Thursday, July 02, 2009

Miopia





Certinho como as estações do ano, aí está ele, o senhor Estado, a matraca numa mão e a outra estendida, a exigir-me o adiantamento de mais uma prestação – a primeira das três que sou obrigado a fazer este ano – do empréstimo (imposto) sobre os lucros que nem sequer sei se vou ter durante o resto do ano até Dezembro. Sem falar no descaramento que é não me pagarem um chavo pelos adiantamentos. Se fosse ao contrário…cala-te teclado!
São estas coisas simpáticas que dão mais cor à vida e eu não me canso de agradecer aos deuses por me darem a oportunidade de viver num país com esta economia, uma economia que, segundo a maioria da nossa opinião pública e publicada, é perigosamente capitalista e neoliberal e a causa de todas as desgraças que nos apoquentam, seja dentro das fronteiras ou fora delas.
Quando um povo tem um grande banco “só nosso”, mais outro grande banco “quase nosso”, uma televisão “só nossa”, uma rádio “só nossa”, empresas privadas cotadas em bolsa que afinal têm de fazer o que “nós” dizemos, grandes empresas e respectivos empresários que não conseguem viver sem os “nossos” apoios, uma economia que vive assim, com isto tudo, é, óbvia e claramente, uma perigosíssima economia, uma economia neoliberal onde o capital anda à solta, sem rei nem roque, como um elefante numa loja da Vista Alegre (passe a publicidade).
Só numa economia desgraçadamente neoliberal é que um primeiro-ministro teria o poder e a lata para usar os negócios entre empresas privadas-que-ó-caraças-afinal-não-o-são para calar uma senhora que, por causa da sua grande boca, o põe a ferver (oooppps…acabei de dar uma traulitada numa mosca que ficou escarrapachada ali no mapa mundo, mesmo em cima de Caracas, a capital da Venezuela).
A embirração com a (crescente) estatização da minha vidinha não me traz nada de bom, só me faz mal à saúde, aumenta-me os ácidos estomacais, põe-me com cara de quem está sempre a chupar limão e prejudica o meu ténis.
Se não fosse egoísta, devia até ficar contente pelos imensos êxitos que, trinta anos desta nossa dita economia neoliberal, trouxeram aos portugueses em geral.
Êxitos esses comprovados em tudo quanto é estatística, onde aparecemos sempre muito mais bem classificados do que outros países com economias diferentes da nossa, e que se traduzem num crescimento continuo e fabuloso da pobreza riqueza nacional – que é como quem diz da “nossa” riqueza – e no conjunto de todas as coisas boas que a maior quantidade de carcanhol disponível no bolso dá para adquirir.
Como acumulo egoísmo com estupidez, sou incapaz de dar o braço a torcer e contentar-me com este Estado de coisas; mais grave ainda, bem podem continuar a abanar com as vantagens deste regime mesmo à frente do meu nariz que eu continuarei a não dar por elas.
Por causa da miopia!

