixinho, já só para mim, eles ficam todos contentes porque, se estou a falar sozinho, é porque estou mesmo doido varrido, então está tudo em ordem. O tratamento é uma combinação de colete-de-forças com choques eléctricos.
O resultado, um dia destes, certo ou errado, há-de vir.

Monday, June 30, 2008

Invejas

(foto daqui)

Grande baile de futebol espectáculo deram os nuestros hermanos à quadrada selecção alemã, uma faena com direito a ramalhete completo, música, orelhas, rabo e taça, na final do europeu de futebol, competição que, devido à minúscula dimensão e aos pindéricos recursos económicos dos organizadores, teve que ser repartido por dois países, pela Suiça e pela Áustria, grandes totós, uns pobretanas incapazes de se aguentarem à bronca com os desperdícios duma organização a solo como nós aguentamos desde há 4 anos.

Este método pindérico de repartir os custos com a organização de grandes eventos está na moda, constou-me que o próximo euro também vai ter esta saloiice, com a agravante das distâncias a percorrer pelas equipas que forem passando às fases seguintes serem ainda maiores, aumentando os custos com a deslocação das vedetas e das delegações, custos que serão pagos pelos bolsos dos eufóricos contribuintes candidatos a uma vitória na final.

Pensei que o método fosse original mas não é, ele é decalcado do modelo de governação da nossa Europa, mais concretamente do importante parlamento europeu, que funciona em duas salas, uma sala na capital belga e a outra, tipo anexo, a quatrocentos e poucos quilómetros de distância, em Estrasburgo, uma cidade francesa.

Uma vez por mês, os trezentos e setenta e tal euro deputados mais as suas respectivas e completas comitivas, arrumam a trouxa e zarpam do edifício de Bruxelas para o edifício de Estrasburgo, fazendo rigorosamente o mesmo trabalho nos dois locais, graças a uma birra dos franciús, na opinião de alguns conhecedores que acumulam malandrice e alcovitice.

A partir das 9:57 horas do dia 7 do próximo mês de Julho, dia da primeira viagem, estas alminhas vão deixar os anteriores meios de transporte e vão começar a fazer o trajecto – à segunda o da ida, à terça o da volta – num luxuoso comboio especial, umas quantas belas carruagens, cada uma destas viagens mensais a provocar um descarrilamento de cerca de duzentos mil euros nos impostos dos cidadãos, os tais que não têm conhecimentos suficientes para se pronunciarem sobre a constituição europeia o tratado de Lisboa mas cujos bolsos, quase tão vazios como as cabeças, estão ali a jeito, a pedir mãozinhas de mexer.

Para completa comodidade das senhoras e dos senhores passageiros, está anunciada uma carruagem com muitos bebes e variados snacks.

Você, miserável leitor destas linhas, se está a pensar ir, um dia, nem que seja só pela sensação e pelo gozo da coisa, botar o seu pezinho no brinquedo, pode tirar o cavalinho da chuva pois terá a mesma sorte que bom jogador na equipa do Benfica: não entra!

Fique aí quietinho, dê-se por muito feliz por não ser obrigado a ter aquela porcaria de vida, sempre às costas dos trouxas com as trouxas às costas! Você deve pensar que aquilo é um mar de rosas, não? Acha, não acha? Pois não é! Fique sabendo, seu…seu…seu…invejoso, fique sabendo que está redondamente enganado!

Segundo informações surripiadas aos meus vastos contactos nos meios da espionagem mundial, suas Senhorias e demais comitivas, sofrerão gravíssimos incómodos com esta luxuosa, mas imposta, mudança: terão que encurtar o fim-de-semana, retornar a Bruxelas ao domingo à noite em vez do salutar hábito de voltar na segunda de manhã, caso contrário arriscam-se a perder o pouca-terra-pouca-terra e – arrepiem-se! – com o horário da chegada a Estrasburgo, previsto para cerca da uma e meia da tarde, muitos poderão não ter tempo para um almoço a sério ou até para gozarem a habitual pausa, a que têm direito, nesse período!
Ainda lhe hão-de chamar o Guantanamo train!

