Este domingo fui à missa. O meu amigo Vítor diz que é esta prática que me dá uma sorte do caneco no ténis, única explicação para a quantidade exagerada de pontos esquisitos que, regra geral, viram o resultado final a meu favor, levando-o a clamar que jogar contra mim é uma luta desigual por causa da mãozinha invisível que me ampara. Ele, que acumula três das principais características que hoje definem a maioria do eleitorado português – agnóstico baptizado, socialista e benfiquista – acha mais fácil acreditar nesta teoria da cabala divina do que fazer o que lhe compete dentro do campo, dar o litro em cada ponto em disputa, cumprir a regra básica dum tenista: dar mais uma pancada na bola do que o adversário e fazê-lo de maneira a que ela caia dentro do campo dele.
O celebrante, um visitante e bispo da diocese de Viana em Angola, aconselhou-nos durante a homilia a usar a paciência de Job para lidarmos com as chatices actuais e comparou a sua comunidade com a nossa, dizendo-nos que é no exterior que celebra as suas duas missas dominicais, uma às sete e meia da manhã e a outra ao meio-dia, porque nenhum templo comporta os cinco a seis mil fieis que assistem a cada delas, sendo que, noventa e muitos por cento deles são jovens.
Vim para casa a pensar nisto e, nem sei bem porquê, do nada, vieram-me à memória outras palavras, as palavras do tele-evangelista frrrrrrrei Louçã, o pregador preferido das nossas elites comunicacionais, no seu sermão anti-capitalista aos crentes da esquerda caviar, naquele tom de voz de missionário que tem um elefante a pisar-lhe os calos:
“Alguém já viu o capital a produzir? Imaginem dois coelhos numa cova, de certeza que vão sair coelhinhos…se forem um casal. Mas experimentem pôr duas notas de cem euros numa caixinha; imaginam que vão sair notas de vinte dessa caixinha? O capital nada faz. É o trabalho que tudo faz.”
Numa cova? Como sou jovem, ainda só vi coelhos na caçarola, em gaiolas ou em tocas, mas não ponho em causa que, entre os láparos, o truca truca numa cova esteja muito na moda – humildemente confesso que eu, de geografia, não percebo nada; poderá obviamente ter sido apenas um lapso do tele evangelista, uma alusão a alguma fantasia recalcada, não sei.
Experimentei e esfreguei – à fartazana – duas notas de cem euros uma na outra e, de facto, mesmo com musica de fundo a ajudar – o bolero de Ravel – não consegui que elas produzissem chispa, quanto mais uma nota de vinte euros. Não que eu estivesse à espera disso, não senhor! Quanto muito, ter-me-ia dado por satisfeito com uma moedinha de um cêntimo, já que, com algum carinho, ela haveria de crescer, cantar-lhe-ia os parabéns quando chegasse aos dois cêntimos, aos cinco cêntimos, aos dez, aos vinte, aos cinquenta, ao euro e, quem sabe, à bonita idade de quinhentos euros.
De modos que estou ainda mais parvo e baralhado do que o normal: se o fruto do truca truca é sinonimo da produção do trabalho versus o capital, porque carga de água é que os esquerdistas, dos modernaços aos progressistas, andam muito atarefados a promover casais de homossexuais já que, segundo palavras do próprio chefe, nada vão produzir? Para isso não será preferível ficarmos com o capital, sempre dá para pagar as bejecas?
Andei eu, todos estes anos, a julgar que para aquela malta o truca truca era um ritual de afirmação de liberdades e prazer mas afinal, vai-se a ver, aquilo é uma grande seca, é a mesma coisa que trabalhar numa fábrica (ainda por cima, a julgar pelas estatísticas e mesmo com a ajuda dos sindicatos, sempre prontos a dar uma mãozinha, a produção é fraquinha…).
Não admira que Angola tenha níveis de crescimento anuais do produto tão elevados com os católicos a produzirem assim certinho enquanto nós por cá, andamos murchos e a empobrecer.
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