Cordeirinhos







Estava eu muito bem refastelado no meu sofá, numa posição muito própria do homem – com o comando do televisor na mão, a passear de canal em canal – metido com os meus botões, a matutar nas coisas do meu dia-a-dia, quando, de repente, dei de caras com o rosto dum coitadinho no ecrã do aparelho.
Pareceu-me reconhecer o penteado, ia até jurar que a cara me fazia lembrar a do nosso querido líder e primeiro-ministro, mas o som estava tão baixo e a vozinha tão delico-doce que, confuso, fui incapaz de jurar a identidade do senhor, para lá de qualquer dúvida.
Embora tivesse elevado o nível do som do televisor, já não fui a tempo de ouvir mais nada do que estava a ser dito, excepto a afirmação de que sim senhor, o rosto estava muito satisfeito consigo mesmo.
A seguir ao choradinho do desgraçadinho, talvez aproveitando-se do facto do homem estar de rastos desde as últimas eleições, cerca duma trintena de economistas manifestaram-se a favor da revisão das grandes obras públicas, à laia de “arrive lui qu’il bouge encore” ou seja, traduzido para português, casca-lhe.
Ao que sei, a lista é constituída pela nata daquela classe, nomes muito sonantes, gente do mais competente que há, quase tudo (senão tudo) personalidades ligadas ou próximas dos socialistas, dos propriamente ditos e também da versão social-democrata, um grupo de amigos que reúne nada menos nada mais do que oito ex-ministros das finanças entre outras pastas e muitos gestores da coisa pública. Esta coisa pública inclui o que sai da minha algibeira para os cofres do monstro.
Eu cá não percebo puto de obras públicas, sejam elas grandes ou pequenas, trate-se de abrigos nucleares para as meninas do intendente ou de comboios de pequena ou grande velocidade.
Em boa verdade não é só de obras públicas que eu não percebo e felizmente sou um perfeito ignorante ambulante que se desloca em duas patas; mas sei muito bem que não gosto que saquem o guito do meu bolso em impostos elevados. Se ainda por cima é para o esbanjar, fico uma fera e, também eu, me transformo num animal feroz.
Para o gastar mal gasto até eu, na minha santa ignorância e no meu ritmo pachorrento, sou menino para ter umas quantas ideias e não preciso que os outros se incomodem por mim.
Daquele lote de notáveis economistas, exceptuando o Dr. Medina Carreira que, consistentemente diz mal da tropa fandanga que nos tem desgovernado, quer-me parecer que a esmagadora maioria dos outros anda um bocado distraída já há uns tempos.

Fatalidades





A Adelaide da Facada há muitos anos que não tem uma enxaqueca, uma tossezinha ou até um qualquer outro tipo de maleita, coisa que, muito provavelmente, terá de agradecer ao facto de ter esticado o pernil há quase um século. Podia ser fruto dalgum poder sobrenatural mas não, três palmos de terra em cima da chicha e do esqueleto operam milagres. Uma navalhada profunda no lado esquerdo alterou-lhe a cara e o nome.

Aliás, o Amâncio, que foi seu amante, boémio e brigão, tocador de guitarra e fadista nas horas vagas, também é menino para se gabar de ter a mesma saúde de ferro; estatisticamente falando, é tão provável este casal de falecidos ter um ataque de gota como o Benfica ganhar o título de campeão nacional. Digo eu, aqui em conversa com o teclado, sem exageros nenhuns, como é hábito.

A Adelaide da Facada alugava o corpo por necessidade e profissão; quando não havia clientes aflitos, esparramava-se num banco duma taberna na Mouraria e por lá ficava, a fumar, enquanto o Amâncio, nos intervalos da porrada, amaldiçoava o destino e afogava as mágoas numa garrafa da pinga da casa. É este o casal retratado no “O Fado”, da autoria de José Malhoa.

O pintor, ao que consta, andou muito tempo pelas ruas dos bairros populares de Lisboa à procura de gente de condição o mais baixa possível, gente com que ele pudesse retratar a realidade que via e que sentia. O produto final, uma das suas mais célebres obras, pode ser, temporariamente, apreciado numa visita ao museu do fado em Lisboa, às portas de Alfama.

Lá pude conhecer, um pouco melhor, a história do fado, desde o inicio até aos dias de hoje e uma extensa lista de cantadores famosos, uns que já estão a fazer companhia à Adelaide e ao Amâncio e outros que ainda vão arranhando umas coisas. O visitante pode seleccionar um artista pelo nome e vê-lo em fotografia enquanto aprecia o fado que, supostamente, o tornou digno de nota.

Noutra lista, sem direito a som nem a imagem, no meio dos que deram ou ainda dão voz à coisa, há outros listados que foram, ou são, os autores das letras, ou das músicas, ou de ambas. É aqui, na lista dos poetas líricos da actualidade, que eu tenho grandes críticas a fazer, não sei se deva mas aqui vai, falta lá gente muito famosa, com grandes títulos recentemente publicados, nomeadamente:

- Augusto Santos Silva e o seu poema “Eleições de segunda ordem”, uma peça a dois tempos, versando sobre a estrondosa derrota nas eleições para o Parlamento Europeu;
- Almeida Santos e o ensaio “O Eleitorado não governa…a não ser que vote em mim”;
- Carlos César e o seu manifesto “É estúpido deixar que os outros decidam sobre o que nos diz respeito…a não ser que votem em nós”.