Friday, June 27, 2008

Delírios

AO (Antes de Obama)

DO (Depois de Obama)




Depois duma boa refeição, especialmente depois dum bom jantar, neste caso dum muito bem regado bacalhau com grão, mais ou menos como a condessa do “ó Ambrósio, pá, quero algo!”, apetece-me, muitas vezes, uma dose ou duas de serviço público de televisão, é o tipo de digestivo que normalmente estimula a minha digestão e o soporífero ideal para tomar quando o álcool anda à solta por tudo quanto é veia e artéria deste meu corpo de adolescente, precocemente envelhecido.

Foi este vício, atiçado pelo Meio Queijo e pelo destino, que me deu o privilégio de assistir a parte do novo programa do vosso muito querido e excelentíssimo senhor doutor Mário Soares, um programa cor-de-rosa, em que ele, de converseta com uns quantos convidados, percorre o roteiro dos paraísos socialistas que ainda existem no mundo e descreve os perigos que os seus corajosos príncipes encantados têm que enfrentar para os governarem em paz e sossego, mas com muitas propriedades.
O grande democrata eleito para a primeira converseta foi o camarada Hugo – el presidente ou simplesmente usted como o vosso querido ex-governante o tratou – o príncipe encantado da Venezuela, aquele que fala pelos cotovelos, grande amigo do nosso primeiro, “mi casa es su casa” dizia-lhe o nosso Zé há meses, o pintas sul-americano lá foi vendendo o seu peixe perante o olhar nostalgicamente embevecido do seu fã e interlocutor.

Não sei porquê, talvez por causa do tinto, mantive-me insensível, sem me impressionar nem convencer, para mim aquele peixe está impróprio para consumo e fora de prazo mas enfim, gostos não se discutem, cada um tem todo o direito a promover o que muito bem lhe apetece, só é chato que o faça usando dinheiro que não é, nem dele nem da sua fundação.
Como é para vender ilusões e sonhos esquerdistas a malta encolhe os ombros, pronto está bem, deixem lá os homens usarem a massa de todos nós para fazerem propaganda à vontade, ainda por cima aproveita-se e dá-se mais umas quantas traulitadas no Bush, aquele grande burro que é o causador de todos os males que assolam o nosso mundo, desde a eliminação da nossa selecção até ao escaravelho da batata.

Com a badalada, desejada e mais que anunciada vitória em Novembro próximo do candidato Barraca Hussein Abana, estes vendedores de ilusões vão ficar de ressaca, como eu próprio ficaria se me tirassem a minha dose de serviço público de televisão – vade retro Satanás! Temo até pela saúde deles, especialmente a dos simpáticos e bonacheirões esquerdistas europeus, não sei mesmo se aguentarão tantas e tão drásticas mudanças, eles que adoram o remanso das águas paradas.

Como toda a gente de bem sabe, com a vitória do dito Messias, os pais deixam de bater nos filhos e vice-versa, a poluição emigra, o clima reentra nos eixos, as estações do ano começam nas mesmas datas de antigamente, chove e neva só quando deve e é preciso, furacões e tornados ainda sopram forte mas sem provocar estragos, pregam uns sustos “buh!” e depois vão-se embora, o capitalismo selvagem é, finalmente, domesticado e adopta trejeitos amaricados, os especuladores ficam de tanga e vivem em barracas minúsculas e sem esgotos, os podres de rico distribuem as suas fortunas pelos mais desfavorecidos (só os de direita, os podres de ricos de esquerda mantêm-nas intactas porque – é sabido – sempre souberam usar o seu bago como deve de ser, em benefícios para o povo), o petróleo vai jorrar de tudo quanto é sitio (menos do Beato que continuará amaldiçoado), as gorjetas e as esmolas são garrafões de cinco litros de gasolina ou gasóleo, das máquinas das empresas de armamento americanas (só destas!) brotarão cereais e gomas em vez de armas e de balas, a fome e a miséria tornam-se peças de museu, a Fundação Mário Soares entrega à casa do Gaiato o equivalente aos subsídios recebidos do estado, o sexto e o sétimo classificados da nossa liga têm acesso directo à liga dos campeões trazendo o Sporting e o Benfica, de novo, para a ribalta e eu, apesar de nunca jogar, ganho o maior jackpot de sempre do euromilhões, afogando-me em dinheiro precisamente na altura em que os impostos acabam em Portugal!
Vai ser porreiro, não vai pá?


