Monday, April 30, 2007

Azares


(seen in www.atangledweb.typepad.com)

Alarmado e alertado pelas noticias recentes sobre os atentados terroristas em Marrocos e na Argélia, reivindicados por franchisados do grupo do Mr. Bin, decidi, num impulso, rumar até ás terras do Algarve, numa acção de vigilância costeira.
Berrei para a Maria: “Maria, liga aí para o sul, reserva lá uma caserna para nós dois na semana 17, traz-me uma lata de cerveja do frigorífico e faz as malas. Por esta ordem, ouviste?” (Não foi exactamente assim, mas dá um toque de macho!).

Hoje, véspera do regresso à minha casinha, sinto-me um bandalho e um traidor à minha civilização, os remorsos bailam-me na corneta ao ritmo desenfreado da salsa e tudo por culpa daquele maldito impulso. Saí da capital como paladino defensor dos costumes ocidentais face à ameaça do Islão radical e aqui me tendes, três dias passados, caído em tentação, adorador confesso da lei da “sharia”.

Começou mal a expedição, com muita chuva e pouca circunstância à chegada; fosse eu um gajo supersticioso, teria enchido o depósito do carro, rodado o volante trezentos e sessenta graus e regressado à base. Mas não, nasci completamente desprovido do sexto sentido e fiquei. Nessa noite, nas ruas, nos restaurantes, nos cafés e nos bares, vigilantes vindos do reino de Ricardo, o Coração de Leão, a pele já maquilhada de vermelho vivo, sandália aberta e meia branca, encharcados em bebida e armados de tacos de golfe, emprestavam à guarnição um tom de festa que verdadeiramente se não vivia.

Primeiro sinal de preocupação: tinha-me esquecido dos binóculos, arma essencial para aquela tarefa. Estava na cara que eu, que sem óculos não vejo um boi à frente do nariz, sem os binóculos também não ia topar os invasores, lá longe na linha do horizonte, mesmo que eles estivessem montados em cáfilas de camelos dentro dos barcos.

Segundo sinal de preocupação: a cerveja, liquido fundamental à manutenção de elevados níveis de alerta, absolutamente indispensáveis neste género de missões, foi-nos cobrada a seiscentos paus por cada copo de plástico, copo que, diga-se de passagem, levava menos liquido do que uma mini.

Terceiro e decisivo golpe: a Maria enganou-se na marcação da semana na caserna e nós só tínhamos licença para vigiar a costa na semana seguinte! Entretanto, com tanto vigilante vindo de fora, não havia casernas vagas. Bonito serviço! A Maria diz que o engano foi meu mas, como toda a gente sabe, isso é falso, só pode ter sido erro dela.

Resultado: sucumbi à tentação da tal lei da “sharia” imaginando os nossos tribunais e os meus pares a passearem-me em ombros, louvando-me e não punindo, por ter estrafegado a minha Maria, com as minhas próprias mãos, mais o estafermo do vendedor de cerveja (caríssima) na praça pública. Infiéis!

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