José Malhoa, no seu quadro, escondeu bem a cicatriz que marca o rosto da Adelaide da Facada; se fossem pintores, estes três poetas ignorados, na tentativa de esconderem o meio milhão de votantes que perderam duma penada, borravam a pintura…

Ai







“Portugal será uma excepção em relação ao resto da Europa” foi uma das frases que me fartei de ouvir durante a campanha para as eleições europeias; esta excepção devia-se ao facto de todas – todas! – as sondagens apontarem para uma vitória dos socialistas que, apesar das trapalhadas do seu chefe e das politicas do seu governo, iriam aguentar o desgaste e vencer a múmia do maior partido da oposição e tudo o resto que se lhe apresentasse pela frente.
Este feito excepcional, a vitória do partido no poder numas eleições realizadas em plena crise, afirmavam-me os jornalistas, os comentadores e os fazedores de sondagens, só iria ser possível graças às enormes qualidades do nosso grande líder, o Zezito, que, de propaganda em propaganda, de inauguração em inauguração, se tinha fartado de puxar pela clientela, dando o litro e a ele, só a ele, se iria dever a anunciada vitória.
Por essa Europa fora, diziam as tais senhoras e senhores, semelhante feito, a vitória do partido no poder, dificilmente estaria ao alcance dos fracos políticos que governam os outros povos deste espaço, políticos que, não tendo a fibra do Zezito, o nosso querido líder, iam levar uma valente murraça nas trombas por andarem a gozar com o pagode.
Para um vencedor há sempre um perdedor, há muito tempo que ele estava encontrado no maior partido da oposição e na velhota que o chefia; explicações para a derrota anunciada ouviam-se para todos os gostos, tudo era mau de mais para ser verdade, com destaque para as divisões dentro do próprio partido, até em plena campanha de que eram um exemplo as exigências do “jovem” quarentão Passos Coelho.
Galo do caraças, um ciclone chamado realidade, com o epicentro no Zé-povinho votante, não contente em despentear o camarada e candidato Vital Sassoon Moreira, virou tudo de patas para o ar e a tal excepção de facto aconteceu, sem dúvida que aconteceu, embora com resultados irritantemente diferentes dos anunciados, afectando, e muito, não só o nosso Zézito, mas também os seus melhores amigos, os socialistas que, como ele, também chefiam governos, nomeadamente o espanhol e o inglês. Para que estes governantes socialistas não ficassem tristes e sós, os caramelos que por essa Europa fora se dignaram alçar o dito da cadeira e ir votar, dedicaram-se também a malhar nos demais partidos socialistas, com ou sem governo (com uma ou outra excepção, claro está).
Quando a esmagadora maioria das astrólogas Mayas e dos professores Karamba que se passearam pelas televisões tinha dado como morto e enterrado tudo quanto não cheirasse vagamente a mofo e a socialismo, o resultados destas eleições, a derrota do Zezito e dos seus muchachos, mostraram que talvez muitos desses videntes precisem de tirar umas férias, quem sabe se prolongadas.
Mas acho que posso esperar sentado porque, apesar de terem sido cilindrados pela realidade, esta gente que gosta da situação em que isto anda(va), há-de levantar a grimpa e fazer o encomendado e o combinado.