Fobias




Desta vez, como tinha o depósito cheio, não fui dos que foram apanhados com as calças na mão mas, mesmo assim e apesar do calor, tenho ido a pé desde a minha casa até à estação dos correios, cento e cinquenta metros de rua plana e bem asfaltada, no centro de Caxias, a metrópole onde vivo. Poupo na gasosa, poupo nos amortecedores, nos travões e nos pneus do carro mas desgasto as minhas ancas, os joelhos e os tornozelos e gasto um pouco mais a sola dos meus sapatos; é chato, mas o que é que se há-de fazer, a não ser grandes sacrifícios, para ver se desbaratamos um pouco menos do nosso dinheiro na porcaria do exagero que são os impostos cá do burgo, heim?

Há dias foi feriado na capital, foi no dia de Santo António, o santo casamenteiro, dia em que, para quem não gosta da poluição dos fumos dos cozinhados e do cheirinho a sardinha assada, deve ser uma grande seca ter que andar lá a passear, no meio daquela populaça, aquilo pode ser tudo menos uma coisa porreira pá.

São quinze quilómetros da minha casa até ao coração da cidade, mais um até ao largo das Pichas Murchas em Alfama, lugar de que já vos falei e que, nesse dia feriado, uma sexta-feira 13, assentaria que nem ginjas aos governantes que não deixaram os seus povos pronunciar-se em referendo sobre umas matérias complicadas demais para uma cambada de analfabrutos encartados. Como os irlandeses, os únicos que tiveram voto na matéria, lhes fizeram um grande manguito, eles, que antes andavam tesos e emproados, agora andam em treinos, a fazer alongamentos, prática que dá jeito para evitar as dores quando se dão muitas cambalhotas (não sei bem porquê, estou farto de ler e reler este bocadito do texto e esta sensação de que, de alguma maneira, vou acabar por ser acusado de estar a cometer algum tipo de pecado não me larga. Que chatice!).

Ir àquela zona de Lisboa comer uma sardinhada é um dos rituais que, anualmente, eu gosto de cumprir e que, Deus querendo, para a semana espero concretizar.
Estou indeciso entre ir de popó ou de transportes públicos, entre ir de comboio até ao Cais do Sodré e, depois, optar por uma das duas soluções possíveis para chegar a Santa Apolónia, a pé ou de autocarro. A pé…hum…não me parece, é longe como o raio, o mais certo é ir de autocarro.

Também podia fazer esse percurso de metro mas, a mim, só se eu estiver distraído...não, não, não é bem assim, só se eu estiver perdido de bêbado e muiiiiiiiiiiiiiiito distraído é que me apanham a andar debaixo da terra, enfiado numa caixa metálica, entalado entre duas paredes escuras, de tectos baixos e demasiado juntas para o meu gosto.

Uma vez em Londres – só conto isto para dizer que viajo de quando em vez – dei por mim, descidos que foram quinhentos degraus, encafuado numa carruagem que, no seu ponto mais alto, não tinha a minha altura e que, na sua parte mais larga, não dava para eu esbracejar com os braços e os dedos esticadinhos. Escusado será dizer que fiz o que o diabo faz quando vê uma cruz, pirei-me como um foguete logo na primeira estação onde aquilo parou e, até hoje, felizmente, ainda não fui obrigado a testar aquela que é uma das minhas fobias mais chatas, comparável à fobia dos governantes europeus aos referendos sobre o tratado-que-já-foi-porreiro-pá-mas-que-agora-parece-que-já-não-é.

Não é preciso exagerar, eu não tenho assim tantas fobias; tenho algumas, é verdade, de certeza que vocês também têm, deixem-se de tretas, não pensem que me enganam, para aí armados em fortes!
Mas esta é a mãe de todas elas, depois desta e da fobia que tenho ao pagamento de impostos exagerados, só as favas é que conseguem assustar-me tanto; mas isso fica para outra vez, por hoje a minha terapia chegou ao fim. Até para a semana.

Monday, June 09, 2008

Memórias





Começo por informar que recebi uma resposta correcta ao problema que lancei na edição 892 deste jornal!

