Como hábito, depois do debate a que assisti em directo e depois de ter lido, na Internet, uma série de jornais e de blogues portugueses, franceses, ingleses e americanos, fiquei deprimido. Como hábito, fui confrontado com o facto de ter nascido desprovido de ferramentas de interpretação, especialmente quando a análise envolve bate papos entre personalidades que representam a direita e a esquerda. Nestas alturas, só não afinfo com a cabeça nas paredes porque também não sou parvo a esse ponto mas, que fico deprimido lá isso fico, por o meu ponto de vista ser, quase sempre, contrário à maioria das opiniões publicadas.
Tornou a acontecer no final do debate entre o senhor Sarkozy e a senhora Ségolène Royal. Eu sei que o meu francês não é muito melhor do que o meu japonês e que até posso ter percebido mal quase tudo o que foi dito; eu sei que sou tendencioso como o caneco e que, nas curvas, descaio mais para a direita mas …que diacho! … quando quatro em cinco opiniões publicadas davam a vitória à senhora e, para mim, ele, o senhor, é que tinha sido – de longe – o ganhador, estoiraram-se-me os pirolitos, passei do estado sólido para o gasoso em três tempos, fui para a prisão sem passar pela casa de partida!
Duas horas de paleio e a boa-nova que, maioritariamente, correu mundo foi a da descoberta de excelentes níveis de capacidade de indignação, de resistência e de combatividade da senhora Royal, fruto da sua enxofrada reacção a uma afirmação do senhor Sarko que, surpresa das surpresas, afinal não se enfureceu, sabe-se lá quantos calmantes tiveram que lhe dar para que ele se não irritasse e se não afiambrasse à garganta da madame.
Nada, rien, nickles, zilt, sobre a incapacidade da senhora em justificar, mais em detalhe e a pedido do senhor seu oponente, algumas das suas posições, nomeadamente sobre a segurança, as leis do trabalho, os impostos e os serviços públicos, a economia, enfim, sobre uma série de coisas chatas e corriqueiras com que a arraia miúda é obrigada a confrontar-se diariamente. Ia até jurar que houve um momento em que ela patinou às duas rodas mas deve ter sido impressão minha (só pode, pois nunca mais vi esses preciosos segundos de fita).
Amuado, atirei-me enrolado para um canto e lá fiquei até às sete horas da tarde de ontem, domingo, hora a que os telejornais avançaram com as primeiras projecções sobre as eleições em França.
Então, assustado, encolhi-me ainda mais porque o meu canto ia ser pequeno demais para me albergar a mim e aos milhões de deprimidos analfabetos franceses que não souberam, hélas, votar na poupée de cire, poupée de son.
Cairá mesmo o céu em cima da cabeça destes irredutíveis gauleses se o novo presidente levar à prática promessas eleitorais como, por exemplo, a de meter na gaveta o famoso legado de Maio de sessenta e oito?
Como me sobraram, de patuscadas anteriores, algumas pastilhas contra a azia, vou distribui-las por aí (a começar pelo director do JN) mas, manda o bom senso, vou ficar com um par delas … para mim e … à cautela.
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