Sprays







A malta azul do norte pegou na toalha e na mesa do piquenique e rumou até à capital para despachar uma dobradinha; eu fiz exactamente o contrário, rumei ao interior norte e fui comer, entre outras iguarias, uma rica feijoada acompanhada duma pomada de cinco estrelas, um tinto da abençoada região do douro.
Como o repasto dos azuis do norte estava marcado para um restaurante relvado que fica mesmo à porta da minha casa, foi uma boa forma de me livrar do anunciado caos no trânsito que centenas de autocarros iriam provocar e da consequente emissão de muitos e mal cheirosos gases, altamente prejudiciais à fina mucosa da minha adunca penca.
Consegui o chamado efeito de 2 em 1, o efeito duplo, o género de resultado parecido com o daqueles produtos que os pobres coitados que têm cabelo precisam de usar para afugentar as lêndeas e outros bicharocos irritantes.
Eu não sou dado a sentimentos de inveja quanto à aridez do meu cocuruto mas devo confessar que me roo todo de cada vez que apanho um tempo de antena ou uma reportagem do candidato camarada Vital Sasson Moreira; é que não é só a inveja pela simpatia do homem nem pela quantidade do pelo, é a inveja pela qualidade do mesmo, sempre impecável, bem arranjadinho, sem abanar um só milímetro. Dá a sensação que nem um ciclone o revoltará.
Tenho dado por mim em profundas reflexões sobre isto mas continuo às escuras e às apalpadelas, a ver se entendo como é que aquilo é feito.
Em todo o caso, presumo que o segredo esteja na laca, calculo que o senhor use algo muito especial, infelizmente deve tratar-se dum produto de difícil acesso a qualquer Zé da esquina, não me admiro nada que seja uma coisa bastante mais barata lá fora do que cá dentro, o que ajudaria a explicar a candidatura.
Qualquer que seja a marca do produto em questão, acho que o camarada candidato deve abusar dele como eu abuso do chantilly em lata, quando borrifa a trunfa muito lhe há-de espirrar para a cara, o suficiente para lhe colar aos lábios aquele meio sorriso permanente e indefinido, de quem está, do alto da burra, a gozar com o pagode ou de quem está na presença da rainha montado numas socas seis números abaixo do seu tamanho.
Dizem-me que a grande maioria destes produtos, quando inalados assim, em doses industriais, provocam alterações na quantidade de oxigénio que chega às células azuis do snifante o que, na minha modestíssima opinião, explica que este candidato diga num dia que “certamente por acaso e só por acaso todos aqueles senhores [do caso BPN] são figuras gradas do PSD. Estamos à espera que o PSD se prenuncie sobre a roubalheira do BPN…o caso BPN é um escândalo vergonhoso e uma roubalheira…devemos denunciá-lo, porque é um escândalo, uma vergonha de utilização dos dinheiros da economia para efeitos puramente criminosos” e no outro afirme arrebatado que “o PSD, e a sua actual direcção, entrou em ruptura com a sua história e está a romper com a sua tradição, com o seu passado reformista…”.
Na impossibilidade de arranjar uma lata do produto para meu próprio gozo e consumo, vou tomar como boa a última afirmação do senhor socialista e vou ajudar o candidato parecido com os bonecos sempre em pé, o social-democrata Paulo Rangel, a manter a tal ruptura com o passado.

Querido diário





Estou cheio de sono e amanhã tenho que me levantar cedo. Não ponho já a tampa na caneta e o pijama no corpo porque entre esta linha e a linha quarenta e sete deste texto ficaria um enorme espaço em branco que me daria algum trabalho a explicar a quem tu muito bem sabes.
O dia hoje foi muito cansativo; tinha programado ir a Lisboa, depois do almoço, à manifestação do partido comunista mas quando soube, já dentro da camioneta, que de cu tremido só até ao Marquês de Pombal e que, para ter direito ao programa completo com discursos e tudo incluído, era preciso andar mais do que cento e cinquenta metros a pé até à zona dos palcos, borreguei.
Já estava cansado graças a uma noite mal dormida por ter teimado em ver um filme completo do Manuel de Oliveira, imprudência que me pôs num tal estado de excitação que me impediu de pregar olho e a perspectiva de ir para as avenidas da capital andar aos berros, de braço no ar e, ainda por cima, a penantes, tirou-me o ânimo para a política de rua.
Tomada a decisão de me baldar à passeata na capital, ainda pensei em ver se conseguia arranjar uma boleia que me levasse até ao comício dos socialistas em Coimbra; o cartaz prometia, o elenco, já de si notável dada a presença do Zezito, ia ser abrilhantado com a vinda dum artista estrangeiro, nada mais, nada menos do que o chefe do governo dos nuestros hermanos e se a reunião acabasse cedo talvez ainda desse tempo para ir ouvir uns fadinhos de Coimbra. Há tantos anos que não vou a uma casa fados da cidade do Mondego que a perspectiva agradava-me.
Não tendo encontrado, entre os meus conhecidos, uma única alma que tivesse vontade de ir ver o chefe a botar faladura em português de Castela, arrumei a ida num encolher de ombros e peguei no jornal do dia à procura de pistas sobre ofertas concorrentes e alternativas, ver por onde iriam andar os candidatos laranjas e os azuis; excluída e fora de questão estava a possibilidade de me juntar aos amigos do télé evangelista Frei Louçã porque, desesperado sim mas não tanto.
A ideia era ver se ainda ia a tempo de conseguir meter o meu nome nas listas a candidato às próximas eleições europeias; não por causa do salário mensal, apenas sete mil e tal euros, nem do subsidio, diário, de duzentos e quarenta e um euros, nem do direito a empregar a Maria e os putos como assistentes pessoais, nem da reforma vitalícia, não, tudo isso são ninharias.
Movia-me a inveja pelo direito à poltrona de massagens, ao jacuzzi e a tudo o mais a que aqueles pobres desgraçados vão ser obrigados a usufruir no ginásio onde o parlamento europeu vai gastar quase dez milhões de euros em obras de renovação.
Querido diário, tenho mesmo de tomar uma pastilha para a dor de cotovelo e vestir o pijama. Até amanhã.