Apesar de já ter terminado o prazo dado para me enviarem a solução, apesar do leitor que a enviou não ser adepto do meu clube, eu dispus-me e enviar-lhe o prémio prometido, um livro da minha autoria e totalmente em branco, um exemplar autografado da 13.ª edição, edição que deverá chegar às bancas brevemente, lá para o final do século.

O senhor Diamantino Marques, residente no Laranjeiro em Almada, acertou em cheio no cálculo e na resposta, ainda lembrado da matemática que lhe foi ensinada em 71 pelo senhor Professor Isaías, do Campo de Besteiros. Agradeço ao leitor do Jornal de Tondela a sua participação, dou-lhe os meus parabéns e, conforme combinado, far-lhe-ei chegar a edição numero 100 do meu livro.

Estou a pensar em enviar, para o seu antigo professor, os contactos de alguns dos outros leitores que concorreram, pode ser que ele ainda consiga ensinar-lhes umas contas.

Eu falo muito mas se calhar também a mim me fazia bem uma ajudinha nesse campo. É que eu hoje estou completamente estoirado, tudo porque me saíram furadas umas contas que fiz e que, por norma, me saem até muito bem.

Todos os anos, algures durante um dos fins-de-semana da primavera, é preciso polir duas mesas e oito cadeiras de madeira que tenho no meu jardim, para lhes descascar a roupa com que se foram vestindo para se protegerem do frio, da chuva e da falta de pontaria de pássaros, passarinhos e passarões.

Normalmente, por capricho de um sorteio que teima em ser-lhe desfavorável ano após ano, é a Maria que também tem de fazer todos estes trabalhos mais pesados, mas como este ano é ano de campeonato europeu de futebol, eu, por bondade – sim, eu sou bondoso! – e já que a vou obrigar a ver tanto futebol, decidi que ia ajudá-la, decidi aliviar um pouco o seu trabalho, decidi polir pelo menos uma das cadeiras e encher a minha roupa e mãos com pó, isto tudo apesar de já estar muito cansado por ter andado a jogar ténis nos dois dias anteriores. Tenho um coração mole, é o que é!

Só que fiz mal as contas! A Maria já aprendeu uns truques e quando dei por mim metade do trabalho estava feito e ela à sombrinha, toda repimpada a supervisionar. Ou me ponho a pau ou não tarda nada estou a fazer alguns dos trabalhos caseiros. Urgggghhhh…até tremo!

Consta por aí que tabém o meu FêCêPê estará necessitado dumas aulitas com o Professor Isaías. Verdade ou não, aqueles cálculos furados já estão prejudicar a minha saúde graças a uma catrefada de amigos meus que têm passado estes dias a telefonarem-me cá para casa e a dizer-me “ó pá, se queres veres o teu clube a jogar nas competições europeias, tens de mudar já para o Canal Memória da TV Cabo”.

E logo eu, que nunca gozo com ninguém…acham isto justo? É, eu também!

Thursday, May 29, 2008

Chilreios





Há muitas coisas que me arrepiam todo, coisas que me põem com pele de galinha como o barulho dum marmanjo qualquer a fazer música arrastando um prego ao longo da chapa do meu carro ou o meu irmão a cantar o fado da desgraçadinha no gamanço.

Um dia, em casa dos pais dele, ouvi barulhos esquisitos. Valente como sou avancei na sua direcção, a câmara de filmar do meu telemóvel a funcionar para poder apanhar os gatunos em flagrante delito, a intensidade do som aumentou à medida que me fui aproximando da zona dos quartos e tornou-se insuportável por detrás da porta de uma das casas de banho. Um vulto, de capacete na cabeça e uma corda grossa e comprida com um nó à volta do pescoço, surgiu de dentro do armário que fica no corredor e disse-me que era melhor irmos dar uma volta enquanto o filho dele estivesse a cantar no banho. Ainda hoje, quando estou deitado no divã do psiquiatra por causa do meu problema com os impostos que pago, o meu coração dispara se o doutor traz o episodio à baila, coisa que acontece com frequência por que o gajo é um lagartão e adora chatear-me pavoneando-se com uma taça em cada uma das mãos.

