Tuesday, November 04, 2008

Santos Populares



(Magnífico trabalho do artista NATHAN SAWAYA a ver aqui)

Ainda a propósito da rebaldaria que tem sido, desde há décadas, a gestão das casas, lojas e outros espaços que pertencem à Câmara Municipal de Lisboa, foi publicada uma lista dos felizardos, uma lista que tem quarenta páginas. Ao mesmo tempo, gente lá da câmara, gente distraída mas, ainda assim, gente importante, foi comentando o assunto:
José, um dos irmãos Sá Fernandes – o conhecido duo maravilha do bloco justiceiro, mistura do Zorro da Mouraria com o Robin de Alcântara – ficou de boca escancarada por causa do valor das rendas cobradas pela autarquia onde, supõe-se, é vereador do ambiente e de mais umas coisitas (a notícia não esclarece sobre a causa do espanto: se ele se deve aos baixos valores das ditas ou ao facto da tramóia ter sido desvendada);
Ruben de Carvalho, o comunista, outro veterano da autarquia e também ele membro do chiquíssimo clube dos vereadores distraídos, concluiu – brilhantemente – que a autarquia não anda a fazer uma boa gestão do seu património;
Carmona Rodrigues, o independente, lamenta que a câmara tenha sido um mau senhorio durante tantos anos e Fernando Negrão, membro recente, sim, sabia que havia umas rendas baixas mas assim, tão minúsculas, ah não, isso não, nunca tal lhe passou pela cabeça.
Até agora, hora do fecho desta edição, desconheço comentários de Jorge Sampaio, João Soares e Santana Lopes, antigos dirigentes desta agremiação da cunha.

Caso, por inveja e dor de cotovelo, estejam a pensar em aderir a este distinto clube e fazer companhia a este notável ramalhete de servidores da causa, convém que não se esqueçam de que a coisa não é fácil, que a lista de espera está à cunha e que há uma prova importante a cumprir, ignorar conhecimentos, conhecimentos difíceis de esquecer mas cuja ocultação é fundamental. Por exemplo, entre muitos outros exemplos, os candidatos têm de saber esquecer que:
a) Fernando Ka, ex-deputado do partido socialista e activista dos direitos dos imigrantes, paga a enormidade de cinco euros e sessenta cêntimos por mês por uma casita social, uma barraquita com cinco assoalhadas e quintal, localizada perto da praça de Espanha;
b) Dina Aguiar esturra vinte e seis euros mais trinta e cinco cêntimos no atelier no palácio dos Coruchéus;
c) A Associação dos Arquitectos Portugueses paga, por uma fracção num palacete, desde 1990, uma renda de…zero euros;
d) O Restaurante Gôndola – restaurante de comida italiana com oitenta lugares no interior e oitenta na esplanada, com preços por refeição a variar entre os vinte e os trinta euros por pessoa – paga cento e noventa e nove euros mensais;
e) O PS, PSD e CDS-PP pagam rendas mensais de setenta e cinco euros, quarenta e seis euros, trinta euros e trinta cêntimos respectivamente. Em 2005, o PCP pagou quatro euros e cinquenta e cinco cêntimos por um espaço na Ajuda.
(Ainda à espera de esclarecimentos, a indicação de que o colégio de São João de Brito – um dos mais caros colégios privados e cujo lema é “Divulgar a Fé promovendo a Justiça” – paga uma renda de cinquenta cêntimos).

Pela (insignificante) amostra já devem ter topado a trabalheira que dá um tipo armar aos cucos e querer fazer parte de clubes selectos; deixem-se de coisas, façam como eu, esqueçam essas ideias chanfradas e dediquem-se à pesca. Deixem as coisas difíceis para quem sabe!

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