Tretas (CCV)







Numa outra encarnação, numa das outras vezes em que viajei do céu em direcção à cova disfarçado de terráqueo, devo ter sido um brilhante músico, um exímio executante de violino, tão conhecido a nível mundial na época como hoje é conhecida a gripe suína. Isto sem querer, com a comparação, ofender a gripe, não vá ela amuar e chamar-me um figo.
De certeza que fiz parte de, pelo menos, um agrupamento famoso, andei em digressão por tudo quanto era lugar onde o calor era rei e o frio um triste desconhecido, arrastei milhares de fãs dispostas a fazer coisas do arco da velha para poderem passar-me a mão pelo cabelo – sim, seguramente que nessa encarnação, o meu couro cabeludo era sedoso, liso e comprido, o género de escalpe que, ainda hoje, fica a matar na sala de visitas dum qualquer chefe índio, se é que me entendem.
Cheira-me que, além dos elevados dotes musicais, possuía também um enorme poder de organização e uma queda danada para a escrita, as encomendas entregues a tempo e a horas, devo ter escrito livros a dar com um pau, alguns terão mesmo sido um êxito de vendas danado e feito da minha pessoa um mano muito rico.
A parte irritante destas repetidas visitas à terra é que eu acho que elas funcionam como um sistema de vasos comunicantes, quer dizer, quando uma alminha faz a viagem e acaba encarnado num espécimen cheio de coisas boas e com muitas qualidades, é certo e sabido que, na vez seguinte, já não vai receber o mesmo tipo de equipamento de série, há que gramar uma vidinha inteira com um kit completamente diferente, menos produzido e um bocado para o rasca.
Está na cara que estou a tentar justificar o fraquíssimo conjunto de extras existentes no esqueleto que assaltei para esta visita, incluindo a péssima qualidade dos programas que equipam o cérebro que coordena e comanda a coisa, programas que são do mais básico que há e, sei lá, só para perceberem a miséria franciscana disto, tão mau assim só mesmo o Magalhães


(estão a ver?, esta minha obsessão com o primeiro computador verdadeiramente português, é causada por um programa marado que está sempre a encravar e a dar erro).
Como não há fartura que não dê em fome, depois de ter vindo equipado com tantas e tão boas qualidades musicais no passado, agora limito-me ao banal e corriqueiro dom para tocar campainhas de portas, coisa que, se calhar, até vocês, queridos leitores, conseguem tocar. Na volta e às tantas, alguns até serão bastante melhores nisso do que eu, mas não se preocupem, eu não fico com inveja.
Calculo que na última encarnação devo ter usado e abusado das cunhas e dos favores porque, desta vez, vim desprovido de qualquer trunfo nessa matéria; em todo o caso, pudesse eu dar uma ou duas palavrinhas a quem de direito, de modo a obter uns pequenos ajustamentos na carroçaria e nos programas, e vocês, queridos amigos e leitores, em vez de estarem a ler esta treta sem terem que me pagar rigorosamente nada, bem podiam fazer bicha e abrir os cordões à bolsa pelo privilégio de me ver e ouvir, mesmo que de longe, a interpretar uma coisita qualquer. A dar-vos música, boa música bem entendido!