Ele, o meu irmão, pelo contrário, ficou numa boa e continua convencido de que tem uma bela voz. Desde há uns tempos que frequenta um grupo coral em vila nova de Gaia, terra onde mora e de aonde conseguiu ainda não ser expulso.
Quando mo contaram pensei que fosse um coro formado por pessoas com graves problemas de audição mas um dia vi um vídeo duma das actuações deles e fiquei aterrado. No palco, único elemento da segunda fila e bem escondido atrás de um dos colegas, lá estava ele e, na plateia, que estava repleta, reinava a calma, havia gente sorridente, sem ovos, tomates ou caçadeiras nas mãos.

Quando finalmente o realizador conseguiu, a muito custo, fazer um grande plano do meu irmão, agarrei-me à cadeira com toda a força e só então percebi que alguma alma caridosa lhe tinha colocado à cintura um cinto cheio de explosivos, o detonador estava preso junto à garganta, razão pela qual ele se limitava a abrir e a fechar a boca sem que de lá saísse qualquer som. Relaxei, sorri e achei que, finalmente, o mundo estava a salvo e que eu tinha ficado curado.

Engano meu!

No passado fim-de-semana, enquanto estava com os pais dele, recebi um e-mail com dois ficheiros de duas gravações áudio, um ficheiro com fotografias e um enigma: descobrir qual dos dois ficheiros áudio era a gravação, feita em directo, dum aparatoso desastre ocorrido durante uma prova de velocidade num autódromo japonês que envolveu o despiste de vinte e seis carros.

O pandemónio, o caos e a cacafonia numa das gravações não deixava margem para dúvidas, só podia ser aquela.
Impressionado, abri o ficheiro das fotografias, sem dúvida – pensei eu – as fotografias relativas ao desastre sonoro que acabara de ouvir!
Eram de facto de um dos desastres sonoros que ouvira, mas retratavam a actuação recente do grupo coral dos alunos e ex-alunos de inglês da universidade da terceira idade de Tondela, sendo que os dois elementos que mais contribuíram para a queda prematura dos frutos da cerejeira lá do quintal e a extinção das aves canoras foram os pais do meu irmão.
Quem sai aos seus…

P.S. – Como não estava correcta nenhuma das respostas que recebi sobre o problema que lancei na crónica da semana passada, dou mais uma semana para alguém, com a ajuda da matemática, me conseguir dizer aonde é que estava o pai da mãe do filho.

Monday, May 19, 2008

Cáculos




(foto daqui)



Tivesse sido eu o distraído a ser apanhado com a boca na mortalha dentro de um avião português, tivesse sido eu a invocar desconhecer estar a infringir uma lei ou tivesse sido eu a prometer acabar com o vicio como prova de que nunca mais erraria, tivesse sido eu a fazer aquilo tudo e não estaria em condições de escrever este texto, estaria morto e enterrado pelo ridículo e pelo desprezo a que as autoridades, certamente, me teriam votado!

Em múltiplos estudos relacionadas com os níveis de desenvolvimento, Portugal aparece sempre muito mal classificado quando comparado com os nossos parceiros europeus. O episódio do fumo a bordo do avião da comitiva governamental, a saloia explicação e a bacoca promessa do nosso primeiro, por irrelevantes que pareçam, são exemplos elucidativos das causas que explicam, e bem, o nosso teimoso atraso!

No país que foi visitar, governado pelo amigo Hugo, há petróleo em barda e um litro de gasolina é muito mais barato do que um litro de água; ao preço a que se vai vendendo o oiro negro seria de esperar que os venezuelanos, a esmagadora maioria dos venezuelanos, estivesse a viver um presente risonho, cheio de propriedades e que o acordar de todos os dias fosse ansiado e animado.

É, infelizmente também por cá o socialismo pôs a coisa preta. O nosso acordar também não é animado e é, quando muito, ansioso. Aos impostos, estúpida e exageradamente altos para sustentar os vícios públicos, juntou-se agora o elevado preço do petróleo. Este rico par criou um cocktail que está a dar cabo da nossa existência. Segundo alguns, ainda a procissão vai no adro, quando ela chegar ao altar, os únicos andores serão mesmo aqueles que já se foram. Só para elucidar quanto aos impostos: em Badajoz, vende-se o gasóleo a €1,15 e a gasolina 95 a €1,13 por litro. Em postos da Galp! Essa mesmo, a nossa!

