112 Lexington Avenue, Bridgeport, USA.
Esta não é uma morada ao calha. Esta é a morada, cujo passado eu andei a investigar durante este fim-de-semana, aproveitando as maravilhas da tecnologia, confortavelmente sentado na minha cadeira e em frente ao meu computador, sem vontade para sair de casa por causa da confusão da cimeira.
Ali, há quase cem anos, a 28 ou 29 de Junho de 1917, o Ezequiel e o Custódio terão dado um abraço, um abraço apertado, umas quantas palmadas nas costas, sorrisos largos, o Custódio disse "estás com bom aspecto, primo, as gringas tratam-te bem!", e o Ezequiel retorquiu "e tu, deste-te bem lá pelas terras do Brasil?". Devem ter morto as saudades, partilhado esperanças e brindado a um futuro melhor. Não consta que tenham ressonado apesar da quantidade de bebida ingerida.
O Custódio Marques tinha chegado ao porto de Nova Iorque, no navio "Vauban" vindo do Brasil, via Buenos Aires. Às autoridades aduaneiras, disse ter 23 anos e a fortuna de 10 dólares, de ter sido ele a pagar a sua viagem e que ia para a casa do primo Ezequiel Henriques. Vinha para trabalhar mas fazia tenção de regressar para o seu país de origem. As autoridades registaram-no como física e mentalmente são, capaz de ler e escrever, sem cicatrizes ou marcas especiais, de olhos castanhos e cabelos pretos.
No mesmo navio vieram, de Santa Comba, o João Almeida, com 24 anos e 32 dólares e o Augusto Leonardo, de 22 anos e com 35 dólares, mas foram para outras paragens.
Em Setembro do ano seguinte, no dia 12, o Custódio foi obrigado a ir à inspecção militar. Apesar da primeira grande guerra se aproximar do fim os americanos queriam toda a gente alistada.
No cartão de registo, o Custódio escreveu que tinha nascido a 25 de Agosto de 1893, que era operário na Remington Arms Co. de Bridgeport, uma empresa de fabrico de armas e munições, e assinou-o declarando que tudo aquilo era verdade. As autoridades atestaram que o meu avô não tinha perdido nenhum braço, perna, mão ou olho, não estando obviamente desqualificado para o serviço. Na história da Remington, este dia ficou marcado por uma missa em comemoração do fabrico do ultimo rifle dum grande contrato com o exército dos EUA, a que compareceram, entre importantes figuras do exército e da marinha, mais de 14,000 dos seus empregados.
Diz o ditado, e é verdade, que quando vai um português vão logo dois ou três! A dada altura, naquela morada terão habitado o Custódio, o Ezequiel, o Moyses Mattos Affonso, o Júlio Reis e o José Henriques. Outros mais se juntariam:
O Roberto Ventura, filho de Manuel M. Ventura, que chegou no dia 18 de Fevereiro de 1920 no navio "Britannia", com 22 anos e 50 dólares; com ele vieram também o Sabino de Matos e o Alberto Mattos Almeida.
No dia 5 de Outubro de 1920 atracou no porto de Nova Iorque o navio "Providence". Um dos passageiros era o Joaquim Ventura, agricultor, que vinha para casa do irmão Custódio. Declarou 20 anos e 20 dólares, que não era nem polígamo, anarquista nem aprovava o uso de força para derrubar o governo americano e não sabia quanto tempo ia ficar. As autoridades consideraram-no mental e fisicamente são e sem quaisquer deformações. Com ele vieram o Joaquim Marques Matos de 28 anos e o Manuel Antunes de 38, com 30 dólares cada um.
Aos habitantes do 112 da Lexington avenue em Bridgeport, Connecticut, as autoridades americanas chamaram Tourigo Boys e, durante anos, mantiveram uma apertada vigilância.
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