Com tanto taco a viajar dos bolsos dos países consumidores para os dos países produtores, uma das mais importante guerras que nós, democracias ocidentais, temos que travar – e ganhar – é a de evitar que os ricaços, os governos ricaços que não se regem pelas mesmas regras que as nossas – regras democráticas – nos corrompam com os seus fundos soberanos.
Estes fundos soberanos, com pipas e pipas e pipas de massa, controladas por estados com governantes pouco recomendáveis, andam às compras, atrás das nossas empresas privadas, empresas que às escondidas eles odeiam pela que representam de sucesso do capitalismo privado versus capitalismo de estado. Com excepção de uma minoria – como o Canadá e a Noruega – a maior parte destes fundos soberanos pertencem a regimes ditatoriais como o do anfitrião, camarada e amigo daquele senhor que disse que ia deixar de fumar.

Controlar estas compras vai ser um enorme quebra-cabeças, a chanceler alemã deu um grande sinal nesse sentido propondo um sistema europeu de veto a aquisições de certas empresas privadas por parte desses fundos estatais.

Por falar em quebra-cabeças e para arejar as ideias, enviarei um livro da minha autoria, cujo título é “O livro em branco”, a quem me der a resposta certa (suportada por cálculos matemáticos) para o problema, que me chegou através de um familiar:
Uma mãe é 21 anos mais velha do que o filho.Daqui a seis anos a mãe terá uma idade 5 vezes maior do que a do filho.Pergunta-se: Onde é que está agora o pai? As respostas podem ser enviadas para javcosta@netcabo.pt

Monday, May 12, 2008

Concursos

(foto daqui)
Abdel-Qader Ali, o pai que matou a própria filha



A miúda tinha 17 anos, o soldado das tropas ditas invasoras vinte e dois, a miúda deixou-se embeiçar pelo equipamento do militar, conversa puxa conversa, só mesmo conversa em público à moda dos namoros dos nossos avós, o paizinho da menina com a gravidade da ofensa causada passa-se dos carretos, espeta-lhe o pé com a bota calçada na traqueia, a mãe da infeliz apaixonada tenta que algum dos seus outros dois filhos ajude a irmã, a ajuda vem mas é para pressionar a bota ainda mais de encontro à garganta da vitima, a policia leva o assassino para a esquadra local onde, pela própria boca do senhor da bota em entrevista a um jornal inglês, o mundo fica a saber que a sua conduta foi graciosamente aplaudida antes de ser enviado em paz para o aconchego do lar.

Rand Abdel-Qader, a miúda, enquanto estudante universitária e voluntária na assistência a famílias desalojadas, fizera um biscate durante uns tempos como interprete, facilitando a comunicação entre as tais tropas ditas invasoras e os ditos invadidos, acabando por cometer o inqualificável pecado que levaria o seu pai – o pai biológico esclareça-se – a limpar-lhe o sebo com tanta elegância e propriedade.

Para este funcionário público iraquiano, a filha, por ter falado em público com Paul, o soldado estrangeiro, perdeu o que a mulher tem de mais precioso e embora ele ache que nós, os ocidentais, possamos ficar chocados com o castigo que ele lhe aplicou, entende que devemos aprender que as filhas deles têm que respeitar a sua religião, a sua família e os seus corpos, não podendo dormir com muito bem querem nem ficar grávidas sem estarem casadas.

Outra miúda, mais ou menos a mesma idade, 18 anos, outro país já sem tropas ditas invasoras no território, país de princesas e músicos famosos, um exemplo na nossa civilização e o sonho de qualquer turista faminto de história e de cultura, queria mesmo era dar de frosques, pôr-se na alheta o mais rápido e para o mais longe possível, pirar-se dos abusos do paizinho, o tarado não foi de modas, não esteve pelos ajustes, tirou-a de circulação e enfiou-a numa cave onde, durante vinte e quatro anos e sem que ninguém desconfiasse, fez o que nenhuma das mais criativas mentes de histórias de terror conseguiu pôr em livro ou em argumento de filme.

O raptor ainda não explicou os porquês, o mundo ainda só conhece a tanga que ele usa na praia para esconder uma das armas do crime, o mundo aguarda ainda as outras tangas que ele deverá, através dos seus advogados, contar durante o julgamento.

Milhares de miúdas, juntamente com outras centenas de milhar de seres humanos, de crianças, de homens e de mulheres, velhos e novos, numa outra cultura e num outro país, num país invadido pelos ventos e por tropas não estrangeiras, desesperam para que os pais de outras meninas autorizem que lhes seja permitido o acesso ao pouco conforto que outras gentes lhes querem entregar. O mundo está chocado e as miúdas também estão em choque!

Aos dezoito anos, a gente, não sei se toda a gente mas eu pelo menos gostava de discutir com os outros e dizer-lhes “a minha? A minha é muito melhor que a vossa!”, “queriam, isso é que era bom, a minha é que é boa, as vossas não prestam!” “vão-se encher de moscas, a minha é que é” e por aí fora até alguém desistir.
Interrogo-me se, hoje, seria menino para, afincada e orgulhosamente, defender que o meu monstro é que é o tal, muito mais monstro que o monstro dos outros.


O famoso aquecimento global, aquela anunciada, badalada e muito premiada catástrofe provocada pelo moderno mas ainda troglodita homem (vá lá vá lá, safam-se as mulheres e as crianças) anda pelas ruas da amargura, os seus fãs mais conhecidos parecem um bocadito desapontados e deprimidos.
A pressão mediática sobre o indígena malfeitor continua – pois claro! – mas tem-se notado um certo um abrandamento no assédio, até porque há por aí outras causas tão ou mais importantes, especialmente importantes para os desgraçados e ingratos poluidores, como o preço dos alimentos, dos combustíveis e de todas as outras coisas que vêm por arrasto e muito provavelmente eles não terão muita pachorra para andar a aturar os problemas das gentes mais ricas.

À custa de tanta lavagem ao cérebro, eu já andava a pensar em comprar alguns dos produtos que essa malta anuncia mas o frio que apanhei durante a minha semana de férias numa praia no sul do país, fez com que mantivesse as mãos e a carteira bem enfiadas nos bolsos das calças. Prometem-me mundos e fundos e depois nicles, um frio de rachar e água mais própria para pôr no viski do que para tomar banho.

Esta mania de quererem que eu morra cheio de saúde dificultou-me os jantares já que, no meio de para aí uns cinquenta restaurantes que há no centro da vila dessa praia, só num é que eu podia fumar sentadinho à mesa e abrigado do vento. Podia ir para a esplanada, isso eu podia, mas fossem para lá eles, levar com o vento na tromba.

Enquanto estava de papo para o ar, cheio de camisolas e enrolado na toalha de praia li uma noticia onde foram (finalmente!) divulgados os resultados dum estudo feito por uma organização inglesa sobre o índex de democracia diária em vinte e cinco países da comunidade europeia, publicado no final de Janeiro passado, resultados esses que são claramente positivos para todos os que se queixam desta falida republica socialista e laica, com um honroso quarto lugar a contar do fim, o vigésimo primeiro lugar.
Esta fantástica classificação resulta da análise de seis dimensões: até que ponto se valoriza o direito de voto (14º lugar), qual o grau de activismo e participação cívica (19º lugar), o valor da democracia como solução para a resolução dos problemas (20º lugar), a democracia no agregado familiar (21º lugar), democracia no local de trabalho (18º lugar) e democracia nos serviços públicos (23º lugar).

Nem de propósito, a ANACOM (lê-se “ana come”), que não tem que meter o bedelho nos preços cabendo-lhe a verificação do cumprimento das obrigações pelos operadores, acha que nós, totós aqui nascidos, devíamos pagar uma taxa por um período inicial pelas nossas chamadas de telemóvel em vez de sermos facturados apenas por cada um dos segundos que gastamos agarrados ao nosso telemóvel. Com mais esta alteração lá vai o mexilhão dar mais uma cabeçada na rocha, com mais força, paga cada vez mais mas menos pode bufar.

O PSD, pela voz do senhor Esteves, anunciou que pediu e que obteve autorização do tribunal constitucional para pagar em prestações suaves uma multa que lhe tinha sido aplicada; até aqui tudo bem, pagar em prestações não é crime mas, segundo aquele porta-voz, este modo de pagamento não terá custos adicionais para o partido porque – sentei-me! – não acarreta juros.

Como é que ele disse? Sem juros? Ouvi mal…